Dourada a pele, dourados os cabelos. Eu sou o privilegiado, eu tenho a medalha de ouro, os cabelos podem ser pintados, a pele pode ser de bronzeamento artificial, ela é bela, bonita, gostosa e segura minha mão como se fosse minha filha, como se estivesse acostumada a fazê-lo, como se não estivesse sendo paga para isso, seus olhos, olhos claros - são claros, sejam lentes ou não - sem paixão mas com carinho e meiguice olhando o beijo molhado, apaixonado de minha esposa, olhos fechados, abertos os de todos em volta, observando minha linda mulher e minha outra bela mulher, invejando-me, eu sou o privilegiado, eu tenho a medalha de ouro, os cabelos louros que seguram minha mão, podem ser pintados, a pele bronzeada em lâmpadas ultravioletas em quartos fechados e suarentos, iria ver a marca em breve, se só da calcinha ou da calcinha e sutiã, se marca de lingerie ou de biquini, veria os pelos, se escuros ou claros, mas já não importaria, não importa, importa o beijo, o beijo da boca que eu conheço bem, igual a todos os outros que demos, os mesmos lábios, a mesma língua, o mesmo tempo, o mesmo timing, a mesma exploração nos dentes, no palato, o mesmo gosto na saliva e uma mão tão diferente, menor, menos quente, com os dedos mais finos, uma mão que não é daquele beijo, uma mão que não é daqueles lábios, uma outra mão me segurando, afetando afeto e um tanto de indiferença profissional, negada ligeiramente esta pelo leve puxão de "vamos embora" para longe do beijo da minha esposa.
O beijo termina, minha mulher abre os olhos lentamente, vê apenas a mim, assim como a maioria dos passantes invejosos do aeroporto.
- Tchau, amor. Boa viagem.
- Ele vai ter, pode deixar - sorri a loura provavelmente oxigenada. Quem diria, ela tem senso de humor, mais pelo mesmo preço.
E a mão dela me puxa de vez, andamos para o embarque e olho minha mulher me sorrindo, ela também se sente bem, ela também tem outros motivos de orgulho, ela também está excitada com o fim de semana, eu na feira, ela em casa, nosso apartamento só para ela, o Sol, a cidade e o tempo livre só para ela, sem contar o resto.
O resto agora segura o meu braço e o esfrega levemente.
E fala.
- Vamos logo.
E completa o porquê.
- Eu adoro andar de avião.
- Não faço nada em banheiros de avião.
- O quê?
- Eu não faço nada em banheiros de avião.
- Então você não deve fazer viagens longas.
Ela é melhor do que eu pensava.
A viagem é exatamente como eu pensava. O avião sempre o mesmo, a comida sempre a mesma, a aeromoça sempre a mesma, a aterrissagem sempre a mesma. Sem acidentes, sem desastres, sem cadáveres, apenas o ar condicionado. E as janelas de plástico.
Ela gosta, procura a paisagem entre nuvens e indefinição, se cansa e encosta em meu ombro, eu a acaricio e depois a beijo, ela se entedia e procura a paisagem novamente, ela gosta de viagens de avião, não deve viajar tanto assim, eu viajo, viajo sempre, preso entre janelas de plástico e vozes de comandante, quarenta e cinco minutos, uma hora, duas horas, doze horas, os aviões vêm e vão, muito mais belos e excitantes quando vistos de fora, cheios de promessas de viagens e viradas, por dentro esforçando-se terrivelmente para serem apenas ordinários, não assustarem ninguém, não querem mudar nada, não querem destruir nada, pode ficar confortável em seu assento.
A bela loura cansou de novo de procurar paisagem e encostou a cabeça no meu ombro. Acaricio-a de novo, a aliança prende levemente em um de seus cachos. A aeromoça traz o lanche. Eu, homem de meia-idade, controlo tudo o que como, quero me manter vivo, vivo e jovem. Ela, viva e jovem, pede o prato dela e o meu.
- Você vai estragar o seu apetite.
- Vou nada.
- Quando chegarmos, podemos jantar num lugar muito melhor...
- Ótimo - continua comendo - Eu vou adorar.
Eu sorrio. Eu gosto dela. Ela é adorável.
- Você tem namorado?
Ela nem pára de tomar o vinho, a primeira coisa que pediu no restaurante, não lhe sugeri nenhum de brincadeira, como se fora um desafio e ela perguntou diretamente ao garçom qual ele recomendava. Não pediu o mais caro. Gosto cada vez mais dela. Penso que a pergunta seria um exame clínico, tudo isso, tudo que estamos fazendo, essa falsa corte, esse falso amor, tudo seria impessoal, orgânico, fisiológico, mas eu sei, eu sou pragmático, tudo isso na verdade é apenas pragmatismo, um entendimento cínico da meia-idade sobre o temperamento humano, sobre o meu temperamento, eu sei que estou perguntando isso com uma ponta de ciúme e ela, ela nem pára de tomar o vinho enquanto balança a cabeça de um lado pro outro.
Não.
E põe o vinho sobre a mesa e é a vez dela.
- E você?
- Eu? Eu o quê?
- Tem namorada?
- Você viu a minha mulher.
- Mas tem namorada?
- Já não bastam minha mulher e você?
- Ela é sua mulher e eu sou garota de progama.
- Não, eu não tenho namorada. Basta a minha mulher.
- Ela é mais nova que você.
- Não tanto.
- Mas é.
- É.
Pausa.
- Ela é minha segunda mulher.
- O que houve com a primeira?
- Nos separamos.
- Por causa dessa mais nova?
Minto.
- É.
- Viu? Então você já teve namorada.
- É.
Pausa. Minha vez de perguntar.
- E você, por que não tem namorado?
- Com essa vida?
Eu me calo e falo sobre a comida, o restaurante e o vinho. Este faz ela rir à toa o resto da noite.
Até ela sair do banho, toalha na cabeça, roupão e lingerie elegante por debaixo deste.
Ela é boa.
- Tá certo, amor. Eu sei. Amanhã vai tudo dar certo.
Ela senta na minha frente e olha pra mim.
Ela percebe que eu estou falando com a minha esposa, eu fico esperando que ela vá fazer alguma gracinha, vá fazer uma careta, vá me abraçar, me acariciar, me chamar.
Ela fica quieta.
Eu me despeço, digo tchau, amor.
- Tchau, amor.
Desligo o telefone e subitamente estou num quarto de hotel, fechado entre paredes sem os meus livros, sem os meus discos, sem os meus quadros, sem a minha mulher.
A moça loura me olha e me sorri, um sorriso compreensivo, um sorriso de perdão, um sorriso lindo, um sorriso profissional.
- Hoje não.
- Não - confirmo - Não deu.
- Tudo bem, amor.
E me dá um beijo longo, molhado e de carne, um beijo como aquele que ela me viu dando no aeroporto, parecido, ela se lembra, ela guardou na memória, por um instante eu esqueço que não é minha cama, não é minha casa.
É apenas o meu corpo.
Descemos juntos no dia seguinte, as mãos dadas, os dedos entrelaçados. Sinto os cabelos dela no meu braço. Sinto o calor dela quando ela encosta a cabeça no meu ombro, quando entra gente no elevador. Seus dedos, macios, unhas bem tratadas, continuam entrelaçados nos meus mesmo quando entramos no táxi. Sinto uma pequena resistência quando tento soltar, mas seus olhos continuam olhando a paisagem úmida na janela, mesmo quando já livre abro a maleta.
O motorista de táxi ajeita o espelho tentando ver melhor o decote dela. Ele nem imagina que não é tão difícil quanto ele pensa. Devia ser mais, devia ser quase impossível, ela não devia ter preço, chamando tanta atenção, desviando tantos olhares, desejada ainda que completamente desconhecida, fantasiada em mentes que normalmente não conseguem visualizar um espaço tridimensional, ela devia desdenhar de todos, se apaixonar somente por um rapaz fechado e calado, misterioso e sombrio, que só ela conhece. Ela é dourada, ela é linda, ela é a medalha de ouro. Tão bonita quanto minha esposa, ambas quase da mesma idade.
- Pensei que depois desse casamento tu ia dar um tempo...
Ela não entrou na sala, bastou ao gerente vê-la ali fora sentada folheando uma revista desinteressante, um house organ sem sequer muitas fotos. Ela vai se entediar. Iria acabar se entediando de qualquer maneira. O tédio é nossa arma. O tédio está do nosso lado. Nossa empresa não existiria sem o tédio. Nossas vendas não cresceriam sem o tédio. Tantos olhos não se voltariam a ela não fosse o tédio. Ela nem lê a revista, procura as fotos que não aparecem. Olha a parede. Ela não ganharia tanto dinheiro se não fosse o tédio, o que ela faz para combater o tédio? Eu vim para cá discutir isso, onde devemos procurar melhor o tédio? Ela faz como nós, põe anúncio nos jornais, gente entediada que já leu o que queria gosta de ler os anúncios de acompanhantes nos classificados. O tédio é nosso aliado. O tédio convive com cores e movimento, com monocromia e monotonia. Não iríamos longe sem o tédio. Morreríamos cedo sem o tédio. As civilizações morrem de tédio. Meu primeiro casamento acabou por causa do tédio.
Minha esposa sozinha, entediada.
Só há uma recepcionista para olhar na sala de recepção. A decoração é elegante. Limpa. Moderna. Entediante.
Nossos planos de campanha, nossas idéias e nossos projetos, nos preparamos o melhor possível para discordar bastante antes de concordar em alguma coisa. Digo não até mesmo quando ele fala algo com que ele concorda. Ele diz não mesmo quando digo algo que sei que ele aprova e me faltam argumentos para rebatê-lo. Mesmo tão preparado, mesmo pronto para entrar em batalha, mesmo tendo posto todo mundo para trabalhar nesse projeto por mais de duas semanas, ainda assim minhas convicções não são racionais.
E, no fim concordamos com exatamente tudo em que esperávamos que houvesse concordância.
- Não vai me apresentar a ela?
- Você não acha que a minha mulher merece um mínimo de respeito?
- Engraçado.
Ele pára.
E diz o esperado.
- Você agora só deu pra arrumar mulher bonita, hein?
- Tirar o tempo perdido. Fui muito tempo fiel no meu outro casamento.
- E qual que trepa melhor?
Ambas. Juntas.
Já vamos nos beijando de volta no táxi. Esse taxista não se impressiona tanto com ela. Ou comigo. Ou com nossa esfregação. Nem tentou puxar conversa. Desde que entramos.
Profissional.
- Você demorou tanto lá dentro.
- Negócios. Mas também vou demorar muito lá dentro quando a gente chegar.
- Desde ontem que a gente está pra chegar.
- É um longo caminho para Délhi, moça...
- Como?
- É a longa Estrada da Perdição.
- Ih, começou...
- É que de minha vida em meio à jornada achei-me em selva tenebrosa, tendo perdido o verdadeiro caminho...
- Saco. Pára com isso.
- É uma escadaria para o paraíso.
- Tá melhorando.
- Chegamos.
- Eu não disse?
O taxista puxa a tabela do porta-luvas e ela a minha carteira, dentre beijos e mãos na coxa.
Pago.
Estou entrando no hotel.
Agora não há volta.
Vou resolver minha vida. Minha vida amorosa, sexual, afetiva, social. Mulheres. Tempo. Seus seios, suas bocetas, suas bocas, suas línguas, suas carências, suas mãos correndo pelo peito, seus cabelos caindo por nossas costelas suas coxas subindo pelas nossas enquanto elas falam e falam e eu ainda hoje busco o cigarro que larguei há cinco anos depois das primeiras dores no peito e linhas erráticas no ECG, as mulheres que invadem minha vida e a abandonam, me abandonam, eu, divorciado, tanto que amei minha primeira mulher, amiga de todos os meus amigos, desconfiada de meus patrões, exigente de tempo, tempo que eu não tinha mais, tempo que eu não achava mais, amiga de meus colegas de trabalho, amiga de meus chefes após conhecê-los melhor, amiga minha, amiga de todos, com sua conversa envolvente, seu dom para deixar as pessoas à vontade, seu carisma, imenso carisma, movido a carência, a mulher que me acariciava enquanto eu ficava em frente do Apple II, do XT, máquinas que ela não entendia, ela gostava de pessoas e conversas, Ana, simples, palíndromo, palíndromo curto, óbvio e simples, uma mulher óbvia e simples, uma mulher adorável e eu, mal tinha tempo para adorá-la, todos a adoravam, eu também, até hoje a adoro, mesmo quando a vejo passando, nós nos cruzamos, ainda hoje, nos cruzamos em corredores de agências, de academias, em filas de cinemas multiplex e restaurantes, em filas para pagar o estacionamento do shopping e para comprar o ingresso para a sessão da meia-noite, podia ser até a das dez, hoje tenho tempo, tempo e dinheiro, eu ralei, ralei muito, até mesmo porque já nem tinha mais sua companhia, ajudava a esquecer, ajuda a esquecer, como essa moça loura, loura e limpa, limpa e cheirosa, Ana não estava sempre limpa, seu cabelo descabelava com facilidade, ficava uma mecha caindo pela fronte, pela frente, Ana ainda hoje, ainda hoje sorri e fica nervosa na minha frente, ainda hoje se perturba um pouco, por que me largou então, eu sei, eu sei porque ela me largou, Ana,
mas aí chega o Leonardo, amigo meu de faculdade e ela arruma uma desculpa para ir embora com o marido.
- Cara, ainda bem que te peguei antes de vocês começarem.
A bela loura olha para ele, desafiadora.
- Começarmos o quê?
- A noite.
Boa saída.
O homem com quem passei a tarde conversando e discutindo e ouvindo sobre a beleza da garota que trouxe à cidade comigo explica-se.
- O Souza tá na cidade. Você precisa falar com ele.
- O Souza? Mas ele não tinha uma reunião hoj...
- É. Ele tá vindo de helicóptero. Ele quer ver o projeto.
Tempo, sempre o tempo.
Quanto antes nos livrarmos desse projeto, melhor. Para frente, para trás. Há outros vindo. Diferentes e iguais, idéias velhas e recicladas, conceitos econômicos e informáticos e se procurarmos, procurarmos bastante, procurarmos bem no fundo, bem debaixo da pele de qualquer proposta nossa para o nosso trabalho, seja recolher lixo ou neve, seja criar computadores ou bicicletas, sistemas de informática ou jogar futebol, sempre, sempre vamos achar uma mensagem sobre a nossa vida pessoal, nossa vida privada, algo, um pequeno segredo. Facilitar as viagens para nos lembrarmos daquela em que encontramos um amor agora perdido. Aumentar as taxas, saudade de quando contávamos o dinheiro para jantar fora.
O tempo, sempre o tempo.
- Vai - Ela dá o conselho.
Ela não recebe por hora.
Eu vou.
Vou andando para frente e de vez em quando me viro, viro para olhar a beleza de seus olhos.
E lá no fundo, bem no fundo, ela não parece aliviada ou contente, ela parece um pouco, um tanto, melancólica, triste.
Ela parece com saudade.
E eu vou partindo.
Então me lembro, já dentro do táxi.
Preciso telefonar para minha mulher e não posso fazê-lo na frente de ninguém, muito menos desse colega de trabalho me levando ao Souza. E muito menos na frente do Souza.
- Preciso dar uma ligada.
- Tá sem celular? - Ele me passa o dele.
- Não... não é isso.
- Qual o problema? - Ele já suspeita de uma traição. Eu não sou um funcionário tão graduado assim.
- Minha mulher.
- E..?
- É particular.
Ele se lembra da bela loura que estava comigo e da qual ele sentiu inveja. Ele se lembra da minha bela esposa. E ele não entende.
Continua suspeitando, ele quer suspeitar.
- Não pode ligar daqui?
- Não.
- Liga quando chegarmos.
- Tem que ser agora.
- Cara, o que você tem que falar com tua mulher aqui no meio da rua?
- Eu preciso.
- Liga de lá.
- Vai ser tarde.
- Voc
- Pára esse táxi!
- ê tá ficand
- O táxi! Pára o táxi!
- o malu
- Agora! - Agarro o braço do motorista, ele tem o reflexo de todo o motorista, mete o pé no freio.
O carro derrapa um pouco e discutimos os três um pouco. Finalmente, ele me empresta seu celular.
Inclusive porque ele vai poder ver pelo aparelho para onde eu liguei.
Ela atende.
- Amor?
- Oi, amor... tudo bem?
- Tudo.
- Tô morrendo de saudade.
- Eu também.
- Peguei uma praia hoje... o tempo aqui tá ótimo... e aí?
- Tá bom também...
- Como é que foi a conversa?
- Foi boa, foi muito boa... nada demais, aquilo que eu já esperava mesmo... quer dizer, não resolvemos nada ainda...
- Eu fui à praia sozinha hoje... Sabe, acho que nunca tinha ido à praia sozinha... Sempre ia com uma amiga, quando eu tava sozinha...
- Legal... olha... você tá sozinha agora?
- ...
- Amor?
- Não.
Ela pausa e completa.
- Você sabe que não.
E pára mais um pouco antes de continuar.
- Aquele amigo... aquele cara que a Teresa... a Teresa falou...
- Você está bem.
- Eu... eu não sei.
- Como ele é?
- Ele é legal. Acho que tão legal quanto a moça. A moça é muito legal, não é? Ela é um amor.
- Você é muito mais.
- Eu estou com saudades.
- Eu também, eu já disse. Eu queria estar com você, amor. Eu queria não ter que viajar tanto. Eu queria não ter que trabalhar tanto. Eu queria tanto estar com você. É justamente por isso, amor.
- Ele é legal.
- Hm?
- O cara. Ele é legal.
- Qual é o nome dele?
