abril 23, 2024

Warrior - A Série

 A Netflix adquiriu “Warrior” do Cinemax e imediatamente começou a tentar me empurrar de qualquer forma, avisando que estava entre as séries mais vistas e pondo uma cena inteira passando insistentemente na tela inicial. Sim, eu sei, gosto de tirar onda que uso a Netflix pra ver Viagem ao Infinito e filmes asiáticos premiados, mas o algoritmo sabe direitinho que eu adoro produções com cara e impressionante direção de arte, porradaria em som surround e deslumbrante fotografia. Na verdade, é só para curtir a qualidade da minha imensa tevê QLED e minha avançada soundbar surround Atmos, ok?


Mas eu só comecei a ver Warrior depois que julguei familiar o rosto do chinês abusado que protagonizava a cena teaser. Era o Andrew Koji, que embolsou o “Sêneca - Da Criação de Terremotos”, que vi no FestRio do ano passado. A Gricel e o Sílvio me contaram que já conheciam o vivente de outros estrímens, mas para mim era um completo estranho. Seu centurião irascível, porém completamente dedicado ao cumprimento de sua missão, passou de mecanismo da trama a personagem graças ao seu olhar implacável e, por que não dizer, sua sobreatuação, com frases entredentes, rosnadas e saindo aparentemente de dentes rangendo. Contrastando com a hipocrisia do filósofo rico e título de filma, e do resto da galera que povoa o longa, sua coerência interna em busca de um objetivo é louvável em sua abjeção. Ele é o único na história que parece saber o que quer, ainda que contribuindo para a disseminação do mal que aparentemente deixou os outros habitantes da fita sem saber o que fazer, discutindo e produzindo (má) arte enquanto Nero (aparentemente uma metáfora para o Trump) taca (literalmente, mas em outra época) fogo em tudo.


A série já tem alguns anos e o Koji parece bem menos impressionante. Ainda que o protagonista de Warrior seja um construto para agradar espectadores, aquele cara fodão que fala “fucking” a cada 3 palavras, distribuindo respostas cínicas de efeito com mais velocidade do que seus fulminantes golpes, mas que, no fundo, tem bom coração e bons valores. O resto do elenco também não vai levar nenhum memorável prêmio de atuação, até porque nós já os vimos antes - e muitas vezes. Convencionais como a trama, começar a ver Warrior é como já pegar uma série a partir do meio. A familiaridade e previsibilidade do pessoal são ótimos companheiros para noites para refrescar a cuca. Termo anacrônico que utilizei porque a reconstrução de época obedece às leis da simplificação para o supostamente idiota público. Um ou outro detalhe de época para capturar a atenção e todo o mundo se comportando de uma maneira moderna (ou caricatural). A modernidade de uma moça, casada por interesse, mas incoerentemente sexualmente ousada e pintora de uma modernidade singular para a época é mais uma daquelas convenções de que não fazer as coisas parecerem como se passadas hoje em dia vai soar alienígena demais para atrair as plateias atuais. É assim que vemos batalhas em que bestas são usadas como metralhadoras e João sem Terra tem barcaças de desembarque.


Bem, mas chega de falar mal, afinal já cheguei ao episódio 4, muito mais do que a maioria das coisas que começo a assistir. Koji não rosna entredentes aqui - mesmo quando deveria - mas está ótimo nas coreografias de luta e não compromete, apesar de parecer mais um integrante de gangue de filme do Tarantino do que da Chinatown de 1880. A produção é bela e refinada. Como em todas as ficções dessa estirpe, há um puteiro barato em que as meninas mais feias no mundo real estariam casadas com algum político 40 anos mais velho (ei, aconteceu isso com a pintora!), mas que beleza de puteiro barato. Os cenários são lindos e parecem caros. Não veja isso na tela do seu computador ou telefone.


Enfim, o mundo não mudou, mas se você estiver sem espírito de embarcar em alguma aventura desconhecida, mas dá preferência praquelas conhecidas, ainda que disfarçada de peça de época, Warrior é uma boa pedida. Já disse que as cenas de luta são  ótimas?



 

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