agosto 23, 2007

Sobre um Basquete que não vai a uma olimpíada desde 1996

Tirando os Estados Unidos, qual o país existente com mais títulos no basquete mundial?

Surpresa, surpresa, é o Brasil. Na frente dele no ranking de todos os tempos estão apenas os EUA, a URSS e a Iugoslávia e estas duas últimas nações não existem mais, tendo-se desmembrado numa miríade de paisecos.

A grande era das conquistas masculinas começou com o bronze nas Olimpíadas de 1948, seguido pela prata no Mundial de 54, disputado aqui. Em 59 e 63 o Brasil foi bicampeão mundial e ganhou dois bronzes nas Olimpíadas em 60 e 64. Outro bronze veio no Mundial de 67, seguido pela prata no de 70. Em 74 houve um hiato e novo bronze veio no Mundial de 78. E depois acabou. A única conquista significativa depois disso acabou de fazer 20 anos, o ouro no Pan de Indianapolis em 87.

E, não por coincidência, 1978 foi a despedida dos grandes craques Ubiratan e Hélio Rubens e o começo do reinado de uma nova superestrela - Oscar.

Quem viu o Mundial de 1978 de basquete, nas Filipinas, transmitido cedinho de manhã, deve recordar de como veio aquela medalha de bronze. O Brasil estava um ponto a frente e faltavam uns quarenta segundos. Em vez de gastar o tempo, Oscar ou Marcel, não lembro quem, queimou um arremesso, os italianos pegaram o rebote, gastaram quase todos os trinta segundos (o tempo de posse de bola da época) e encaçaparam enquanto durante a jogada inteira o comentarista furibundo reclamava da estupidez brasileira. Faltando três segundos, os brasileiros deram a saída, o tempo ia acabar, Marcel rifou a bola lá do meio da quadra... e ela caiu! Sorte, pura sorte. Os destaques daquela equipe foram Hélio Rubens e Ubiratan, que só entravam quando a coisa ia mal, já que tinham ambos mais de 35 anos e estavam se despedindo da seleção.

Em 1981, a Bandeirantes transmitiu o Sul-americano de basquete. O promissor locutor Galvão Bueno estava a cargo do microfone e, profissional como sempre, conseguia manter o interesse do espectador durante todo o tempo. Contou também como os brasileiros, após uma longa hegemonia, haviam perdido o título para os uruguaios no último torneio com histórias estranhíssimas, com gente puxando a tabela pela corda, segundo ele. Começou então o Brasil x Uruguai. O jogo foi ficando complicado, Galvão reclamando que o placar do primeiro tempo, ambos na casa dos trinta pontos, era placar de infantil, até que a certa hora, depois de mais um arremesso errado porque forçado e marcado do Oscar, ele se irritou e, não sendo ainda um ícone nacional, soltou o que hoje em dia não poderia falar: "O Oscar não arma, não marca e não arremessa. Jogo em que ele faz menos de trinta pontos o Brasil entra com um a menos".

E essa foi a história da seleção brasileira sob Oscar. Ele nunca foi bom em rebote, apesar de sua altura, 1,99m (um gigante para a sua época). Defendia mal e não armava. Era um formidável arremessador, mas justamente por isso tendia a concentrar o jogo brasileiro. Os adversários, cônscios de sua importância para o time, marcavam-no impiedosamente e, infelizmente, nosso grande ala não reagia bem sob pressão e começava a tentar arremessar mesmo bloqueado ou desequilibrado. Do mesmo mal padecia Marcel. Quanto mais o jogo pedia calma, sangue-frio e inteligência, mais eles tentavam forçar jogadas impossíveis.

O grande feito de Oscar (e Marcel) foi a vitória sobre os EUA vinte anos atrás. Eu vi o jogo e me lembro claramente, inclusive de à noite ir à Gafieira Voadora,encontrar os amigos e ficar comentando a improvável partida. O Brasil estava quase vinte pontos atrás. A reação começou quando um estadunidense enterrou uma bola e ainda se pendurou no aro, o que levou o juiz a anular a cesta. Essa atitude mostrava o que se passava na cabeça dos americanos na hora - o título já estava ganho, era só levar pra casa. Eles relaxaram na marcação e na armação, o Brasil foi diminuindo a diferença e Oscar e Marcel acertaram praticamente todos os arremessos de três pontos que tentaram. Não só isso, eles começaram a tentar as coisas mais estapafúrdias em quadra - e foi funcionando! Renato Brito Cunha era o comentarista e numa dessas ele simplesmente disse, "desisto de comentar, isso vai contra tudo que se deve fazer no basquete", ao falar sobre um contra-ataque em que Marcel saiu correndo sem marcação, viu que havia ultrapassado a linha de 3 pontos e, em vez de bandejar, DEU UM PASSO PARA TRÁS para chutar e marcar uma cesta de três.

Oscar, apesar de nem de longe ter a aversão a treinos ou o caráter duvidoso do futebolista, fez pela seleção brasileira o que Romário fez no Flamengo e no Vasco. Concentrou o jogo e sobrecarregou o time, por não dividir com ele os fundamentos defensivos e a armação. O Brasil está pagando até hoje. Os ídolos são importantes, mas os esportes coletivos, como diz o nome, são coletivos. Exigem que todo mundo participe inclusive dos momentos inglórios.

(Certa vez, na arquibancada do Maraca, no começo dos anos 80, conheci um senhor que tinha sido juiz de basquete. Perguntamos pra ele quem ele achava que tinha sido o maior basquetebolista brasileiro e ele disse que era o Algodão. Olhando agora na Wikipedia, começo a entender por quê. Ele foi TITULAR do time campeão mundial em 1959, AOS 44 ANOS DE IDADE, numa época em que os atletas duravam bem menos do que hoje. Também achei sintomático que haja um verbete para Oscar e não para Edson Bispo ou Hélio Rubens).

(Não devia também ser um barato o Brasil ser um país sub-sub-sub-desenvolvido na época, com indicadores econômicos e sociais a níveis africanos e em 1963 ser bicampeão mundial nos dois esportes mais populares do mundo?)

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