- Ele disse Maurício, mas eu duvido que seja.
- Você está ficando mais esperta.
- É a convivência.
- Olha, é o seguinte: não começa nada agora não. Eu vou ter que falar com o Souza.
- Quem é o Souza?
- É o superdiretor regional.
- Caraca...
- Eu não gosto quando você fala isso...
- O que você quer que eu diga? Tem gente aqui.
- Pois é. Manda esperar. Eu tenho que ir. Daqui a pouco a gente se encontra.
Já estou sendo olhado com muita raiva.
- Olha, eu realmente tenho que desligar. O gerente daqui já está ficando muito desconfiado dessa conversa longa que eu tive que fazer escondido dele.
- Eu entendo.
- Eu sei que você entende. Você é muito esperta, amor. Por isso que eu te amo.
Eu desligo.
- Vamos nessa.
O táxi roda mais um pouco. Chegamos a um portão. Não é um hotel. É uma casa. Uma casa com portão e caminho. Jardim e regatos. Esculturas modernas em pedra.
Limpas.
O jardim também está limpo. Não é aristocrático. Sua imponência está na limpeza e na iluminação.
Há um valete ou algo que o valha para pagar o táxi.
Há um mordomo ou algo que o valha para nos abrir a porta.
A iluminação do escritório onde entramos é indireta. Há uma televisão embutida na parede ligada no Bloomberg. Tudo somado, há pouca luz. Há um abajur na grande mesa no fundo, Um foco revelando um rosto.
Souza.
- Boa noite.
Ainda não é meia-noite quando saio da casa do Souza. A criadagem chamou um táxi e eu embarquei.
Os metais impecavelmente polidos. Os bronzes brilhando dourados. Os vidros sem rachaduras. As tábuas corridas sem falhas.
Uma das casas de Souza. Ele vive percorrendo a região. Tem outras.
Eu chego ao hotel e subo ao quarto.
Abro a porta, mas antes de acender a luz da ante-sala, ouço a voz da bela loura.
Ela está conversando com alguém.
No telefone.
Eu paro e não me revelo. Eu vou espiá-la.
- Eu sei, amor. Morro de saudades. Não devia ser assim.
A idéia de estar vendo-a sem que ela me veja me excita. Vai ser melhor do que eu pensava.
- Não pensa nessas coisas. Esse corpo é só teu, meu amor.
A voz é chorosa.
Ela mentiu para mim.
Eu fico mais excitado ainda.
Sento o mais silenciosamente possível, sorrindo.
- Eu gosto é da tua boca. De você me chupando. Me beijando. Gosto do teu peito.
Meu coração aperta.
- Gosto do teu suco, amor. Gosto dos teus dedos, você sabe que eles me machucam. Eles me machucam e eu fico só pensando em você.
Meu coração aperta mais ainda.
- Só em você.
-
- Também. Pára, Débora, pára com isso senão eu não vou conseguir fazer o serviço.
-
- Eu te amo. Você sabe que eu te amo tanto.
-
- Pra você também.
Ela desliga e entra no banheiro. Nem me viu.
Meu coração bate forte e apertado. Parece que há algo cinza dentro do meu peito. Parece que falta engolir alguma coisa. Parece que não há ar suficiente no mundo para mim. Que eu deveria rasgar meu peito para tê-lo, para que ele o atravessasse, para que eu conseguisse respirar.
Uma putinha.
Ela é uma putinha e eu fico assim só porque ela é lésbica? Eu me sinto como na faculdade, o Fernando agarrando em dois minutos a menina que eu passei o semestre e a festa inteiros paquerando gentilmente. Eu me sinto como quando eu e Ana conversamos longa e intimamente pela primeira vez porque nosso namoro estava ficando sério e ela me contou do grande amor da vida dela e como eles se davam bem sexualmente. Eu me sinto como no dia em que tive certeza que Ana voltara a ter vida sexual após nossa separação - e, pior, foi um amante de uma noite só. Um corpo que eu não voltaria a ter, uma mulher que eu amava tanto e um sujeito nem tão bonito assim, meio bêbado, a violentava assim com seu consentimento.
Ninguém mais fala violentar. Ninguém mais se importa com isso.
Garota de programa.
Piranha. Vagabunda.
Lésbica.
Sapatão.
O telefone toca. O chuveiro está aberto, será a Débora? Ela quer me ouvir? Débora? Vou foder tua mulher hoje a noite toda. Vou estuprá-la com o consentimento dela e você vai ficar sabendo.
E ainda assim, lá entre o coração, os pulmões e o diafragma, uma vergonha apertada tão constrangedora que chega a ser boa de tão velha conhecida minha, uma sensação de perda, de algo quebrado, de humilhação.
Débora.
Você vence.
Ainda assim você vence, Débora.
- Amor?
- Oi, Priscila.
- Já chegou?
- Cheguei. Tá tudo bem.
- Cadê a moça? A moça bonita?
- Tá acabando de tomar banho.
- O Maurício também. (Hi, hi) Eu saí antes pra não começar tudo. Foi difícil.
- Você bebeu?
- Um pouco. Eu tava nervosa. Você sabe que eu gosto de álcool. Me deixa com reflexos rápidos.
- Você tá excitada?
-
- Você tá excitada?
- Um pouco.
- Um pouco?
- É. Um pouco. Eu me sinto uma garotinha que os pais viajaram.
- Os pais?
- Devia ter dito o pai?
- Eu não tenho filhos.
- Você tá chateado?
- Por quê?
- Você tá chateado. Você que inventou isso. Eu não queria fazer isso. Você que inventou isso.
- Eu não estou chateado.
- Eu tava muito chateada.
- Por quê?
- Eu te amo.
- Eu também te amo.
- E a moça é muito bonita.
- Você é muito mais, Priscila.
- E você tava com ela aí há dois dias... você disse que a gente ia fazer junto. Mas me ligou com a história do Souza.
- Não era historinha, Priscila. Era verdade.
- Você queria transar com a menina sem eu ouvir.
- Não, Priscila.
- Você se arrependeu... a gente ia ficar junto, você que disse.
- A gente vai ficar junto, Priscila.
- Eu não queria beber, mas eu tava sem graça. O Maurício é bonito, mas eu tava chateada...
- Não fica mais, Priscila.
- Não. Não vou ficar mais. Não tô mais. Ele tá no banho.
Uma suspeita, uma suspeita leve, quase só uma aragem e de repente, de repente cai da cabeça ao coração, aperta o peito, oprime.
Outro aperto no peito. O Fernando. A Ana. A Débora.
Priscila.
Priscila, meu amor, minha garota.
Minha menina.
Meu amor.
A voz abaixa, mesmo sem que eu queira, fica mais grave, fica mais sem ar, mas pergunta.
- Vocês... já... transaram?
-
- Priscila?
- Não.
- Não?
- Não. A gente resolveu tomar um banho antes e... e foi... foi ficando bom, eu saí senão não ia dar.
Você está ficando mais esperta, amor.
Deveriam ser dois braços frescos e ainda úmidos do banho subindo pelas minhas costas. Deveriam ser dois seios maravilhosos, com sua consistência única, macia, sem ossos, sem dureza, apenas carne e sangue saudáveis envolvidos por pele lisa e sua ponta endurecida e firme encostando em minhas espáduas.
Deveria ser a menina subindo pelas minhas costas, tentando me seduzir, mas não. São dois braços de bonecas de pano me envolvendo. Dois pesados sacos de óleo com um canto plastificado.
Seus lábios, em contacto com meu pescoço, minha nuca, minhas orelhas, deveriam me arrepiar, com sua língua levemente úmida ciciando em meu corpo, mas não, não é, é saliva cheia de bactérias de dentes mal escovados, são saliências íntimas na língua me raspando, são dentes cortantes deslizando pela minha pele.
- É agora, amor?
- É agora, amor?
As duas falam, uma em cada ouvido e eu digo mecanicamente que sim, meu corpo funciona, minhas glândulas se ativam, meu pau se enche de sangue, uma boneca de pano me enlaçando, mas ainda assim estou enlaçado, sinto o cuspe pegajoso dela formar uma baba em meus lábios, mas ainda assim estou sendo beijado, ouço minha esposa murmurando, nos braços de outro homem, mas ainda assim é minha esposa murmurando, essa, essa era a idéia desde o começo, desde que ficou claro, minha vida ia prosseguir, meu trabalho ia prosseguir, as viagens, tantas, curtas mas frequentes, raramente longas, a distância, a ausência em momentos importantes, a carência, a ausência, eu tentei, pedi mudança de cargo, transferência, talvez um pequeno corte no salário, mas os tempos estão tão difíceis, tanta gente trabalhando tanto, tanta coisa de que necessitamos nesse pouco tempo que temos, tanta coisa que custa dinheiro, tanto coisa, a menina de cabelos dourados, de pele dourada, de coração de ouro, é preciso estimulá-la, provocá-la, ela não pode sentir o vazio nas minhas ausências, não pode ficar sozinha e ligar para os amigos, são tantas as viagens para o trabalho, são tão poucos os trabalhos que pagam tão bem, minha carreira, minha vida, trabalhei tanto para isso, para te dar o melhor, Priscila, para que você se sentisse a vencedora ao meu lado, Ana, Ana se sentia, mas tão pouco eu ficava ao lado dela, as amigas se divertindo, sempre acompanhadas.
- Você tá ouvindo, amor? Ele... ele tá entrando agora.
- Ela já entrou há muito tempo?
- E que que a menina tá falando? Deixa eu escutar ela? Deixa?
Deixo, Priscila, você sempre foi curiosa. Inteligência. Isso é sinal de inteligência. Uma menina tão nova e tão sozinha, abandonada em casa tanto tempo pelo marido, uma mulher na idade de namorar bastante, de galinhar, Ana, Ana que era mulher, mulher da minha idade, Ana não aguentou, ela queria família e filhos e eu, eu tinha que ganhar o suficiente para sustentá-los, eu ponho o fone para Priscila ouvir os gemidos da garota de programa, Priscila solta um tão grande e sensual que vejo que ficou excitada, imagina se ela soubesse que o murmúrio da garota provavelmente é mais de nojo de meu corpo peludo do que de prazer, Priscila grita que ele está enfiando, a moça se balança, me cavalga, bem-vindas ao meu mundo, um pouco aqui, um pouco acolá, nunca em lugar nenhum, tantos assuntos para resolver, é preciso vencer, conquistar, ganhar, vim, vi, venci e voltei correndo para a base porque tinha que ir, ver e vencer em outro lugar, o ganhador, tem que correr atrás, Priscila, tão bonita, uma medalha de ouro, belíssima, o troféu, os despojos.
- Meus peitos. Ele tá beijando. Ele lambe e chupa... Ele tá me tocando uma... siririca... hmmmmm...
- Hm... faz em mim também?
- Não dá. Lá em casa é viva voz. Eu...
Ela me beija e me cala. Beijo quente, de cuspe velho. Débora deve adorar. As duas devem dividir a escova de dentes. Não. Devem ser duas. Esta aqui deve ganhar o suficiente para isso. Pelo que estou pagando. O prêmio. A minha outra medalha de ouro.
- Eu... eu... acho... acho que vou... vou...
Eu sei.
- Vou...
Minha mulher. Minha esposa. Tanto que esperei para conquistá-la. A dúvida. A diferença de idade. De cabeça. Mas que cabelos. Dourados. Do ouro. Uma medalha de ouro. Muito. Demais. Boa família. Safada e pouco experiente. O troféu maior.
- Vou...
Ela vai, eu sei que vai, eu conheço, gosto tanto de ouvir isso, mas são tão poucas as oportunidades, eu ia ter que viajar, eu ia ter que viajar muito, eu tentei evitar, mas ela é uma medalha de ouro e merece um vencedor, um ganhador, Ana não aguentou, a distância atrapalha, não existe cabeça, existe o coração, não tínhamos filhos e Priscila também não quer agora, é nova demais, é um doce, um amor, tão inteligente e bonita e bem de vida e vai ficar tão longe de mim e vai se apaixonar, temos que ser pragmáticos, a vida é pragmática, os negócios são pragmáticos, estes não são tempos de ideologia, não são tempos de fé cega e faca amolada, o corpo fala, mais alto do que as promessas de amor, ia acontecer, mais cedo ou mais tarde, minha Priscila, minha esposa, por que não trabalhar isso, não tentar lucrar com isso?
- Vou gozar.
E goza, goza contraindo o abdomem, parece uma contração involuntária, às vezes me levanta, será que está levantando o Maurício ou ele tem um abdome capaz de se contrapor ao dela todo sarado? Ia acabar acontecendo, então por que não fazer que aconteça a meu favor, duas mulheres, duas maravilhosas, os cabelos dourados, a pele dourada, todos me invejam, tenho minha mulher e as melhores garotas de programa juntas, não serei traído, farei um jogo, eu e Priscila, minha mulher, ela não irá me abandonar como Ana, ela perceberá que sou um vencedor quando todos me olharem com inveja, duas mulheres me beijando no aeroporto, meu pau, meu pau começa a gozar mesmo que a pequena lésbica me pareça mais um peso na virilha sufocando meu pau com suor do que, eu começo a gozar e ouço os gritos, os gritos de Priscila enquanto gozo uma golfada tão longa de uma única vez que chega a doer o períneo, a próstata alongada demais, uma gozada tão longa e sem sabor, sem sentido, uma gozada de um vencedor, de um conquistador que perdeu sua alma, de Tamerlão que dominou o mundo todo para entregá-lo à mulher que já havia morrido quando ele voltou. Iria acontecer, de qualquer maneira. Só um pode ser o melhor. Só um pode conquistar a medalha de ouro. Mais cedo ou mais tarde ela me trairia. Tantos amigos sem trabalhar. Tantos amigos jovens e firmes. Tantos amigos de famílias ricas, com mesadas tão grandes quanto meu salário. Por que correr atrás da vitória? A medalha de ouro é difícil demais. O pódio está bom. Ficar com a medalha de bronze. Uma corrida boa. Uma excelente colocação. Só o hino que não toca. Uma medalha de qualquer jeito. Um pódio. Entre os primeiros. Entre os bons. Entre os melhores. O medalhista de prata odeia o que ganhou a medalha de ouro, o cara da medalha de bronze é da turma. Bronze. Terceiro. Pódio. Pontuar. Tábua de classificação. Conseguir a vaga. O índice.
- Eu gozei, amor. Amor?
A garota percebe que eu gozei e tenta me beijar. Priscila me chama.
- Fábio? Fábio?
Eu desligo. Eu fui criado para competir e vencer. Não sei perder. Nunca soube perder, nunca saberei perder.
Não sou bom perdedor.
janeiro 24, 2006
O GRANDE PRÊMIO DE SPRING FALLS
galvão
Boa tarde, amigos da Globo! Estamos aqui em Spring Falls para mais uma corrida da temporada! A pole position desta corrida ficou com Speed Racer, como as últimas 4.215. A segunda posição é do Corredor X e o terceiro, quarto, quinto, sexto, sétimo, oitavo, nono e décimo lugares ficaram com o Carro Mamute! Vai ser dada a largada!
os carros saem e há um acidente logo de cara com explosões espetaculares.
galvão
A largada foi bastante movimentada... parece que vão dar a bandeira amarela e vai entrar o carro madrinha...
reginaldo leme
Não, Galvão, o carro madrinha explodiu junto com dois pilotos... mas parece que só explodiram cinco carros, a corrida vai continuar...
dois dos carros descobrem metralhadoras embutidas e começam a atirar.
galvão
O Schumacher já começou a disparar. Parece que vai conseguir a ultrapassagem...
reginaldo
É, a Ferrari este ano está com uma nova metralhadora, uma Vulcan M1A1, elétrica, tipo Gatling, capaz de 6.000 tiros por minuto... o carro foi inteiramente redesenhado pelo novo projetista, Osama Bin Laden...
o mach 5 pula com suas famosas molas.
galvão
Speed Racer acabou de ultrapassar o Rubinho Barrichello, botando uma volta de vantagem sobre ele...
reginaldo
É, né, pro Mach 5 não tem essa história de ponto de ultrapassagem...
galvão
Pois é, Reginaldo, por que os outros projetistas ainda não puseram esse equipamento em seus carros?
reginaldo
Bem, parece que a Honda está testando isso nos seus laboratórios, mas o principal problema é que você perde um pouco de estabilidade quando dá os saltos... a equipe Mach 5 pode fazer porque tem o Speed Racer, que fez as últimas 4.215 pole positions e ainda venceu os últimos 4.215 Grandes Prêmios, mas as outras enfrentam problemas...
um carro bate no outro e o atira num precipício, havendo uma explosão terrível e grandes chamas.
galvão
Parece que houve um problema com o Ayrton Senna na curva Tamburello...
reginaldo
É, mas como o carro não ficou na pista, não há problemas...
o mach 5, com suas serras ligadas, derruba florestas para abrir caminho.
galvão
O Speed Racer agora usa toda a pista pra fazer a curva! Comeu a zebra, a grama, a caixa de brita e foi parar na floresta do circuito...
reginaldo
É, mas pelo regulamento, se ele tirar as quatro rodas da pista, tem que voltar por onde entrou... ele pode ser penalizado no pit stop...
galvão
Bem, parece que a corrida acabou para o Corredor X... e ele aqui está do meu lado! Se você tem alguma pergunta para fazer para o Corredor X, que muita gente garante que é brasileiro, pode mandar por e-mail que nós faremos. Tudo bem, Corredor X?
corredor X
(COM FORTE SOTAQUE JAPONÊS) Tudo, Galvão.
galvão
Você estava indo bem na corrida, Corredor X, quando aquele carro com um esporão radioativo tentou abalroar o Mach 5 e você jogou-se sobre ele, tirando os dois da corrida. Aliás, em todas as corridas, você acaba perdendo sua chance de vitória fazendo alguma coisa com alguém que vai ultrapassar Speed Racer...
