Uma vez eu discuti com um amigo que achava a raça humana algo assim, meio... desprezível. Que era muito imperfeita. E eu tentei explicar pra ele que amar a humanidade é amar o erro. É isso que ela tem de belo e divino, a capacidade de se reinventar, se recriar, a capacidade do livre-arbítrio, de fazer seu destino. De ser imprevisível. A perfeição está aí em todo lado - os planetas girando suas perfeitas órbitas elípticas, com o Sol em um dos focos e gastando o mesmo tempo percorrendo-a de acordo com a área do polígono. As estrelas queimando sua parcela de combustível e com sua morte podendo ser prevista, calculada e acontecendo exatamente como deveria, com toda pompa, circunstância e espetáculo que supernovas e gigantes vermelhas podem causar.
Já o amanhã de uma pessoa ninguém pode prever. À caótica biologia se junta a misteriosa consciência e ninguém sabe o que vai sair de lá. O erro - e a bela tentativa de se melhorar - são os dois grandes predicados da humanidade. Toda nossa arte é sobre o erro, o que parece escapar aos estetas entediados que amam a arte e não têm paciência para com os artistas.
E, além disso, qual o sentido da perfeição? Todos os planetas e estrelas e galáxias continuarão a girar muito tempo depois de nós nos termos ido. Para quê? Qual o barulho que uma árvore caindo na floresta faz quando não há ninguém para ouvir? Qual o Universo que existe se não há ninguém para saber que ele existe. Qual o valor da perfeição quando tudo é perfeito, tão perfeito que nem mesmo sobra espaço para um pouco de auto-apreciação, "puxa, eu não sou um Universo tão mecanicamente e relativisticamente perfeito?" Terá Deus (aqui entendido como metáfora do Todo e não um sujeito de longas barbas brancas sentado numa nuvem) criado a vida inteligente para validar sua perfeição? Para conhecer a si mesmo?
Quando eu tinha uns 13, 14 anos, já era um moleque estranho, daqueles que passavam o recreio na biblioteca. Certa feita um outro moleque desses estranhos, que já era comunista (eram os tempos da ditadura), me explicou porque não tinha medo da morte: nada sei do que existia antes de mim e nem saberei depois; não tenho consciência do meu começo e não terei do meu fim; logo, sou imortal". Pensamento incrivelmente complexo para um adolescente entrando na puberdade (Mauro Leão deve ter lido em algum lugar, ninguém pode ser assim tão mais inteligente do que eu). Imortal também é o Universo.
Apenas nós (e as outras vidas inteligentes que com certeza habitam a esporrada do Big Bang) estamos aqui para marcar a passagem do tempo.
fevereiro 24, 2008
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