Corredor X
Bem, é que o meu irmã... quero dizer, Speed Racer é um corredor muito valioso e nós, outros pilotos, nos achamos na obrigação de protegê-lo...
galvão
Mas o Mika Hakkinen, por exemplo, agora está atirando granadas no Mach 5...
corredor X
Está? Tenho que voltar para a pista!
galvão
Espere, Corredor X! Eu tenho uma pergunta de Daniel Valentim, de Sorocaba... "Você é espada?" Tarde demais... ele já foi...
reginaldo leme
É, Galvão, ele parou um dos carros do GP, nocauteou o piloto, prendeu-o como traficante internacional, voltou à corrida e deteve o Mika Hakkinen...
Galvão
E vai ser dada a bandeirada de chegada! Venceu Speed Racer! Sua 4.216a. vitória seguida! Um verdadeiro feito!
reginaldo Leme
É, Galvão, e eu estava conversando com ele, ele disse que quando chegar à 5.000a. vitória, ele pretende dedicar a Ayrton Senna, que ele diz ter sido o maior piloto que viu correndo...
galvão
Bem, amigos da Globo, até a próxima semana com mais um Grande Prêmio do Campeonato de Fórmula 1!
Boa tarde, amigos da Globo! Estamos aqui em Spring Falls para mais uma corrida da temporada! A pole position desta corrida ficou com Speed Racer, como as últimas 4.215. A segunda posição é do Corredor X e o terceiro, quarto, quinto, sexto, sétimo, oitavo, nono e décimo lugares ficaram com o Carro Mamute! Vai ser dada a largada!
os carros saem e há um acidente logo de cara com explosões espetaculares.
galvão
A largada foi bastante movimentada... parece que vão dar a bandeira amarela e vai entrar o carro madrinha...
reginaldo leme
Não, Galvão, o carro madrinha explodiu junto com dois pilotos... mas parece que só explodiram cinco carros, a corrida vai continuar...
dois dos carros descobrem metralhadoras embutidas e começam a atirar.
galvão
O Schumacher já começou a disparar. Parece que vai conseguir a ultrapassagem...
reginaldo
É, a Ferrari este ano está com uma nova metralhadora, uma Vulcan M1A1, elétrica, tipo Gatling, capaz de 6.000 tiros por minuto... o carro foi inteiramente redesenhado pelo novo projetista, Osama Bin Laden...
o mach 5 pula com suas famosas molas.
galvão
Speed Racer acabou de ultrapassar o Rubinho Barrichello, botando uma volta de vantagem sobre ele...
reginaldo
É, né, pro Mach 5 não tem essa história de ponto de ultrapassagem...
galvão
Pois é, Reginaldo, por que os outros projetistas ainda não puseram esse equipamento em seus carros?
reginaldo
Bem, parece que a Honda está testando isso nos seus laboratórios, mas o principal problema é que você perde um pouco de estabilidade quando dá os saltos... a equipe Mach 5 pode fazer porque tem o Speed Racer, que fez as últimas 4.215 pole positions e ainda venceu os últimos 4.215 Grandes Prêmios, mas as outras enfrentam problemas...
um carro bate no outro e o atira num precipício, havendo uma explosão terrível e grandes chamas.
galvão
Parece que houve um problema com o Ayrton Senna na curva Tamburello...
reginaldo
É, mas como o carro não ficou na pista, não há problemas...
o mach 5, com suas serras ligadas, derruba florestas para abrir caminho.
galvão
O Speed Racer agora usa toda a pista pra fazer a curva! Comeu a zebra, a grama, a caixa de brita e foi parar na floresta do circuito...
reginaldo
É, mas pelo regulamento, se ele tirar as quatro rodas da pista, tem que voltar por onde entrou... ele pode ser penalizado no pit stop...
galvão
Bem, parece que a corrida acabou para o Corredor X... e ele aqui está do meu lado! Se você tem alguma pergunta para fazer para o Corredor X, que muita gente garante que é brasileiro, pode mandar por e-mail que nós faremos. Tudo bem, Corredor X?
corredor X
(COM FORTE SOTAQUE JAPONÊS) Tudo, Galvão.
galvão
Você estava indo bem na corrida, Corredor X, quando aquele carro com um esporão radioativo tentou abalroar o Mach 5 e você jogou-se sobre ele, tirando os dois da corrida. Aliás, em todas as corridas, você acaba perdendo sua chance de vitória fazendo alguma coisa com alguém que vai ultrapassar Speed Racer...
Corredor X
Bem, é que o meu irmã... quero dizer, Speed Racer é um corredor muito valioso e nós, outros pilotos, nos achamos na obrigação de protegê-lo...
galvão
Mas o Mika Hakkinen, por exemplo, agora está atirando granadas no Mach 5...
corredor X
Está? Tenho que voltar para a pista!
galvão
Espere, Corredor X! Eu tenho uma pergunta de Daniel Valentim, de Sorocaba... "Você é espada?" Tarde demais... ele já foi...
reginaldo leme
É, Galvão, ele parou um dos carros do GP, nocauteou o piloto, prendeu-o como traficante internacional, voltou à corrida e deteve o Mika Hakkinen...
Galvão
E vai ser dada a bandeirada de chegada! Venceu Speed Racer! Sua 4.216a. vitória seguida! Um verdadeiro feito!
reginaldo Leme
É, Galvão, e eu estava conversando com ele, ele disse que quando chegar à 5.000a. vitória, ele pretende dedicar a Ayrton Senna, que ele diz ter sido o maior piloto que viu correndo...
galvão
Bem, amigos da Globo, até a próxima semana com mais um Grande Prêmio do Campeonato de Fórmula 1!
janeiro 18, 2006
DOIS EQUÍVOCOS SOBRE A QUEDA DA FRANÇA EM 1940
1. Os alemães deram um passeio porque tinham muito mais tanques.
Os aliados tinham não só MAIS tanques como de melhor qualidade. A ponta-de-lança de Rommel sofreu um pequeno e inconsequente contra-ataque dos blindados Matilda ingleses e teve a desagradável surpresa de descobrir que eles eram invulneráveis aos canhões de seus panzers. O grande problema, que se repetiria para os ancestrais do Beckham em todos os modelos até o fim da guerra, era a minúscula arma principal, de dimensões quase japonesas. Já os franceses tinham um tanque médio, o Somua, que superava qualquer coisa que os alemães tivessem, e um pesado, o Char B1, com um canhão no casco de 75 mm. Infelizmente para os descendentes de Asterix, as torres de seus carros tinham espaço para um só homem e o comandante era ao mesmo tempo municiador e artilheiro do armamento principal, não só sobrando pouco tempo para fazer o que deveria - comandar - como tornando a comunicação com a tripulação mais complicada.
Mas mesmo esses defeitos não explicam como eles foram sobrepujados por menos e piores blindados - o Panzer I mal resistia a tiros de fuzil e seu armamento principal era uma metralhadora! - e sim a concepção de guerra blindada. Os alemães juntavam todos os seus panzers, apoiavam-nos com artilharia aérea, o famoso bombardeio de mergulho Stuka, e partiam pra cima, derrubando tudo, destruindo o que pudessem, rompendo as linhas e desbaratando os centros de comando, deixando à infantaria somente o trabalho de ocupar o território e proteger os flancos. Os aliados preferiam usar seus tanques como guarda-costas dos infantes: os soldados avançavam na direção da linha contrária e junto iam os carros, para destruir ninhos de metralhadora, derrubar arame farpado e bombardear um ponto de resistência mais encarniçada. A idéia de usar os blindados se movendo como um único corpo irresistível era tão estranha aos comandantes angl0-franceses que no exército dos descendentes de Carlos Magno só se podia usar o rádio em código. Já os teutônicos só iam falando "Schnell, schnell, schnell" e mandando ver.
2. A Linha Maginot era tão ridícula que tinha canhões que só atiravam para um lado.
Alguém andou vendo muito Lawrence da Arábia, aquela cena em que eles tomam Aqaba vindos do deserto porque os canhões só apontavam para o mar. Só que ali eram canhões costeiros, que costumam ser enormes e poderosos e defender a costa (dã!). Com0 normalmente o litoral é por onde vem o inimigo, não faz sentido construí-los de maneira que possam atacar a terra, ou, na hipótese de tropas inimigas desembarcarem ali e tomarem a fortaleza, eles seriam virados contra seus próprios construtores. É o mesmo princípio da trincheira da I Guerra Mundial, onde o lado de trás era escancarado, pois se elas fossem tomadas, não dariam proteção ao adversário, o que facilitaria um contra-ataque.
Na verdade a Linha Maginot simplesmente foi flanqueada. Ela não ia até o litoral, porque o litoral era a Bélgica e a Bélgica não achou muito legal a idéia de construir um forte contra alemães e procurar encrenca com os sujeitos quando era declaradamente neutra. Na I Guerra Mundial eles já tinham sido invadidos, mas provavelmente os sempre brilhantes e surpreendentes militares teutônicos teriam uma nova idéia vinte anos depois. Eles tiveram, mas os anglo-franceses não, acharam que eles fariam a mesma coisa e, quando viram, estavam cercados e derrotados.
A Linha Maginot era derivada da fortaleza de concreto idealizada no final do século XIX e início do XX. Os primeiros fortes assim construídos que obtiveram fama foram os do complexo de fortalezas de Liège e fundamental em seu desenho era uma torre móvel com arma principal. Se você quer saber como era exatamente, é só ver o Forte de Copacabana, que nada mais é que um Módulo de Fortaleza de Liège pré-construído e vendido ao Brasil.
3.
Os aliados tinham não só MAIS tanques como de melhor qualidade. A ponta-de-lança de Rommel sofreu um pequeno e inconsequente contra-ataque dos blindados Matilda ingleses e teve a desagradável surpresa de descobrir que eles eram invulneráveis aos canhões de seus panzers. O grande problema, que se repetiria para os ancestrais do Beckham em todos os modelos até o fim da guerra, era a minúscula arma principal, de dimensões quase japonesas. Já os franceses tinham um tanque médio, o Somua, que superava qualquer coisa que os alemães tivessem, e um pesado, o Char B1, com um canhão no casco de 75 mm. Infelizmente para os descendentes de Asterix, as torres de seus carros tinham espaço para um só homem e o comandante era ao mesmo tempo municiador e artilheiro do armamento principal, não só sobrando pouco tempo para fazer o que deveria - comandar - como tornando a comunicação com a tripulação mais complicada.
Mas mesmo esses defeitos não explicam como eles foram sobrepujados por menos e piores blindados - o Panzer I mal resistia a tiros de fuzil e seu armamento principal era uma metralhadora! - e sim a concepção de guerra blindada. Os alemães juntavam todos os seus panzers, apoiavam-nos com artilharia aérea, o famoso bombardeio de mergulho Stuka, e partiam pra cima, derrubando tudo, destruindo o que pudessem, rompendo as linhas e desbaratando os centros de comando, deixando à infantaria somente o trabalho de ocupar o território e proteger os flancos. Os aliados preferiam usar seus tanques como guarda-costas dos infantes: os soldados avançavam na direção da linha contrária e junto iam os carros, para destruir ninhos de metralhadora, derrubar arame farpado e bombardear um ponto de resistência mais encarniçada. A idéia de usar os blindados se movendo como um único corpo irresistível era tão estranha aos comandantes angl0-franceses que no exército dos descendentes de Carlos Magno só se podia usar o rádio em código. Já os teutônicos só iam falando "Schnell, schnell, schnell" e mandando ver.
2. A Linha Maginot era tão ridícula que tinha canhões que só atiravam para um lado.
Alguém andou vendo muito Lawrence da Arábia, aquela cena em que eles tomam Aqaba vindos do deserto porque os canhões só apontavam para o mar. Só que ali eram canhões costeiros, que costumam ser enormes e poderosos e defender a costa (dã!). Com0 normalmente o litoral é por onde vem o inimigo, não faz sentido construí-los de maneira que possam atacar a terra, ou, na hipótese de tropas inimigas desembarcarem ali e tomarem a fortaleza, eles seriam virados contra seus próprios construtores. É o mesmo princípio da trincheira da I Guerra Mundial, onde o lado de trás era escancarado, pois se elas fossem tomadas, não dariam proteção ao adversário, o que facilitaria um contra-ataque.
Na verdade a Linha Maginot simplesmente foi flanqueada. Ela não ia até o litoral, porque o litoral era a Bélgica e a Bélgica não achou muito legal a idéia de construir um forte contra alemães e procurar encrenca com os sujeitos quando era declaradamente neutra. Na I Guerra Mundial eles já tinham sido invadidos, mas provavelmente os sempre brilhantes e surpreendentes militares teutônicos teriam uma nova idéia vinte anos depois. Eles tiveram, mas os anglo-franceses não, acharam que eles fariam a mesma coisa e, quando viram, estavam cercados e derrotados.
A Linha Maginot era derivada da fortaleza de concreto idealizada no final do século XIX e início do XX. Os primeiros fortes assim construídos que obtiveram fama foram os do complexo de fortalezas de Liège e fundamental em seu desenho era uma torre móvel com arma principal. Se você quer saber como era exatamente, é só ver o Forte de Copacabana, que nada mais é que um Módulo de Fortaleza de Liège pré-construído e vendido ao Brasil.
3.
janeiro 16, 2006
Dueto Improvisado
É tão fácil escrever coisas assim que nem tem graça. Mas tem gente que se impressiona. Olha lá, feito na lata:
De noite não fica muita gente. É hora de se arrumar e sentar num bar, é o que se espera num lugar de veraneio. Então ficam vários pescadores, depois das curvas das pedras, arrumando seus chicotes com linha transparente sob luz de lampiões, preparando seus anzóis feitos para serem pouco visíveis contra o fundo de areia. São poucos, mas anunciam suas presenças com pontos de luz e altas varas fincadas em estacadores. E nem reparam no território, os melhores têm que ter todos os sentidos voltados para o bambu - visão, audição, tato. Paladar e olfato eles guardam pra depois que o peixe sai. As praias esvaziadas são os territórios deles à noite.
O Marcos não tá pescando.
E chega perto dele a Rita.
- Oi.
O Marcos levanta o olhar da fogueirinha.
- Me dá um gole?
- Ainda nem abri.
- Eu abro.
A Rita pega a garrafa de cachaça, põe o gargalo entre os dentes e abre.
O Marcos, é claro, não espera que mulheres - e com menos de vinte - façam essas coisas despudoradamente por praias noturnas.
- Eu não esperava que mulheres - e com menos de vinte - fizessem essas coisas despudoradamente por praias noturnas.
(A Rita está dando um gole e engolindo).
- Quer dizer, já não é muito de se esperar que gostem de cachaça de estranhos...
- Horrível.
- Hã?
- "Cantinho da Roça"... que cachaça é essa?
- Eu não sei. Eu ia usar pra avivar a fogueira.
Abriu uma das malas com um conhaque, tirou a tampa e deu um gole.
- Só pra me esquentar.
- Por que você não comprou uma garrafa de álcool?
- Comprei num posto 24 horas. Nem vi se tinha álcool.
- Na bomba tinha.
- Com certeza.
Mais um gole.
- Pensei que você tivesse achado horrível.
- Estou com frio.
- Não quer conhaque?
- Não gosto de misturar.
- Você só deu um gole na cachaça.
- Dois.
- Pra quem tá bebendo tanto, você tá fazendo conta muito bem.
- Eu não bebo tanto assim.
- Quem abre garrafa com os dentes...
- Meu pai me ensinou. Eu abria Coca-Cola assim. E às vezes cerveja. Meu pai é que gosta de caipirinha. Mas ele bebe cachaça boa. Meu tio que faz. Ele daqui a pouco deve aparecer pra pescaria.
- Então aquele é o seu pai?
Ela senta perto dele.
- Quem você achou que fosse?
- Ninguém.
- Meu namorado?
- Ele não é grande e forte o suficiente pruma menina que abre cachaças com os dentes.
- Eu quase não bebo.
- Tá certo. Então você é só a selvagem da Diet Coke.
- Eu não gosto de Diet.
- Hm... é... é... claro que não... com esse corpo maravilhoso, pra quê essas preocupações?
- Meu corpo não é maravilhoso. Olha, eu tenho culote.
- Eu olho com uma perspectiva quinze anos além do seu tempo.
- Hã?
- Esquece, garota.
- Rita.
- Seu nome?
- É. Qual é o seu?
- Não sei se acredito que esse é o seu nome.
- Por que que eu ia mentir?
- Por que você diria a verdade?
- Eu não conheço você, pra que que eu ia precisar mentir?
- Ha. No começo é sempre assim. Nós não nos conhecemos. Então tudo que dizemos um pro outro é sempre verdade. Não temos como saber, não temos como descobrir. Depois o casal passa a se conhecer bem demais. Até pra saber que o outro está mentindo quando pensa que está contando a verdade.
- O que tem isso a ver com o meu nome?
- "A linguagem é um vírus do espaço exterior/Eu prefiro conhecer seu rosto do que seu nome".
- Mas você já sabe os meus dois e eu ainda nem conheço o seu nome.
- Prefira o meu rosto.
- Olha, eu acho que é melhor que você tenha um nome bem bonito.
- O que você acha um nome bonito?
- Um nome que seja gostoso de ouvir. Não precisa dizer o seu não.
- Ué, por quê?
- Porque se o seu fosse gostoso de ouvir, você ia gostar de falar.
- Aposto que você desconcerta todos os seus amigos...
- Eles já vieram quebrados de fábrica.
- Desconcertar não quer dizer quebrar. Quer dizer deixar sem reação.
- Tanto faz. Eu não tenho namorado por causa disso.
- Porque você os desconcerta?
- Não, porque eles já vieram quebrados de fábrica.
- E nunca teve?
- Claro que já.
- E esses não vieram quebrados de fábrica?
- Vieram. Mas vieram bonitos também. Carinhosos. Gostosos...
- E quantos foram?
- Menos do que suas namoradas.
- Eu posso ter casado cedo.
- Ela não ia te deixar aqui sózinho. Ou então vocês não se gostam e você tem um monte de namoradas mesmo assim.
- Eu não tenho um monte de namoradas.
- Claro, se não não ia estar aqui sozinho.
- Então por que perguntou?
- Porque eu não queria dizer quantos namorados eu tive.
- Você podia ter dito isso desde o começo.
- Aí você ia insistir.
- Não devem ter sido muitos, você também está sozinha aqui.
- Eu estou com o meu pai.
- E eu estou com a minha fogueira. Meu álcool. Minhas coisas por queimar.
- Que coisas por queimar?
- Umas coisas que eu nunca quis jogar fora, mas que não tem mais espaço pra elas nem na casa de praia.
- Você podia só jogar fora.
- Eu gosto de uma fogueira.
- Podia dar pra alguém.
- A quem interessaria revistas em quadrinhos velhas, cadernos de anotações, cartas, bilhetes e cartões postais antigos..?
- Aposto que as fotos você guardou...
- Guardei.
- Por que todo mundo sempre joga fora escrito e nunca joga fora foto?
- Não sei. Vai ver que é porque o espírito nunca envelhece então a gente não precisa olhar alguma coisa pra lembrar como era.
- Isso você quer dizer que escrito vem do espírito?
- É.
- Então, se espírito nunca envelhece, porque minhas redações quando eu era pequena eram tão bobinhas?
- Por que você ainda precisava aprender muito...
- E aprendendo você não envelhece?
- Não. Podemos ficar mais velhos, mas não mais sábios.
- Mas podemos ficar mais sábios sem ficarmos mais velhos?
- Nós nunca ficamos mais sábios, Rita.
- Eu sei. Eu não me sinto mais sábia.
- É que ainda não deu tempo pra você.
- Deu sim. Eu entendia melhor o mundo quando era criança.
- E o que você entendia dele?
- Entendia o que era bom e o que era mau.
- E o que era mau?
- Era o que era errado.
- E hoje em dia não é mais?
- Beber é errado. Eu sou má?
O Marcos ri.
- Temo profundamente que sim. Você deve destruir corações de garotos da sua idade...
- Eu não sabia que eles tinham coração.
- Eles têm. É que eles escondem.
- E por quê?
- Pra você não os destruir...
- Eu não me interesso por eles. Nem eles e nem os corações.
- Eu sei. Por isso que você os destrói.
- Mas eu realmente não me interesso.
- Pois imagine isso: um deus só existe se alguém acredita que ele exista. Um coração só resiste se alguém se interessa por ele.
- Não entendi.
- É como um daqueles enigmas zen: qual o som de uma árvore caindo no meio da floresta quando não há ninguém para ouvi-la?
- Bum.
- Como se pode saber se não há ninguém para ouvi-la?
- Então ela pode fazer bam. Bim. Bom.
- Sim, mas como dizer?
- Então é que nem a luz da geladeira?
- É. É que nem a luz da geladeira.
- E o que tem isso a ver com corações de meninos?
- Boa pergunta.
Silêncio.
- É que eles não batem se não batem por ninguém.
- E por quem o seu bate?
- Você falou que não queria me perguntar isso...
- Eu não queria perguntar, mas queria saber.
- Eu não tenho coração.
- Se não tivesse, não conversava comigo tanto tempo. Não me dava álcool. Não vinha a uma praia e acendia uma fogueira.
- Praias fazem frio.
- Em casa é quentinho.
- Nem sempre.
- Lá em casa é. Meus pais me dão apoio pra tudo.
- Há muito tempo que não moro com meus pais.
- Você devia dar apoio pra tudo pros teus filhos.
- Eu não tenho filhos.
- Então você devia dar apoio pra tudo pros teus cachorros.
- Eu não tenho cachorro.
- Gatos?
- Não.
- Peixes?
- Pra quem veio com o pai ferrar alguns, essa é uma pergunta estranha.
- Nada, quem se ferra mais é o meu pai, sempre pega menos do que disse que ia pegar.
- A Natureza é sábia. Assim, nossos filhos ainda terão peixes para pescar.
- Você não tem filhos.
- Posso ter ainda.
- Então por que não teve ainda?
- Não sei. Por que você não teve ainda?
- Ainda estou em fase de crescimento. Meu útero ainda não está cem por cento.
- Deus tenha piedade dos rapazes quando ele chegar nessa percentagem.
- Você fala como se não fosse um rapaz.
- Sou um homem.
- Desde quando?
- Desde que comecei a fogueira.
- E quando ela apagar?
- Você já vai ter ido pra casa.
- Não. A gente tá numa pousada.
- E você não se sente em casa nela, quando volta do dia pescando ou rodando as praias ou paquerando ou dançando?
- Não.
- Onde você se sente em casa?
- Aqui.
- Não tem nada te cercando aqui.
- Então...
- Mas você falou que sua casa é quentinha.
- Aqui é quentinho. Tem até fogueira.
- Ainda não acendi.
- Mas tem a fogueira: o álcool, a madeira, o jornal. Só falta o fogo.
- O fogo é que faz o calor.
- Pensei que era o coração.
- E o que você acha que é o coração da fogueira?
- Quem põe fogo.
Silêncio. Gole de cachaça. Gole de conhaque.
A garota pega uma das histórias em quadrinhos.
- Me dá?
- Você gosta de história em quadrinhos?
- Passo a gostar.
- Por que que eu daria pra alguém que nem conhece quadrinhos?
- Porque você gosta de mim.
- Como é que você sabe que eu gosto de você?
- Porque eu sou bonita.
- E menor de idade.
- Quem disse que eu sou menor de idade?
- Seu pai.
- Papai não falou nada. Tá só pescando.
- E ele deixa a filha ficar bebendo com homens mais velhos?
- Mamãe tem quinze anos a menos do que ele.
(BREVE A POSTAGEM CORRETA)
De noite não fica muita gente. É hora de se arrumar e sentar num bar, é o que se espera num lugar de veraneio. Então ficam vários pescadores, depois das curvas das pedras, arrumando seus chicotes com linha transparente sob luz de lampiões, preparando seus anzóis feitos para serem pouco visíveis contra o fundo de areia. São poucos, mas anunciam suas presenças com pontos de luz e altas varas fincadas em estacadores. E nem reparam no território, os melhores têm que ter todos os sentidos voltados para o bambu - visão, audição, tato. Paladar e olfato eles guardam pra depois que o peixe sai. As praias esvaziadas são os territórios deles à noite.
O Marcos não tá pescando.
E chega perto dele a Rita.
- Oi.
O Marcos levanta o olhar da fogueirinha.
- Me dá um gole?
- Ainda nem abri.
- Eu abro.
A Rita pega a garrafa de cachaça, põe o gargalo entre os dentes e abre.
O Marcos, é claro, não espera que mulheres - e com menos de vinte - façam essas coisas despudoradamente por praias noturnas.
- Eu não esperava que mulheres - e com menos de vinte - fizessem essas coisas despudoradamente por praias noturnas.
(A Rita está dando um gole e engolindo).
- Quer dizer, já não é muito de se esperar que gostem de cachaça de estranhos...
- Horrível.
- Hã?
- "Cantinho da Roça"... que cachaça é essa?
- Eu não sei. Eu ia usar pra avivar a fogueira.
Abriu uma das malas com um conhaque, tirou a tampa e deu um gole.
- Só pra me esquentar.
- Por que você não comprou uma garrafa de álcool?
- Comprei num posto 24 horas. Nem vi se tinha álcool.
- Na bomba tinha.
- Com certeza.
Mais um gole.
- Pensei que você tivesse achado horrível.
- Estou com frio.
- Não quer conhaque?
- Não gosto de misturar.
- Você só deu um gole na cachaça.
- Dois.
- Pra quem tá bebendo tanto, você tá fazendo conta muito bem.
- Eu não bebo tanto assim.
- Quem abre garrafa com os dentes...
- Meu pai me ensinou. Eu abria Coca-Cola assim. E às vezes cerveja. Meu pai é que gosta de caipirinha. Mas ele bebe cachaça boa. Meu tio que faz. Ele daqui a pouco deve aparecer pra pescaria.
- Então aquele é o seu pai?
Ela senta perto dele.
- Quem você achou que fosse?
- Ninguém.
- Meu namorado?
- Ele não é grande e forte o suficiente pruma menina que abre cachaças com os dentes.
- Eu quase não bebo.
- Tá certo. Então você é só a selvagem da Diet Coke.
- Eu não gosto de Diet.
- Hm... é... é... claro que não... com esse corpo maravilhoso, pra quê essas preocupações?
- Meu corpo não é maravilhoso. Olha, eu tenho culote.
- Eu olho com uma perspectiva quinze anos além do seu tempo.
- Hã?
- Esquece, garota.
- Rita.
- Seu nome?
- É. Qual é o seu?
- Não sei se acredito que esse é o seu nome.
- Por que que eu ia mentir?
- Por que você diria a verdade?
- Eu não conheço você, pra que que eu ia precisar mentir?
- Ha. No começo é sempre assim. Nós não nos conhecemos. Então tudo que dizemos um pro outro é sempre verdade. Não temos como saber, não temos como descobrir. Depois o casal passa a se conhecer bem demais. Até pra saber que o outro está mentindo quando pensa que está contando a verdade.
- O que tem isso a ver com o meu nome?
- "A linguagem é um vírus do espaço exterior/Eu prefiro conhecer seu rosto do que seu nome".
- Mas você já sabe os meus dois e eu ainda nem conheço o seu nome.
- Prefira o meu rosto.
- Olha, eu acho que é melhor que você tenha um nome bem bonito.
- O que você acha um nome bonito?
- Um nome que seja gostoso de ouvir. Não precisa dizer o seu não.
- Ué, por quê?
- Porque se o seu fosse gostoso de ouvir, você ia gostar de falar.
- Aposto que você desconcerta todos os seus amigos...
- Eles já vieram quebrados de fábrica.
- Desconcertar não quer dizer quebrar. Quer dizer deixar sem reação.
- Tanto faz. Eu não tenho namorado por causa disso.
- Porque você os desconcerta?
- Não, porque eles já vieram quebrados de fábrica.
- E nunca teve?
- Claro que já.
- E esses não vieram quebrados de fábrica?
- Vieram. Mas vieram bonitos também. Carinhosos. Gostosos...
- E quantos foram?
- Menos do que suas namoradas.
- Eu posso ter casado cedo.
- Ela não ia te deixar aqui sózinho. Ou então vocês não se gostam e você tem um monte de namoradas mesmo assim.
- Eu não tenho um monte de namoradas.
- Claro, se não não ia estar aqui sozinho.
- Então por que perguntou?
- Porque eu não queria dizer quantos namorados eu tive.
- Você podia ter dito isso desde o começo.
- Aí você ia insistir.
- Não devem ter sido muitos, você também está sozinha aqui.
- Eu estou com o meu pai.
- E eu estou com a minha fogueira. Meu álcool. Minhas coisas por queimar.
- Que coisas por queimar?
- Umas coisas que eu nunca quis jogar fora, mas que não tem mais espaço pra elas nem na casa de praia.
- Você podia só jogar fora.
- Eu gosto de uma fogueira.
- Podia dar pra alguém.
- A quem interessaria revistas em quadrinhos velhas, cadernos de anotações, cartas, bilhetes e cartões postais antigos..?
- Aposto que as fotos você guardou...
- Guardei.
- Por que todo mundo sempre joga fora escrito e nunca joga fora foto?
- Não sei. Vai ver que é porque o espírito nunca envelhece então a gente não precisa olhar alguma coisa pra lembrar como era.
- Isso você quer dizer que escrito vem do espírito?
- É.
- Então, se espírito nunca envelhece, porque minhas redações quando eu era pequena eram tão bobinhas?
- Por que você ainda precisava aprender muito...
- E aprendendo você não envelhece?
- Não. Podemos ficar mais velhos, mas não mais sábios.
- Mas podemos ficar mais sábios sem ficarmos mais velhos?
- Nós nunca ficamos mais sábios, Rita.
- Eu sei. Eu não me sinto mais sábia.
- É que ainda não deu tempo pra você.
- Deu sim. Eu entendia melhor o mundo quando era criança.
- E o que você entendia dele?
- Entendia o que era bom e o que era mau.
- E o que era mau?
- Era o que era errado.
- E hoje em dia não é mais?
- Beber é errado. Eu sou má?
O Marcos ri.
- Temo profundamente que sim. Você deve destruir corações de garotos da sua idade...
- Eu não sabia que eles tinham coração.
- Eles têm. É que eles escondem.
- E por quê?
- Pra você não os destruir...
- Eu não me interesso por eles. Nem eles e nem os corações.
- Eu sei. Por isso que você os destrói.
- Mas eu realmente não me interesso.
- Pois imagine isso: um deus só existe se alguém acredita que ele exista. Um coração só resiste se alguém se interessa por ele.
- Não entendi.
- É como um daqueles enigmas zen: qual o som de uma árvore caindo no meio da floresta quando não há ninguém para ouvi-la?
- Bum.
- Como se pode saber se não há ninguém para ouvi-la?
- Então ela pode fazer bam. Bim. Bom.
- Sim, mas como dizer?
- Então é que nem a luz da geladeira?
- É. É que nem a luz da geladeira.
- E o que tem isso a ver com corações de meninos?
- Boa pergunta.
Silêncio.
- É que eles não batem se não batem por ninguém.
- E por quem o seu bate?
- Você falou que não queria me perguntar isso...
- Eu não queria perguntar, mas queria saber.
- Eu não tenho coração.
- Se não tivesse, não conversava comigo tanto tempo. Não me dava álcool. Não vinha a uma praia e acendia uma fogueira.
- Praias fazem frio.
- Em casa é quentinho.
- Nem sempre.
- Lá em casa é. Meus pais me dão apoio pra tudo.
- Há muito tempo que não moro com meus pais.
- Você devia dar apoio pra tudo pros teus filhos.
- Eu não tenho filhos.
- Então você devia dar apoio pra tudo pros teus cachorros.
- Eu não tenho cachorro.
- Gatos?
- Não.
- Peixes?
- Pra quem veio com o pai ferrar alguns, essa é uma pergunta estranha.
- Nada, quem se ferra mais é o meu pai, sempre pega menos do que disse que ia pegar.
- A Natureza é sábia. Assim, nossos filhos ainda terão peixes para pescar.
- Você não tem filhos.
- Posso ter ainda.
- Então por que não teve ainda?
- Não sei. Por que você não teve ainda?
- Ainda estou em fase de crescimento. Meu útero ainda não está cem por cento.
- Deus tenha piedade dos rapazes quando ele chegar nessa percentagem.
- Você fala como se não fosse um rapaz.
- Sou um homem.
- Desde quando?
- Desde que comecei a fogueira.
- E quando ela apagar?
- Você já vai ter ido pra casa.
- Não. A gente tá numa pousada.
- E você não se sente em casa nela, quando volta do dia pescando ou rodando as praias ou paquerando ou dançando?
- Não.
- Onde você se sente em casa?
- Aqui.
- Não tem nada te cercando aqui.
- Então...
- Mas você falou que sua casa é quentinha.
- Aqui é quentinho. Tem até fogueira.
- Ainda não acendi.
- Mas tem a fogueira: o álcool, a madeira, o jornal. Só falta o fogo.
- O fogo é que faz o calor.
- Pensei que era o coração.
- E o que você acha que é o coração da fogueira?
- Quem põe fogo.
Silêncio. Gole de cachaça. Gole de conhaque.
A garota pega uma das histórias em quadrinhos.
- Me dá?
- Você gosta de história em quadrinhos?
- Passo a gostar.
- Por que que eu daria pra alguém que nem conhece quadrinhos?
- Porque você gosta de mim.
- Como é que você sabe que eu gosto de você?
- Porque eu sou bonita.
- E menor de idade.
- Quem disse que eu sou menor de idade?
- Seu pai.
- Papai não falou nada. Tá só pescando.
- E ele deixa a filha ficar bebendo com homens mais velhos?
- Mamãe tem quinze anos a menos do que ele.
(BREVE A POSTAGEM CORRETA)
ZEN
É fazendo merda que se aduba a vida.
Se todas as pessoas do mundo dessem as mãos não ia sobrar ninguém pra fazer o almoço.
Disse-lhe que sentia tanto sua falta e ela me respondeu que eu nunca lhe senti a presença. E que, viciado em sentimentos, fiz tudo para que ela fosse embora.
A maldição e a bênção dos homens é o esquecimento, o tempo que lava nossos amores e nossas mágoas, trazendo a indiferença e a morte. Por que então em mim este sopro de eterno, que não consigo te esquecer?
Se todas as pessoas do mundo dessem as mãos não ia sobrar ninguém pra fazer o almoço.
Disse-lhe que sentia tanto sua falta e ela me respondeu que eu nunca lhe senti a presença. E que, viciado em sentimentos, fiz tudo para que ela fosse embora.
A maldição e a bênção dos homens é o esquecimento, o tempo que lava nossos amores e nossas mágoas, trazendo a indiferença e a morte. Por que então em mim este sopro de eterno, que não consigo te esquecer?
janeiro 06, 2006
POEMA CURTO
No mês passado voltei
À minha casa silenciosa e sombria
E encontrei uma mulher que não estava lá
Ela também não estava lá na semana passada
E tampouco ontem ou anteontem
Ó, Senhor, por quê, por que ela não vai embora?
À minha casa silenciosa e sombria
E encontrei uma mulher que não estava lá
Ela também não estava lá na semana passada
E tampouco ontem ou anteontem
Ó, Senhor, por quê, por que ela não vai embora?
Preciso matar meu pai para me tornar adulto
Joseph Campbell culpa a falta de mitos e ritos de passagem em nossa sociedade pela personalidade frágil moderna e sua suscetibilidade ao estresse e às pressões, sua sensação de abandono e desamparo, seu egocentrismo e falta de rumo espiritual, aquele medo de assumir responsabilidades, enfim, sua puerilidade, sua imaturidade... Quando exatamente sabemos que não somos mais meninos? Em minha infância havia ainda muitas coisas que se podiam dizer inegavelmente de criança: balas, revistas em quadrinhos, desenhos animados, videogames, coleção de miniaturas... estão entendendo aonde eu quero chegar?
Nas sociedades mais antigas e/ou mais primitivas, a transformação do adolescente em adulto não era um processo vago e longo. Em certa idade você passava por um ritual, normalmente exaustivo e desafiador, e pronto, não havia dúvida, você era um adulto. Em Roma, por exemplo, o debutante recebia sua toga; em culturas de caça e coleta envolvia normalmente um êxtase místico, a perfuração para receber brincos ou aros, que causavam deformações em orelhas, lábios, narizes, ou então cortes nos membros e no torso, tatuagens, enfim, o adolescente era testado, era exposto à dor de crescer e saber-se mais perto da morte e era mesmo fisicamente transformado. Ao voltar de sua iniciação o seu corpo definitivamente não era mais o mesmo, você tinha marcas que mostravam que você era adulto e não iriam deixá-lo voltar a agir como criança.
Nessas culturas o indivíduo neurótico ou desajustado não durava muito. Se os adultos percebiam durante o ritual qualquer incapacidade, o adolescente se tornava um pária, era expulso da tribo ou em casos mais extremos, era morto pelos que o iniciavam. A sociedade em questão era mais vigorosa e homogênea, com um forte senso de identificação com os objetivos e finalidades das pessoas em volta.
Só que havia um preço a se pagar: a perda do pensamento original e da criatividade.
Nas sociedades mais antigas e/ou mais primitivas, a transformação do adolescente em adulto não era um processo vago e longo. Em certa idade você passava por um ritual, normalmente exaustivo e desafiador, e pronto, não havia dúvida, você era um adulto. Em Roma, por exemplo, o debutante recebia sua toga; em culturas de caça e coleta envolvia normalmente um êxtase místico, a perfuração para receber brincos ou aros, que causavam deformações em orelhas, lábios, narizes, ou então cortes nos membros e no torso, tatuagens, enfim, o adolescente era testado, era exposto à dor de crescer e saber-se mais perto da morte e era mesmo fisicamente transformado. Ao voltar de sua iniciação o seu corpo definitivamente não era mais o mesmo, você tinha marcas que mostravam que você era adulto e não iriam deixá-lo voltar a agir como criança.
Nessas culturas o indivíduo neurótico ou desajustado não durava muito. Se os adultos percebiam durante o ritual qualquer incapacidade, o adolescente se tornava um pária, era expulso da tribo ou em casos mais extremos, era morto pelos que o iniciavam. A sociedade em questão era mais vigorosa e homogênea, com um forte senso de identificação com os objetivos e finalidades das pessoas em volta.
Só que havia um preço a se pagar: a perda do pensamento original e da criatividade.
TRÊS EQUÍVOCOS SOBRE A SEGUNDA GUERRA MUNDIAL
1. O Dia D foi o ponto de virada da Segunda Guerra Mundial.
Em junho de 1944 a maioria dos generais alemães estava pensando em como prolongar a guerra pra conseguir um tratado de paz mais vantajoso. A maior e melhor parte do exército alemão estava sendo dizimada na União Soviética, a força aérea era um farrapo e os aviões aliados voavam livremente pelos céus, o que forçava a Wermacht a realizar todos seus movimentos exclusivamente à noite. A invasão da Normandia foi inegavelmente o golpe final, mas se você quer porque quer saber onde ficam os "pontos de virada" mais importantes, pode escolher entre os seguintes:
a Batalha da Inglaterra, em setembro de 1940, quando ficou claro que Hitler não tinha condições de subjugar os ingleses;
a Batalha de Moscou, dezembro de 1941, quando acabaram as chances nazistas de uma vitória rápida e suas forças perderam a capacidade de atacar simultaneamente em toda a frente;
a Batalha de Stalingrado, setembro de 1942 a janeiro de 1943, quando os alemães perderam a capacidade de grandes ofensivas estratégicas e a Batalha de Kursk, em maio-junho de 1943, o último ataque alemão com importância estratégica.
2. A campanha de bombardeios pôs a Alemanha de joelhos.
Este assunto é tema de sérios debates: uns dizem que a campanha de bombardeio foi um completo e retumbante fracasso, outros dizem que foi só um fracassinho e que foi importante porque obrigou os nazistas a desviarem canhões antiaéreos e tropas para a defesa de seu território e as perdas de caças foram decisivas na debacle da Luftwaffe.
Fica difícil defender o sucesso da campanha quando se vê que nos últimos anos de guerra foi quando a Alemanha mais produziu tanques e aviões. Somente a alta tecnologia iria tornar verdadeiras as concepções teóricas dos anos 20 que pregavam o bombardeio estratégico como força irresistível. Ainda no Vietnã os resultados foram decepcionantes e aguarda-se um teste contra países melhor equipados do que Sérvia e Iraque.
3. A frente russa foi secundária.
Todos os filmes que vemos têm batalhas grandiosas vencidas - ou eventualmente perdidas - por americanos e ingleses. Tudo que sabemos da frente russa é que o comandante Klink e o sargento Schultz viviam sendo ameaçados de serem mandados para lá (menores de trinta anos podem consultar a wikipedia sobre quem são estes famosos soldados).Mas é claro. Quantos filmes russos sobre a segunda guerra alguém já viu na vida? Sem contar que não se podia encher a bola daqueles comunas sujos durante a guerra fria e o óbvio orgulho que os ianques têm de terem dado o sangue para esmagar aqueles nazistas.
Dois terços, os melhores dois terços, de todo o esforço militar alemão estavam na frente russa. Foi em Moscou que cessaram as esperanças de uma vitória rápida, foi em Stalingrado que a coisa ficou feia pros alemães e em Kursk e na Destruição do Grupo de Exércitos Centro a grande questão deixou de ser se a Alemanha seria derrotada para tornar-se quando a Alemanha seria derrotada. Se você gosta de admirar os americanos, sempre pode lembrar que eles, virtualmente sozinhos e com as sobras da campanha européia, esmagaram os japas com uma estratégia brilhante. Os nipônicos quando levaram a bomba atômica na cabeça também só estavam tentando arrumar uma rendição honrosa.
E, falando no Sargento Schultz, alguém sabia que ele era dono de uma gigantesca fábrica de brinquedos? Descobri no Wikipedia.
Em junho de 1944 a maioria dos generais alemães estava pensando em como prolongar a guerra pra conseguir um tratado de paz mais vantajoso. A maior e melhor parte do exército alemão estava sendo dizimada na União Soviética, a força aérea era um farrapo e os aviões aliados voavam livremente pelos céus, o que forçava a Wermacht a realizar todos seus movimentos exclusivamente à noite. A invasão da Normandia foi inegavelmente o golpe final, mas se você quer porque quer saber onde ficam os "pontos de virada" mais importantes, pode escolher entre os seguintes:
a Batalha da Inglaterra, em setembro de 1940, quando ficou claro que Hitler não tinha condições de subjugar os ingleses;
a Batalha de Moscou, dezembro de 1941, quando acabaram as chances nazistas de uma vitória rápida e suas forças perderam a capacidade de atacar simultaneamente em toda a frente;
a Batalha de Stalingrado, setembro de 1942 a janeiro de 1943, quando os alemães perderam a capacidade de grandes ofensivas estratégicas e a Batalha de Kursk, em maio-junho de 1943, o último ataque alemão com importância estratégica.
2. A campanha de bombardeios pôs a Alemanha de joelhos.
Este assunto é tema de sérios debates: uns dizem que a campanha de bombardeio foi um completo e retumbante fracasso, outros dizem que foi só um fracassinho e que foi importante porque obrigou os nazistas a desviarem canhões antiaéreos e tropas para a defesa de seu território e as perdas de caças foram decisivas na debacle da Luftwaffe.
Fica difícil defender o sucesso da campanha quando se vê que nos últimos anos de guerra foi quando a Alemanha mais produziu tanques e aviões. Somente a alta tecnologia iria tornar verdadeiras as concepções teóricas dos anos 20 que pregavam o bombardeio estratégico como força irresistível. Ainda no Vietnã os resultados foram decepcionantes e aguarda-se um teste contra países melhor equipados do que Sérvia e Iraque.
3. A frente russa foi secundária.
Todos os filmes que vemos têm batalhas grandiosas vencidas - ou eventualmente perdidas - por americanos e ingleses. Tudo que sabemos da frente russa é que o comandante Klink e o sargento Schultz viviam sendo ameaçados de serem mandados para lá (menores de trinta anos podem consultar a wikipedia sobre quem são estes famosos soldados).Mas é claro. Quantos filmes russos sobre a segunda guerra alguém já viu na vida? Sem contar que não se podia encher a bola daqueles comunas sujos durante a guerra fria e o óbvio orgulho que os ianques têm de terem dado o sangue para esmagar aqueles nazistas.
Dois terços, os melhores dois terços, de todo o esforço militar alemão estavam na frente russa. Foi em Moscou que cessaram as esperanças de uma vitória rápida, foi em Stalingrado que a coisa ficou feia pros alemães e em Kursk e na Destruição do Grupo de Exércitos Centro a grande questão deixou de ser se a Alemanha seria derrotada para tornar-se quando a Alemanha seria derrotada. Se você gosta de admirar os americanos, sempre pode lembrar que eles, virtualmente sozinhos e com as sobras da campanha européia, esmagaram os japas com uma estratégia brilhante. Os nipônicos quando levaram a bomba atômica na cabeça também só estavam tentando arrumar uma rendição honrosa.
E, falando no Sargento Schultz, alguém sabia que ele era dono de uma gigantesca fábrica de brinquedos? Descobri no Wikipedia.
janeiro 02, 2006
Foi uma época em que o tempo perdeu a continuidade. Os empregados e seus trabalhos repetitivos vendo o relógio que não andava, as pessoas sempre andando na calçada sem chegarem a lugar nenhum (mesmo porque quando chegavam os lugares já tinham mudado e não eram mais aqueles aonde eles queriam ir) e fazendo planos inúteis para o futuro porque subitamente ele era o presente. As pessoas morriam antes de nascer e a comida saltava do prato no meio da refeição. Os jovens sabiam mais do que os velhos e estes não podiam nem mais viver em suas lembranças, pois nem sabiam se elas realmente existiam. Os artistas tinham o fim mas não o começo e outros tinham o início mas não o final e todas as histórias viraram um longo meio. Não havia mais um tempo de nascer nem outro de morrer, um de semear ou outro de colher. As coisas ruíam, o centro não conseguia segurar. A Terra podia parar em seu giro. Então decidiram que tudo devia estar acontecendo sempre. Alguém decidiu e fez as Leis que, no estado das coisas, começaram a ser cumpridas antes de serem decretadas. Para evitar que as pessoas ficassem presas sempre no mesmo momento e para que a vida e o trabalho pudessem progredir e ter algum significado, ninguém podia fazer sempre a mesma coisa. O patrão hoje era o faxineiro amanhã, o lavador de carros virava o motorista, depois o dono do carro, depois metalúrgico. O economista virava arqueólgo e o historiador virava paleontólogo. Os mandatos dos políticos eram de apenas um dia e isso aumentou muito o número de escândalos, mas ninguém ligava muito porque os acontecimentos eram muito vertiginosos. Muitos comemoraram porque era o fim da rotina, mas aos poucos foram percebendo que a variedade também era rotineira e que não podiam parar nem quando encontravam finalmente aquilo que sempre haviam sonhado. Era terminantemente proibido se repetir e só pensar nisso já era perigoso porque a polícia podia chegar antes do crime ser cometido e ninguém nunca sabia quanto da vida ia perder na prisão, ou mesmo se a prisão ainda existiria enquanto cumpriam pena. Porque os lugares, também eles viviam sob o tempo e também nunca se sabia se sua casa ainda seria a sua casa quando lá chegasse, então todo mundo dormia no lugar que encontrava e acabou todo mundo se acostumando a viver com todo mundo, era uma aldeia global, o importante e o principal era se manter em movimento ou o mundo parava, e a raça humana não podia estagnar pois podia morrer em vida. Ninguém podia se repetir, nada podia se repetir, tudo isso era violentamente reprimido e vigiado. E como as pessoas sempre repetem os mesmos erros quando se trata de amor, então ninguém podia - de jeito nenhum, porque uma vez só já é arriscado - se apaixonar mais do que uma vez na vida. (Começo de A ETERNIDADE EM UM BEIJO).
ORAÇÃO
Perdoeme, Pai, pois eu cometi atos... questionáveis... muito amor prometi a mulheres apenas para tê-las a meu lado. Muitas levei a mostras de filmes... de livros... restaurantes caros e lojas caras e as afoguei num mar de citações, pois esqueci que mesmo sabendo a língua dos Anjos, sem amor eu nada seria. Mesmo em presença delas, desejei outras e na realidade nenhuma desejava, pois da minha vida em meio à jornada, achei-me em selva tenebrosa, tendo perdido a verdadeira estrada. Escolhi os líderes errados e segui Verdades tão confusas quanto eu. Odiei os que me queriam bem por serem felizes e não me fazerem feliz e chamei de invejosos àqueles que não se curvaram aos meus caprichos. Fomentei o desprezo por todos os atos de piedade e compreensão para que eu não tivesse que me apiedar ou compreender os outros. Eu pequei, Pai, reneguei tudo em que acreditava - por dinheiro, poder e sexo, eu menti, enganei e trapaceei - e, em minha mesquinhez chamei meus pecados de maturidade... e êxito. Perdoa, Pai, este teu filho tão cruel, egoísta e covarde que nem mesmo perder-se conseguiu. Perdoa-me por, com tudo que me deste, não Te agradar nem desagradar. Perdoa-me por aceitar que outros se penitenciassem por mim. Que outras o fizessem... Perdoa-me por nunca ter-lhes dito o quanto as amava... o quanto...
(da peça A DÉCADA PERDIDA)
(da peça A DÉCADA PERDIDA)
ARGENTINA x INGLATERRA
O Sportv passou o VT hoje. Revi boa parte. Jogão. Tudo bem, a Inglaterra tem o Owen, o Beckham, o Lampard, o Gerrard e o Rooney, mas passou a maior parte do jogo dominada pelos argentínios. No primeiro tempo já era pra estarem perdendo, mas o Gerrard e o Lampard parecem uns Adrianos brancos, batem de primeira, de onde estiverem e com precisão. Só foram virar com dois gols de cabeça no finalzinho depois que os platenhos trocaram meio time e, principalmente, tiraram o único zagueiro bom no jogo aéreo.
Interessante foi que a Argentina mudou sua marcação. Até a Copa das Confederações eles jogavam marcando sob pressão no primeiro tempo pra botar uma vantagem e depois recuavam, porque o time ficava esgotado de correr atrás da bola sem parar. Foi assim que eles fizeram 3 x 1 na gente nas eliminatórias. Mandaram os reservas para a Bolívia no jogo anterior pra ter uma semana pra descansar e treinar e entraram preparadinhos pro jogo, deram um banho. Na Copa das Confederações tentaram fazer o mesmo, só que vinham de uma prorrogação contra o México e com dez minutos já estavam atrás do marcador. Falei na hora que o jogo estava ganho, porque eles não iam ter pernas pra correr atrás e segurar resultado no segundo tempo. Acho muito estranho que comentarista de futebol costume ignorar tanto cansaço.
Mas contra os ínglios os portenhos mudaram a marcação - marcaram no próprio campo. Vai ver que foi porque na Copa cada vez que três corriam sobre o Beckham antes que ele matasse a bola ele lançava de primeira alguém lá na frente que sobrava porque tinha três em cima do Beckham e tomaram um rola. Neste último amistoso os anglicanos não tiveram esse mole e Beckham, Lampard e Gerrard são jogadores hábeis na marcação, no chute e no lançamento, mas não na armação e ficaram sem saber o que fazer. Ficaram horas tocando bola de um lado pro outro no próprio campo sem saber como penetrar. Ou talvez os argênteos realmente tenham desistido de marcar sob pressão depois da trolha que demos nele na Copa das Confederações.
Só mais um detalhe: os insulanos bretões não sabem jogar contra nós e nem gostam. O estilo é muito diferente. Deve ser um dos países da Europa que tem menos jogador brasileiro. Têm uma tendência a marcar em linha até hoje.
Interessante foi que a Argentina mudou sua marcação. Até a Copa das Confederações eles jogavam marcando sob pressão no primeiro tempo pra botar uma vantagem e depois recuavam, porque o time ficava esgotado de correr atrás da bola sem parar. Foi assim que eles fizeram 3 x 1 na gente nas eliminatórias. Mandaram os reservas para a Bolívia no jogo anterior pra ter uma semana pra descansar e treinar e entraram preparadinhos pro jogo, deram um banho. Na Copa das Confederações tentaram fazer o mesmo, só que vinham de uma prorrogação contra o México e com dez minutos já estavam atrás do marcador. Falei na hora que o jogo estava ganho, porque eles não iam ter pernas pra correr atrás e segurar resultado no segundo tempo. Acho muito estranho que comentarista de futebol costume ignorar tanto cansaço.
Mas contra os ínglios os portenhos mudaram a marcação - marcaram no próprio campo. Vai ver que foi porque na Copa cada vez que três corriam sobre o Beckham antes que ele matasse a bola ele lançava de primeira alguém lá na frente que sobrava porque tinha três em cima do Beckham e tomaram um rola. Neste último amistoso os anglicanos não tiveram esse mole e Beckham, Lampard e Gerrard são jogadores hábeis na marcação, no chute e no lançamento, mas não na armação e ficaram sem saber o que fazer. Ficaram horas tocando bola de um lado pro outro no próprio campo sem saber como penetrar. Ou talvez os argênteos realmente tenham desistido de marcar sob pressão depois da trolha que demos nele na Copa das Confederações.
Só mais um detalhe: os insulanos bretões não sabem jogar contra nós e nem gostam. O estilo é muito diferente. Deve ser um dos países da Europa que tem menos jogador brasileiro. Têm uma tendência a marcar em linha até hoje.
POESIA SEM TÍTULO
O foguete era movido a água e pedal
Pisava-se num êmbolo e a miniatura do Saturno 5
Subia aos céus e nós éramos os astronautas
Eram foguetes e bombas atômicas e discos voadores
e cérebros eletrônicos e televisões
e raios lasers e interferona e a cura do câncer
E nosso foguete ia decolar do meio da rua
que tinha poucos carros e muita criança onde a gente morava
E brincávamos e fazíamos barulho quando um homem calvo e de peito grisalho
ou era a camisa que era branca e hoje se faz corpo em minha memória
Abriu a porta e nos chamou do quintal de sua casa
Que entrássemos e acompanhássemos com ele
O Saturno 5 ia subir
Ia decolar
Levar o homem à Lua
Levar o homem a outros mundos
Levar o homem ao futuro
E nós entramos e vimos em embaçadas imagens em preto e branco
deformadas pela curvatura das velhas telas
A voz emocionada do locutor - não me lembro quem
ser engolida pelas chamas e fumaça e fogo e labaredas
E a plataforma pegou fogo
E o homem tirou os pés da terra
E Marcos, um amigo nosso
que a gente tratava com um certo carinho,
com pena e com medo, porque nossas mães mandaram
e porque sabíamos que ele o pai dele tinha morrido
e ele mesmo era meio bobo, ou como falávamos longe dele, retardado,
Mais do que nós ficou impressionado
E assustado até
"O foguete vai incomodar papai
e vai machucar papai do céu
vai passar pelo céu rápido e grande
e papai do céu e papai, que tá lá junto dele
vão ser atropelados"
E ele saiu correndo e assustado e a Marcinha
que ainda não tinha chegado na idade de não gostar de coisa de menino
começou a chorar que iam machucar papai do céu
e o que ia ser do mundo sem ele
E mesmo eu fiquei preocupado
com o que os astronautas iriam encontrar e enfrentar quando subissem no céu
e além dele
E se eles não iam se perder
Mesmo sendo uma criança
Porque os foguetes que iam à Lua foram feitos para levar a bomba
E os filmes e as histórias em quadrinhos e os especiais de tevê
E os garotos mais velhos e as meninas mais velhas
Falavam da bomba atômica e de Nostradamus e do fim do mundo
E às vezes eu começava a imaginar que um dia eu não ia pensar
Falar Conversar Respirar
E nem lembrar do meu próprio nome e me sentia só muito só na minha cama
E tinha vergonha de dormir com os meus pais
E tinha a bomba e eu sabia
que eles não podiam fazer nada
E tinha a morte e eu sabia
que eles não podiam fazer nada
E ninguém e ninguém e ninguém e ninguém
Mil chegará e dois mil não passará.
E o homem pisou na Lua e passeou de jipe lá
E os foguetes a água sumiram
E também os foguetes a fogo
E os céus foram abandonados pelos homens
E uma vez eu li uma reportagem num suplemento infanto-juvenil
Dizendo que Nostradamus previa o fim do mundo em 1973
E este foi o pior ano
Quando às vezes na cama eu lembrava disso
Eu tinha medo do escuro
E estrondos na rua eram as bombas
E roncos de motores de aviões misteriosos na noite adentrada
Eram os bombardeiros
E o relógio atômico e o Oriente Médio e a guerra do Yom Kippur
E Nixon e Watergate e o Vietnã todo dia na mesa do jantar
E o fim da guerra e a guerra continuava eu sem entender nada como nunca entendi
Os Estados Unidos estavam em guerra mas eu nunca via os americanos em guerra
Estavam em filmes, programas, noticiários e livros e quadrinhos
e não pareciam que estavam em guerra
E eu tinha medo de guerra, de qualquer guerra, as pessoas morriam e
a pior de todas ia matar todas
E eu queria ser grande, queria crescer e ser grande e forte como o homem calvo
Como meu pai
Que sempre sabia o que fazer
Pagar as contas
Consertar a máquina de lavar
Consertar meu robô a pilha
Montar guindastes com Montebrás
Serrar e cortar e martelar e a parte elétrica da casa
E ligar todo os cabos de um aparelho hi-fi
Gravador estéreo, vitrola Phillips automática
e o projetor de slides que fazia cineminha pras crianças da rua
Com os slides da Disney e outros multicoloridos
E um dia, enquanto meu pai passava para nós a história
da Velha e do Boneco de Piche
Os ferimentos do macaco
A maldade do boneco
e o poço sem fundo em que ela caía e parecia não ter mais salvação
Me trouxeram idéias de escuridão
A velha indefesa escorregando para o seu fim
E gritando num túnel escuro
E quando a história acabou e naquele sábado era só eu e meu irmão
E meu irmão foi comer sorvete que a gente tinha comprado tijolinho
Eu estava assustado e meu pai, meu pai percebeu e perguntou o que aconteceu
E eu disse que um dia, um dia ele ia morrer
E meu pai não entendeu o meu medo, ele era um homem que consertava as coisas
E comprava novas somente quando não tinha mais nenhum conserto
E sabia pechinchar e comprar só o que precisava
Meu pai riu e disse que eu também
Eu um dia ia envelhecer e morrer
E naquela noite eu não dormi direito
E sonhei com dinossauros
E monstros alados que me devorariam à minha simples visão
E a qualquer momento eu poderia vê-los
E eu cresci e aprendi a ler como gente grande
A fazer contas como gente grande
A entender história como gente grande
E aprendi a jogar bola e a montar kits Revell
com a inestimável ajuda do meu pai
Que me ensinou a desenhar quase tão bem como ele
E aprendi a ficar sozinho em casa e não ter medo do escuro
De lâmpadas apagadas
Mais escuro, descobri e aprendi
São alguns corações, algumas almas
E mesmo em nós, vários pedaços do espírito
E era menos opressivo, mas mais constante
Este medo da escuridão final e definitiva
E assim aprendi a fantasiar e imaginar
Mundos onde nada disso acontecesse
Onde eu podia mandar e reinar
Quase como meu pai
E Marcinha se foi, um dia eu tinha dado um beijo nela
E meus amigos
E vieram novos amigos e novos - e melhores - beijos
E a escuridão me atraía
A escuridão da noite
Os beijos ganhavam em umidade
Meia-noite
E textura e tato belos seios
Uma da manhã
E cheiro
Duas da manhã
E umidade e textura e tato belos seios
E cheiro e tato eu estava dentro de uma mulher
Três da manhã
E esqueci a escuridão e esqueci o medo
E me derreti e perdi o controle e gozei
Quatro da manhã
E meu pai me perguntando por onde eu andava
Quase não me via mais em casa
E quase eu não o via mais
Os segredos da noite não eram tão mortais
E - surpresa - meu pai não os conhecia tanto
E amanheceu e eu dormi
E entardeceu e acordei e não encontrei mais a moça que eu beijara
Ela se fora, outras viriam, outras iriam, mas eu não sabia
E fantasiei forte e mais e escrevi poemas e contos e músicas
Pois ela me lembrou que tudo se vai
E ela foi durante um momento a minha vida
e eu vislumbrei como seria quando eu não mais fosse
E enchi a cara e fumei e traguei e cheirei
E contei tudo isso para outras moças e as beijei e amei
E toquei-as todas em suas partes mais negras
Que eu ansiava e desejava
Como parecia meu pai nunca ter desejado em minha mãe
E esqueci todas as bobagens e acordes que pus no papel
E cresci e cresci eu era grande e forte como nunca em minha vida
E conhecia meus braços e minhas pernas com perfeição
Meu rosto não mais com acne, minha voz firme
Meus dentes definitivos e meu cabelo e minha barba e meu pau grande e grosso
Atingi o topo do meu corpo e do alto via a todos
E meu pai eu via aos poucos se curvando ao peso de sua barriga
De suas pernas fortes que emagreciam e sua pele que se encovava
E ainda assim ele consertava a máquina de lavar e pagava as contas
E trazia as compras para casa
Mal eu pagava as contas com meus primeiros dinheiros
E foi quase como conquistar a mulher conquistar meu primeiro emprego
Eu menti e me escondi e ocultei e afirmei e me fizeram assinar
E me enganaram
Em pouco tempo tudo aprendi
E um dia era igual ao outro e ao outro e ao outro
Os dias se pareciam um com o outro e passavam numa sucessão tão rápida
Que eu só podia medir olhando a face de meu pai
E vendo a ceifadora trabalhar dia a dia
E quanto ainda teria eu que me enrugar para lá chegar
E essas contas todas comprar, estas máquinas consertar, esta casa reformar
Esta mulher satisfazer, estes filhos sustentar, educar e ensinar e ainda na hora mais negra Confortar
Mesmo que ele grande e crescido se sinta como uma criança
Pensando que um dia o seu pai irá passar
E depois será ele próprio e tanto por fazer, aprender e ensinar
Um dia eu vou crescer e morrer
Já chegou o dia de crescer
Menos mulheres eu beijei
Mais empregadores eu enganei
Mais dinheiros eu ganhei
E a festa do dia em que meu pai se aposentou
Foi igual à do dia em que tive meu primeiro emprego
E me acompanhava neste dia uma mulher de quem não gostava muito
Não nos dávamos bem na cama e nem ela era brilhante ou deslumbrante
Mas os segredos da noite só os superficiais ela me entregou
Os profundos me negou
E eu, ao contrário de meus amigos, ainda assim escrevi, compus, poemei e sonetei
Implorei à escuridão que me contasse suas mais negras histórias
Mas ela permaneceu indecifrável e me mostrava um dia igual ao outro
E por mais que eu fantasiasse eu sentia, mesmo que muito pouco, meus braços já não tão fortes
E meu pai mais fraco do que eu e já não entendia de computadores e vídeo-cassetes
Era eu quem instalava e cabeava
E a tevê a cabo e eu sabia instalar todos os fios e era exatamente da mesma maneira
que ele tinha me ensinado a ligar a aparelhagem de som quando eu era pequeno
Mas ele dizia que não entendia, que estava velho e nem música mais ouvia
E bebia com os amigos e conversava com o filho como se fosse um homem
E eu me sentia ainda distante, eu tinha medo do futuro e da escuridão
E meu pai se encurvava, envelhecia e sabia que se ia e ria
Ria com os amigos em meio a um chope
E eu tinha medo e abraçava e beijava a mulher que eu não amava
Assim eu tinha um corpo onde podia, nem que por um momento,
entregar minha vida e nào sendo ela minha eu não tinha que me preocupar
Com o dia em que eu a perdesse
Pois um dia eu ia envelhecer e morrer
Um dia eu ia envelhecer e morrer
E me sentia mais e mais envelhecido
Ao lado da moça que eu não amava
E ela se foi e outras também
Que de mim não levaram muito
E delas mesmas pouco deixaram e por causa delas
Minhas fantasias e meus mundos quase não se alteraram
Continuaram decaindo e cínicos
Sem super-heróis e grandes paixões
Mas um dia esbarrei em Elsa
E ela sorriu e me encantou como uma feiticeira
Uma bruxa que em seus pactos satânicos
Conseguiu a imortalidade e a perenidade
Uma órfã da eternidade
E eu lhe escrevi poemais
E lhe compus canções
E lhe li minhas obras prediletas
Mas nada disto a impressionou
Pois ela podia ler direto em mim
O que eu tinha que demonstrar
Vindo de minhas fantasias e meus mundos paralelos e perdidos
E ela rasgou meu peito e varou minhas costelas
Minha carne já não tão firme e muito tecido adiposo
Músculos já não tão possantes quanto há dez anos
E cortou e jogou fora e o meu sangue jorrou e caiu ao chão
Aos seus pés
Ela destruiu meu corpo, imolou-me e com sua mão bela e fina
Segurou em suas mãos meu coração
Ainda pulsante
Como se fora uma ninja de história em quadrinhos
E meu corpo agonizante ao chão
Aos seus pés
Ainda pulsante
E não tinha mais que me preocupar
Com o dia em que eu não mais fosse
Eu já não mais era
Era outra criatura
Meu coração pulsava nas mãos dela
Meu cadáver caído aos seus pés
E o coração dela pulsava em minhas mãos
Seu cadáver caído aos meus pés
Estávamos apaixonados
E saímos de casa e mudamos de cidade para um emprego melhor
E o olhar de meu pai assustado que seu filho se ia
Como eu quando pensava no dia em que ele se fosse
Mas não, era eu que ia e ele que estava com medo
Mas eu também estava com medo
As contas para pagar, as máquinas de lavar a consertar
Mas eu não tinha crianças a ensinar
Tinha primeiro uma mulher a amar
Amar muito
Até o dia em que eu envelhecesse e morresse
Até o dia em que eu envelhecesse e morresse
Voltei à cidade para visitar meu pai
Menos vezes do que eu queria
E amei e os meus dias pareciam mais longos e verdadeiros
E subi de vida e de emprego e melhorei
Quase com a mesma velocidade que os microcomputadores
E a tevê a cabo e os micro systems e os vídeo-cassetes
E os DVDs e a Internet
E meu pai dizia que estava velho para essas coisas
E eu o via cada vez mais velho
Até o dia em que o telefone tocou lá em casa às três e meia da manhã
Num dia de semana
E não era engano
Era interurbano
E eu chorei e chorei
Menos que minha mãe e menos que meu irmão
E fizemos as contas do inventário
E acertamos as coisas com o advogado
E eu não entendia nada disto, mas tive que ir adiante
E improvisava e seguia, mesmo sabendo estar cheio de erros
Que eu esperava consertar mais à frente
E pensava se era assim que meu pai se sentia
Quando eu lhe dava meu robô com metralhadoras que piscavam e faziam barulho
Para ele consertar
E eu voltei para casa e a minha mulher
Meu lar
E ela me beijou e eu precisava ser beijado
E ela me amou e eu precisava ser amado
E nove meses depois eu queria beijá-la
E a beijei
Ela precisava ser beijada
Pois era mãe
Estou mais velho e mais grisalho
Já faz tempo que perdi a conta dos fios de cabelos de branco no meu peito
E devo ter alguns no cabelo também
E estou mais gordo do que gostaria
Embora Elsa não ligue
Já que meu corpo ela destruiu há tanto tempo
E erramos e erramos e erramos quando ensinamos
E erramos e erramos e erramos quando criamos
E erramos e erramos e erramos quando amamos
Nosso filho
Mas ele cresce apesar de tudo isto
E tenho vontade de lhe escrever poesias e contos e músicas
Que ele não entenderá
Mas são de mundos cada vez menos irreais e fantásticos
São de carne e osso como ele
Quando corre e tropeça e cai e chora de dor
E já lhe ensinamos as primeiras letras
E os primeiros jogos
No computador que eu domino tão bem
Que instalei lá em casa ligando certo todos os cabos
E dizendo ao técnico que veio entregá-lo que ele estava fazendo tudo errado
E ainda outro dia, enquanto assistíamos ao Discovery Channel
Na tevê do quarto que eu fiz uma ligação pirata da Net para termos vários pontos em casa
Logo depois de um especial sobre a estação espacial internacional
E antes dele jogar o videogame em que não consegue me vencer
Vimos um documentário em que o guepardo morria chifrado por uma gazela
E os filhotes morriam de fome sem ninguém para cuidar deles
E eu vi que meu filho se entristecia
E se preocupava
E chovia
E, num momento em que tudo parecia mais escuro
A luz do quarto estava apagada, somente acesas a tevê e as lâmpadas
Do pisca-pisca natalino - a árvore estava na sala
Ele me perguntou, naquele instante mais preocupado com a pergunta
do que com o presente que iria ganhar
"Pai, um dia você vai morrer, não vai?"
E eu sorri longa e longa e longamente
E exultei
Com o medo e a preocupação dele
E sorri e disse que sim, eu iria envelhecer e morrer
E ele, um dia, iria crescer
E envelhecer e morrer
E ele aquela noite deve ter dormido mal
E sonhado mil pesadelos
Assustados
E eu, estranhamente,
Amei sua mãe como há muito não amava
Pois eu não tinha corpo e agora vencia
Vencia tudo que me assustou minha vida inteira:
A Morte.
Meu filho é como eu
Meu filho é exatamente como eu
E eu vou envelhecer e morrer
E meu filho vai crescer
E envelhecer e morrer
Exatamente como eu
Meu filho é como eu
Meu filho é exatamente como eu
Meu filho é como eu
Meu filho é exatamente como eu
Meu filho é como eu
Meu filho é exatamente como eu
Pisava-se num êmbolo e a miniatura do Saturno 5
Subia aos céus e nós éramos os astronautas
Eram foguetes e bombas atômicas e discos voadores
e cérebros eletrônicos e televisões
e raios lasers e interferona e a cura do câncer
E nosso foguete ia decolar do meio da rua
que tinha poucos carros e muita criança onde a gente morava
E brincávamos e fazíamos barulho quando um homem calvo e de peito grisalho
ou era a camisa que era branca e hoje se faz corpo em minha memória
Abriu a porta e nos chamou do quintal de sua casa
Que entrássemos e acompanhássemos com ele
O Saturno 5 ia subir
Ia decolar
Levar o homem à Lua
Levar o homem a outros mundos
Levar o homem ao futuro
E nós entramos e vimos em embaçadas imagens em preto e branco
deformadas pela curvatura das velhas telas
A voz emocionada do locutor - não me lembro quem
ser engolida pelas chamas e fumaça e fogo e labaredas
E a plataforma pegou fogo
E o homem tirou os pés da terra
E Marcos, um amigo nosso
que a gente tratava com um certo carinho,
com pena e com medo, porque nossas mães mandaram
e porque sabíamos que ele o pai dele tinha morrido
e ele mesmo era meio bobo, ou como falávamos longe dele, retardado,
Mais do que nós ficou impressionado
E assustado até
"O foguete vai incomodar papai
e vai machucar papai do céu
vai passar pelo céu rápido e grande
e papai do céu e papai, que tá lá junto dele
vão ser atropelados"
E ele saiu correndo e assustado e a Marcinha
que ainda não tinha chegado na idade de não gostar de coisa de menino
começou a chorar que iam machucar papai do céu
e o que ia ser do mundo sem ele
E mesmo eu fiquei preocupado
com o que os astronautas iriam encontrar e enfrentar quando subissem no céu
e além dele
E se eles não iam se perder
Mesmo sendo uma criança
Porque os foguetes que iam à Lua foram feitos para levar a bomba
E os filmes e as histórias em quadrinhos e os especiais de tevê
E os garotos mais velhos e as meninas mais velhas
Falavam da bomba atômica e de Nostradamus e do fim do mundo
E às vezes eu começava a imaginar que um dia eu não ia pensar
Falar Conversar Respirar
E nem lembrar do meu próprio nome e me sentia só muito só na minha cama
E tinha vergonha de dormir com os meus pais
E tinha a bomba e eu sabia
que eles não podiam fazer nada
E tinha a morte e eu sabia
que eles não podiam fazer nada
E ninguém e ninguém e ninguém e ninguém
Mil chegará e dois mil não passará.
E o homem pisou na Lua e passeou de jipe lá
E os foguetes a água sumiram
E também os foguetes a fogo
E os céus foram abandonados pelos homens
E uma vez eu li uma reportagem num suplemento infanto-juvenil
Dizendo que Nostradamus previa o fim do mundo em 1973
E este foi o pior ano
Quando às vezes na cama eu lembrava disso
Eu tinha medo do escuro
E estrondos na rua eram as bombas
E roncos de motores de aviões misteriosos na noite adentrada
Eram os bombardeiros
E o relógio atômico e o Oriente Médio e a guerra do Yom Kippur
E Nixon e Watergate e o Vietnã todo dia na mesa do jantar
E o fim da guerra e a guerra continuava eu sem entender nada como nunca entendi
Os Estados Unidos estavam em guerra mas eu nunca via os americanos em guerra
Estavam em filmes, programas, noticiários e livros e quadrinhos
e não pareciam que estavam em guerra
E eu tinha medo de guerra, de qualquer guerra, as pessoas morriam e
a pior de todas ia matar todas
E eu queria ser grande, queria crescer e ser grande e forte como o homem calvo
Como meu pai
Que sempre sabia o que fazer
Pagar as contas
Consertar a máquina de lavar
Consertar meu robô a pilha
Montar guindastes com Montebrás
Serrar e cortar e martelar e a parte elétrica da casa
E ligar todo os cabos de um aparelho hi-fi
Gravador estéreo, vitrola Phillips automática
e o projetor de slides que fazia cineminha pras crianças da rua
Com os slides da Disney e outros multicoloridos
E um dia, enquanto meu pai passava para nós a história
da Velha e do Boneco de Piche
Os ferimentos do macaco
A maldade do boneco
e o poço sem fundo em que ela caía e parecia não ter mais salvação
Me trouxeram idéias de escuridão
A velha indefesa escorregando para o seu fim
E gritando num túnel escuro
E quando a história acabou e naquele sábado era só eu e meu irmão
E meu irmão foi comer sorvete que a gente tinha comprado tijolinho
Eu estava assustado e meu pai, meu pai percebeu e perguntou o que aconteceu
E eu disse que um dia, um dia ele ia morrer
E meu pai não entendeu o meu medo, ele era um homem que consertava as coisas
E comprava novas somente quando não tinha mais nenhum conserto
E sabia pechinchar e comprar só o que precisava
Meu pai riu e disse que eu também
Eu um dia ia envelhecer e morrer
E naquela noite eu não dormi direito
E sonhei com dinossauros
E monstros alados que me devorariam à minha simples visão
E a qualquer momento eu poderia vê-los
E eu cresci e aprendi a ler como gente grande
A fazer contas como gente grande
A entender história como gente grande
E aprendi a jogar bola e a montar kits Revell
com a inestimável ajuda do meu pai
Que me ensinou a desenhar quase tão bem como ele
E aprendi a ficar sozinho em casa e não ter medo do escuro
De lâmpadas apagadas
Mais escuro, descobri e aprendi
São alguns corações, algumas almas
E mesmo em nós, vários pedaços do espírito
E era menos opressivo, mas mais constante
Este medo da escuridão final e definitiva
E assim aprendi a fantasiar e imaginar
Mundos onde nada disso acontecesse
Onde eu podia mandar e reinar
Quase como meu pai
E Marcinha se foi, um dia eu tinha dado um beijo nela
E meus amigos
E vieram novos amigos e novos - e melhores - beijos
E a escuridão me atraía
A escuridão da noite
Os beijos ganhavam em umidade
Meia-noite
E textura e tato belos seios
Uma da manhã
E cheiro
Duas da manhã
E umidade e textura e tato belos seios
E cheiro e tato eu estava dentro de uma mulher
Três da manhã
E esqueci a escuridão e esqueci o medo
E me derreti e perdi o controle e gozei
Quatro da manhã
E meu pai me perguntando por onde eu andava
Quase não me via mais em casa
E quase eu não o via mais
Os segredos da noite não eram tão mortais
E - surpresa - meu pai não os conhecia tanto
E amanheceu e eu dormi
E entardeceu e acordei e não encontrei mais a moça que eu beijara
Ela se fora, outras viriam, outras iriam, mas eu não sabia
E fantasiei forte e mais e escrevi poemas e contos e músicas
Pois ela me lembrou que tudo se vai
E ela foi durante um momento a minha vida
e eu vislumbrei como seria quando eu não mais fosse
E enchi a cara e fumei e traguei e cheirei
E contei tudo isso para outras moças e as beijei e amei
E toquei-as todas em suas partes mais negras
Que eu ansiava e desejava
Como parecia meu pai nunca ter desejado em minha mãe
E esqueci todas as bobagens e acordes que pus no papel
E cresci e cresci eu era grande e forte como nunca em minha vida
E conhecia meus braços e minhas pernas com perfeição
Meu rosto não mais com acne, minha voz firme
Meus dentes definitivos e meu cabelo e minha barba e meu pau grande e grosso
Atingi o topo do meu corpo e do alto via a todos
E meu pai eu via aos poucos se curvando ao peso de sua barriga
De suas pernas fortes que emagreciam e sua pele que se encovava
E ainda assim ele consertava a máquina de lavar e pagava as contas
E trazia as compras para casa
Mal eu pagava as contas com meus primeiros dinheiros
E foi quase como conquistar a mulher conquistar meu primeiro emprego
Eu menti e me escondi e ocultei e afirmei e me fizeram assinar
E me enganaram
Em pouco tempo tudo aprendi
E um dia era igual ao outro e ao outro e ao outro
Os dias se pareciam um com o outro e passavam numa sucessão tão rápida
Que eu só podia medir olhando a face de meu pai
E vendo a ceifadora trabalhar dia a dia
E quanto ainda teria eu que me enrugar para lá chegar
E essas contas todas comprar, estas máquinas consertar, esta casa reformar
Esta mulher satisfazer, estes filhos sustentar, educar e ensinar e ainda na hora mais negra Confortar
Mesmo que ele grande e crescido se sinta como uma criança
Pensando que um dia o seu pai irá passar
E depois será ele próprio e tanto por fazer, aprender e ensinar
Um dia eu vou crescer e morrer
Já chegou o dia de crescer
Menos mulheres eu beijei
Mais empregadores eu enganei
Mais dinheiros eu ganhei
E a festa do dia em que meu pai se aposentou
Foi igual à do dia em que tive meu primeiro emprego
E me acompanhava neste dia uma mulher de quem não gostava muito
Não nos dávamos bem na cama e nem ela era brilhante ou deslumbrante
Mas os segredos da noite só os superficiais ela me entregou
Os profundos me negou
E eu, ao contrário de meus amigos, ainda assim escrevi, compus, poemei e sonetei
Implorei à escuridão que me contasse suas mais negras histórias
Mas ela permaneceu indecifrável e me mostrava um dia igual ao outro
E por mais que eu fantasiasse eu sentia, mesmo que muito pouco, meus braços já não tão fortes
E meu pai mais fraco do que eu e já não entendia de computadores e vídeo-cassetes
Era eu quem instalava e cabeava
E a tevê a cabo e eu sabia instalar todos os fios e era exatamente da mesma maneira
que ele tinha me ensinado a ligar a aparelhagem de som quando eu era pequeno
Mas ele dizia que não entendia, que estava velho e nem música mais ouvia
E bebia com os amigos e conversava com o filho como se fosse um homem
E eu me sentia ainda distante, eu tinha medo do futuro e da escuridão
E meu pai se encurvava, envelhecia e sabia que se ia e ria
Ria com os amigos em meio a um chope
E eu tinha medo e abraçava e beijava a mulher que eu não amava
Assim eu tinha um corpo onde podia, nem que por um momento,
entregar minha vida e nào sendo ela minha eu não tinha que me preocupar
Com o dia em que eu a perdesse
Pois um dia eu ia envelhecer e morrer
Um dia eu ia envelhecer e morrer
E me sentia mais e mais envelhecido
Ao lado da moça que eu não amava
E ela se foi e outras também
Que de mim não levaram muito
E delas mesmas pouco deixaram e por causa delas
Minhas fantasias e meus mundos quase não se alteraram
Continuaram decaindo e cínicos
Sem super-heróis e grandes paixões
Mas um dia esbarrei em Elsa
E ela sorriu e me encantou como uma feiticeira
Uma bruxa que em seus pactos satânicos
Conseguiu a imortalidade e a perenidade
Uma órfã da eternidade
E eu lhe escrevi poemais
E lhe compus canções
E lhe li minhas obras prediletas
Mas nada disto a impressionou
Pois ela podia ler direto em mim
O que eu tinha que demonstrar
Vindo de minhas fantasias e meus mundos paralelos e perdidos
E ela rasgou meu peito e varou minhas costelas
Minha carne já não tão firme e muito tecido adiposo
Músculos já não tão possantes quanto há dez anos
E cortou e jogou fora e o meu sangue jorrou e caiu ao chão
Aos seus pés
Ela destruiu meu corpo, imolou-me e com sua mão bela e fina
Segurou em suas mãos meu coração
Ainda pulsante
Como se fora uma ninja de história em quadrinhos
E meu corpo agonizante ao chão
Aos seus pés
Ainda pulsante
E não tinha mais que me preocupar
Com o dia em que eu não mais fosse
Eu já não mais era
Era outra criatura
Meu coração pulsava nas mãos dela
Meu cadáver caído aos seus pés
E o coração dela pulsava em minhas mãos
Seu cadáver caído aos meus pés
Estávamos apaixonados
E saímos de casa e mudamos de cidade para um emprego melhor
E o olhar de meu pai assustado que seu filho se ia
Como eu quando pensava no dia em que ele se fosse
Mas não, era eu que ia e ele que estava com medo
Mas eu também estava com medo
As contas para pagar, as máquinas de lavar a consertar
Mas eu não tinha crianças a ensinar
Tinha primeiro uma mulher a amar
Amar muito
Até o dia em que eu envelhecesse e morresse
Até o dia em que eu envelhecesse e morresse
Voltei à cidade para visitar meu pai
Menos vezes do que eu queria
E amei e os meus dias pareciam mais longos e verdadeiros
E subi de vida e de emprego e melhorei
Quase com a mesma velocidade que os microcomputadores
E a tevê a cabo e os micro systems e os vídeo-cassetes
E os DVDs e a Internet
E meu pai dizia que estava velho para essas coisas
E eu o via cada vez mais velho
Até o dia em que o telefone tocou lá em casa às três e meia da manhã
Num dia de semana
E não era engano
Era interurbano
E eu chorei e chorei
Menos que minha mãe e menos que meu irmão
E fizemos as contas do inventário
E acertamos as coisas com o advogado
E eu não entendia nada disto, mas tive que ir adiante
E improvisava e seguia, mesmo sabendo estar cheio de erros
Que eu esperava consertar mais à frente
E pensava se era assim que meu pai se sentia
Quando eu lhe dava meu robô com metralhadoras que piscavam e faziam barulho
Para ele consertar
E eu voltei para casa e a minha mulher
Meu lar
E ela me beijou e eu precisava ser beijado
E ela me amou e eu precisava ser amado
E nove meses depois eu queria beijá-la
E a beijei
Ela precisava ser beijada
Pois era mãe
Estou mais velho e mais grisalho
Já faz tempo que perdi a conta dos fios de cabelos de branco no meu peito
E devo ter alguns no cabelo também
E estou mais gordo do que gostaria
Embora Elsa não ligue
Já que meu corpo ela destruiu há tanto tempo
E erramos e erramos e erramos quando ensinamos
E erramos e erramos e erramos quando criamos
E erramos e erramos e erramos quando amamos
Nosso filho
Mas ele cresce apesar de tudo isto
E tenho vontade de lhe escrever poesias e contos e músicas
Que ele não entenderá
Mas são de mundos cada vez menos irreais e fantásticos
São de carne e osso como ele
Quando corre e tropeça e cai e chora de dor
E já lhe ensinamos as primeiras letras
E os primeiros jogos
No computador que eu domino tão bem
Que instalei lá em casa ligando certo todos os cabos
E dizendo ao técnico que veio entregá-lo que ele estava fazendo tudo errado
E ainda outro dia, enquanto assistíamos ao Discovery Channel
Na tevê do quarto que eu fiz uma ligação pirata da Net para termos vários pontos em casa
Logo depois de um especial sobre a estação espacial internacional
E antes dele jogar o videogame em que não consegue me vencer
Vimos um documentário em que o guepardo morria chifrado por uma gazela
E os filhotes morriam de fome sem ninguém para cuidar deles
E eu vi que meu filho se entristecia
E se preocupava
E chovia
E, num momento em que tudo parecia mais escuro
A luz do quarto estava apagada, somente acesas a tevê e as lâmpadas
Do pisca-pisca natalino - a árvore estava na sala
Ele me perguntou, naquele instante mais preocupado com a pergunta
do que com o presente que iria ganhar
"Pai, um dia você vai morrer, não vai?"
E eu sorri longa e longa e longamente
E exultei
Com o medo e a preocupação dele
E sorri e disse que sim, eu iria envelhecer e morrer
E ele, um dia, iria crescer
E envelhecer e morrer
E ele aquela noite deve ter dormido mal
E sonhado mil pesadelos
Assustados
E eu, estranhamente,
Amei sua mãe como há muito não amava
Pois eu não tinha corpo e agora vencia
Vencia tudo que me assustou minha vida inteira:
A Morte.
Meu filho é como eu
Meu filho é exatamente como eu
E eu vou envelhecer e morrer
E meu filho vai crescer
E envelhecer e morrer
Exatamente como eu
Meu filho é como eu
Meu filho é exatamente como eu
Meu filho é como eu
Meu filho é exatamente como eu
Meu filho é como eu
Meu filho é exatamente como eu
NEM FUTEBOL-FORÇA E NEM FUTEBOL-ARTE: VIVA O FUTEBOL-BAUHAUS
Entre 1998 e 2003 fui colunista do finado site www.futbrasil.com. A idéia era não só comentar e analisar jogos, jogadas e jogadores, mas tentar ensinar o leitor a fazer sua própria análise. Eis aqui, por exemplo, uma coluna de 1999 sobre futebol-arte, futebol-força e Denílson, uma das maiores focas amestradas da história do futebol (sabe fazer tudo que é malabarismo com a bola, mas jogar que é bom...):
Só os loucos e os mortos não mudam de opinião. Um dia ainda lembro do autor desta frase, mas até lá ela vai continuar apócrifa. Como esta coluna é meio louca, ainda não mudou de opinião. Quem o fez, dia desses, talvez justamente por ter pós-graduação em Psicologia, foi o Tostão. Quanto ao Denílson, com seu individualismo exacerbado, seus dribles inúteis e sua infantil maneira de rebater qualquer instrução tática - que os jogadores nesta situação normalmente chamam de "críticas" - respondendo que foi jogando desta maneira que chegou à seleção, ao estrelato, à cama da modelo e atriz da vez e assim por diante. Pois bem, o genial cegueta finalmente chegou à conclusão que o mascarado não é o craque que muita gente julgava ser. Para tanto, valeu-se de critérios de um antigo treinador seu, que perguntava a seus comandados se achavam que tinham jogado bem, "quantos gols você fez? Pelo menos passe para gol? Sofreu pênalti? Não? Nada?" Conceitos um tanto rudimentares, talvez, mas ainda assim, reconhecivel e inegavelmente os mesmos que se usam em estética. O técnico do ex-cruzeirense, quem diria, não estava admoestando seus jogadores, estava fazendo crítica de arte.
Arte? Como assim, arte? Estes conceitos parecem mais afeitos ao futebol-força, ao futebol de resultados, ao Parreira e ao Zagallo. Essa história, na verdade, já acabou há muito tempo. Não existe mais futebol, arte, ou não, sem força. Qualquer habilidoso e técnico driblador vai precisar de arranque, velocidade e massa corporal para se equilibrar hoje em dia. Iranildo que o diga. Ou o anabolizado Zico. Os defensores do jogo ofensivo "tipicamente brasileiro" estão prestes a esfolar o Parreira quando ele diz que o gol é apenas um detalhe, mas quando o Denílson, com seus dribles desnecessários, para o lado e para trás antes de seus passes laterais, demonstra na prática que para ele o tento é apenas uma minudência no objetivo maior que é mostrar ao mundo suas qualidades com a bola, quase tão grandes quanto as de uma foca amestrada, aqueles mesmos apologistas do à l'outrance, à l'outrance acham que estamos diante da mais pura essência do esporte.
É claro que esta posição, além de uma contradição, é um erro. Denílson é um exagero barroco no edifício bauhaus que deveria ser a seleção brasileira. A digressão kitsch destoando do eficaz circuito Élber/Amoroso do primeiro tempo contra a Rússia. E quando digo que Denílson é kitsch, não é por causa de suas sobrancelhas ou do seu corte de cabelo. É porque ele encarna em campo o significado original da palavra, como é usado em estética e linguística. Qualquer meio de comunicação carrega uma mensagem. Tudo que não for absolutamente necessário para a compreensão desta mensagem é o kitsch. Na obra de arte, qualquer recurso usado somente para causar um efeito desnecessário. Nos grandes trabalhos, a forma está unida indissoluvelmente ao conteúdo. Nos menores, tenta-se valorizar um conteúdo banal com uma embalagem valiosa. Um personagem que declama poesia, apenas porque é bonito, numa novela. Um abridor de garrafas com a efígie do Ronaldinho, também - neste caso, o indicado seria que o punho fosse anatômico e não cheio de protuberâncias imitando os dentes dele. O atacante estaria insculpido no artefato sem nenhuma função aparente.
O kitsch é ideologica e politicamente conservador, já que tenta dar a trabalhos vazios ou superficiais alguma importância adicionando-lhes trechos inofensivos de obras culturais reconhecidamente mais relevantes. O caso do personagem que lê poesia, por exemplo. Ou usar música clássica num filme do Van Damme. Ou o do pintor francês do século passado que pintava retratos com o rosto em estilo realista e o corpo impressionista. Assim, o burguês que comprava a tela tinha seu rosto inexpressivamente reconhecível da forma mais rasteira enquanto podia dizer aos amigos que era "inteligente" por ter se deixado pintar de forma impressionista.
É esse falso valor que não se deve agregar ao futebol. Denílson é o símbolo mais atual de uma concepção atrasada de se jogar. Como já dizia o movimento bauhaus, a linha reta é a grande conquista da humanidade. Não existe na natureza. A beleza na arte está na concisão e simplicidade. Em como algumas centenas de palavras ou pinceladas podem remeter aos mais complexos sentimentos. Em como alguns tons de amarelo dos milharais de Van Gogh podem evocar tanta angústia. E não em desnecessárias excrescências ali apostas apenas para mostrar como seu autor é culto e inteligente.
Está na hora de acabar com esta divisão entre futebol-arte e futebol-força. Está na hora de começarmos a clamar pela perfeição do futebol-bauhaus.
*****
Dizem que Oswald - ou Mário, não me lembro bem - de Andrade não gostava de esportes, mas se encantava com futebol. Futebol brasileiro. Que ia e vinha como se num balé, que serpenteava até encontrar o caminho para o gol. Será que este Andrade modernista não entendia nada de futebol ou de arte?
Entendia. Entendia até de guerra. Porque além de ter princípios comuns a arte, futebol tem também conceitos militares. O que não deveria causar surpresa a ninguém, já que wargames como xadrez são hoje em dia parte integrante do currículo de administradores, corretores e gerentes das empresas reengenheiradas e downsizeadas do nosso globalizado mundo neo-liberal.
Essa negação da linha reta que celebra as idas e vindas do jogador brasileiro só é verdadeira se tomarmos literalmente as declarações da turma bauhaus. Além de concisão, outra grande qualidade da obra de arte é a simplicidade. E a simplicidade é a criatividade de descobrir o óbvio, que para pôr o ovo em pé é só quebrá-lo. O caminho mais fácil nem sempre é o mais curto. Há que se buscar aquele que opõe a menor resistência.
Voltemos ao Denílson. Observemos seu jogo. Ele não se movimenta muito pelo campo. Vamos encontrá-lo quase sempre parado no mesmo lugar, na ponta-esquerda. Quando ele receber a bola com dois jogadores em cima, ele vai tentar dominá-la e driblá-los, mesmo consciente de que se há dois defensores nele, em alguém tem um ou menos. Isto é buscar o ponto de menor resistência? Isto é simplificar a jogada? O drible é para encurtar o espaço até o gol, não para alongar.
Há alguns anos, antes da Olimpíada de 96 e daquele jogo com o Japão que desestruturou todo o belo trabalho que Zagallo vinha fazendo pós-94, ainda farei uma coluna sobre este assunto, o Brasil fez um amistoso contra um time olímpico dinamarquês. Um dos mais belos gols foi uma jogada que começou com o avanço de Zé Maria pela lateral. Ao se ver cercado, ele voltou à bola ao meia direita, que tocou de lado para o meia-esquerda, que lançou Roberto Carlos, que correu e cruzou para Ronaldinho fazer o gol. Como foi tudo rápido e de primeira, a defesa que se organizara do lado direito não teve tempo de se rearmar. Isto é a simplicidade. A busca do caminho mais curto, mais direto, mais fácil, de menor resistência. Fundamental nesta anabolizada época em que vivemos, lembrem-se do que eu disse lá em cima, não há mais arte sem força. E para ver o quanto se evolui no campo da preparação física e desenvolvimento muscular, é só assistir aos tapes da Copa de 82, por exemplo, como todo mundo era mais magro. O Brasil, por exemplo, era composto de jogadores de pouco mais de 1m70. O metro e oitenta e três fariam de Ronaldinho um gigante naquele time.
E é aqui que acontece o paralelo com a guerra. Cheguei a citar o à l'outrance, à l'outrance quando falei dos defensores do futebol ofensivo acima de tudo. À l'outrance era a doutrina equivocada do exército francês na I Guerra Mundial. Privilegiava o ataque amplo e ilimitado como única forma de se obter vantagem no campo de batalha. Tal filosofia se baseava na guerra franco-prussiana de 1870. Os gauleses, detentores do primeiro bom rifle de carga pela culatra, que atirava duas vezes mais rápido e mais longe que os dos outros países, acreditaram que uma tática defensiva, usando o alcance do fuzil Chassepot, manteria os teutônicos à distância. Tal não aconteceu e os franceses foram atropelados pelos prussianos. Analisando o acontecido, cônscios de que mais cedo ou mais tarde iriam lutar novamente contra o mesmo inimigo, chegaram à conclusão que os defensores, mesmo com uma arma superiorm, não conseguiriam reunir poder de fogo suficiente para derrubar uma longa linha de atacantes determinados. Era também o conceito do Clausewitz, o grande pensador militar da época (http://www.monumental.com/cbassfrd/CWZHOME/CWZBASE.htm), que preconizava que uma nação deveria concentrar o máximo de sua força e jogá-la contra as tropas mais importantes do inimigo para decidir tudo logo de uma vez. Era o chamado "encontro decisivo".
Pois os franceses passaram quarenta e quatro anos incutindo na cabeça de seus soldados à l'outrance, à l'outrance, atacar a qualquer preço e sem parar. Nestes quarenta e quatro anos inventou-se o canhão de tiro rápido e bala explosiva e o fuzil de repetição, capaz de atirar mais longe, com muito mais precisão e cinco vezes mais rápido. E a metralhadora. Entrincheirados, quase inatingíveis para um infante caminhando em sua direção, os defensores podiam varrer seus inimigos em rajadas, podiam derrubá-los com precisos e rápidos tiros de rifle e despedaçá-los com cargas de canhão explosivas. Por sorte, o pensamento militar alemão também parara em Clausewitz e a carnificina acabou acontecendo dos dois lados, embora os gauleses insistissem por mais tempo que os germânicos na ofensiva guerra-arte, o que causou um motim de tropas e quase acabou com a França.
Foi assim que começou a predominar o pensamento militar de Sun Tzu. Um general chinês das antigas, autor de A Arte da Guerra (http://www.mit.edu/people/dcctdw/AOW/toc.html, em inglês), que previa que o objetivo da guerra era estar antes do inimigo onde devia estar. Procurar o ponto fraco de suas tropas. Procurar o elo quebradiço na cadeia de comando oponente. Velocidade, habilidade em enganar, iludir, preparação moral e psicológica dos exércitos, em suma, um estudo surpreendentemente amplo, atual e açambarcador dos mais diversos ramos da atividade humana, num texto de cerca de sessenta páginas. Vários de seus ditos se assestam perfeitamente ao futebol, principalmente quando ele fala de moral e sistema de recompensas. Mas o melhor nestes tempos de Van der Ley e Marcelinho não está no ensaio de Sun Tzu, desabusadamente usado em ensino de administração. O melhor está numa lenda sobre o grande comandante oriental:
Contam que um imperador, sabendo que Sun Tzu era conhecido como o maior general de seu tempo, capaz de organizar qualquer exército, pediu-lhe que treinasse militarmente suas concubinas, somente para ridicularizar o militar. Este sabia que não poderia recusar, mas exigiu que lhe fosse dada carta branca, como teria se estivesse treinando soldados normalmente. O imperador concordou. Depois de algumas instruções básicas e de nomear uma subcomandante, Sun ordenou-lhes "Tropas! Marchem!" e as mulheres começaram imediatamente a rir. Sun Tzu disse "se os comandados não seguem as ordens, ou estas não foram suficientemente claras, ou o oficial que as expediu não se fez compreender ou o comandante direto não soube manter a disciplina". E repetiu a ordem. As mulheres voltaram a rir daquele velhinho tão solene no meio daquela brincadeira toda. Sun disse "as ordens foram perfeitamente claras. Ou o oficial que as expediu não se fez compreender ou o oficial responsável não sobue manter a disciplina". E repetiu a ordem, da maneira mais límpida possível, causando novo acesso de riso na mulherada. O calejado soldado então disse, "se os comandados não seguem as ordens, que foram claras e o oficial que as expediu se fez compreender perfeitamente, então o comandante das tropas não soube manter a disciplina" e ordenou imediatamente que cortassem a cabeça da subcomandante. O imperador tentou impedir, mas Sun Tzu foi inflexível. A moça foi executada, o mulherio todo depois saiu marchando direitinho e o imperador achou que já estava bom e dispensou nosso sábio.
Talvez tivéssemos alguns atacantes a menos, mas com certeza teríamos melhores times.
Só os loucos e os mortos não mudam de opinião. Um dia ainda lembro do autor desta frase, mas até lá ela vai continuar apócrifa. Como esta coluna é meio louca, ainda não mudou de opinião. Quem o fez, dia desses, talvez justamente por ter pós-graduação em Psicologia, foi o Tostão. Quanto ao Denílson, com seu individualismo exacerbado, seus dribles inúteis e sua infantil maneira de rebater qualquer instrução tática - que os jogadores nesta situação normalmente chamam de "críticas" - respondendo que foi jogando desta maneira que chegou à seleção, ao estrelato, à cama da modelo e atriz da vez e assim por diante. Pois bem, o genial cegueta finalmente chegou à conclusão que o mascarado não é o craque que muita gente julgava ser. Para tanto, valeu-se de critérios de um antigo treinador seu, que perguntava a seus comandados se achavam que tinham jogado bem, "quantos gols você fez? Pelo menos passe para gol? Sofreu pênalti? Não? Nada?" Conceitos um tanto rudimentares, talvez, mas ainda assim, reconhecivel e inegavelmente os mesmos que se usam em estética. O técnico do ex-cruzeirense, quem diria, não estava admoestando seus jogadores, estava fazendo crítica de arte.
Arte? Como assim, arte? Estes conceitos parecem mais afeitos ao futebol-força, ao futebol de resultados, ao Parreira e ao Zagallo. Essa história, na verdade, já acabou há muito tempo. Não existe mais futebol, arte, ou não, sem força. Qualquer habilidoso e técnico driblador vai precisar de arranque, velocidade e massa corporal para se equilibrar hoje em dia. Iranildo que o diga. Ou o anabolizado Zico. Os defensores do jogo ofensivo "tipicamente brasileiro" estão prestes a esfolar o Parreira quando ele diz que o gol é apenas um detalhe, mas quando o Denílson, com seus dribles desnecessários, para o lado e para trás antes de seus passes laterais, demonstra na prática que para ele o tento é apenas uma minudência no objetivo maior que é mostrar ao mundo suas qualidades com a bola, quase tão grandes quanto as de uma foca amestrada, aqueles mesmos apologistas do à l'outrance, à l'outrance acham que estamos diante da mais pura essência do esporte.
É claro que esta posição, além de uma contradição, é um erro. Denílson é um exagero barroco no edifício bauhaus que deveria ser a seleção brasileira. A digressão kitsch destoando do eficaz circuito Élber/Amoroso do primeiro tempo contra a Rússia. E quando digo que Denílson é kitsch, não é por causa de suas sobrancelhas ou do seu corte de cabelo. É porque ele encarna em campo o significado original da palavra, como é usado em estética e linguística. Qualquer meio de comunicação carrega uma mensagem. Tudo que não for absolutamente necessário para a compreensão desta mensagem é o kitsch. Na obra de arte, qualquer recurso usado somente para causar um efeito desnecessário. Nos grandes trabalhos, a forma está unida indissoluvelmente ao conteúdo. Nos menores, tenta-se valorizar um conteúdo banal com uma embalagem valiosa. Um personagem que declama poesia, apenas porque é bonito, numa novela. Um abridor de garrafas com a efígie do Ronaldinho, também - neste caso, o indicado seria que o punho fosse anatômico e não cheio de protuberâncias imitando os dentes dele. O atacante estaria insculpido no artefato sem nenhuma função aparente.
O kitsch é ideologica e politicamente conservador, já que tenta dar a trabalhos vazios ou superficiais alguma importância adicionando-lhes trechos inofensivos de obras culturais reconhecidamente mais relevantes. O caso do personagem que lê poesia, por exemplo. Ou usar música clássica num filme do Van Damme. Ou o do pintor francês do século passado que pintava retratos com o rosto em estilo realista e o corpo impressionista. Assim, o burguês que comprava a tela tinha seu rosto inexpressivamente reconhecível da forma mais rasteira enquanto podia dizer aos amigos que era "inteligente" por ter se deixado pintar de forma impressionista.
É esse falso valor que não se deve agregar ao futebol. Denílson é o símbolo mais atual de uma concepção atrasada de se jogar. Como já dizia o movimento bauhaus, a linha reta é a grande conquista da humanidade. Não existe na natureza. A beleza na arte está na concisão e simplicidade. Em como algumas centenas de palavras ou pinceladas podem remeter aos mais complexos sentimentos. Em como alguns tons de amarelo dos milharais de Van Gogh podem evocar tanta angústia. E não em desnecessárias excrescências ali apostas apenas para mostrar como seu autor é culto e inteligente.
Está na hora de acabar com esta divisão entre futebol-arte e futebol-força. Está na hora de começarmos a clamar pela perfeição do futebol-bauhaus.
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Dizem que Oswald - ou Mário, não me lembro bem - de Andrade não gostava de esportes, mas se encantava com futebol. Futebol brasileiro. Que ia e vinha como se num balé, que serpenteava até encontrar o caminho para o gol. Será que este Andrade modernista não entendia nada de futebol ou de arte?
Entendia. Entendia até de guerra. Porque além de ter princípios comuns a arte, futebol tem também conceitos militares. O que não deveria causar surpresa a ninguém, já que wargames como xadrez são hoje em dia parte integrante do currículo de administradores, corretores e gerentes das empresas reengenheiradas e downsizeadas do nosso globalizado mundo neo-liberal.
Essa negação da linha reta que celebra as idas e vindas do jogador brasileiro só é verdadeira se tomarmos literalmente as declarações da turma bauhaus. Além de concisão, outra grande qualidade da obra de arte é a simplicidade. E a simplicidade é a criatividade de descobrir o óbvio, que para pôr o ovo em pé é só quebrá-lo. O caminho mais fácil nem sempre é o mais curto. Há que se buscar aquele que opõe a menor resistência.
Voltemos ao Denílson. Observemos seu jogo. Ele não se movimenta muito pelo campo. Vamos encontrá-lo quase sempre parado no mesmo lugar, na ponta-esquerda. Quando ele receber a bola com dois jogadores em cima, ele vai tentar dominá-la e driblá-los, mesmo consciente de que se há dois defensores nele, em alguém tem um ou menos. Isto é buscar o ponto de menor resistência? Isto é simplificar a jogada? O drible é para encurtar o espaço até o gol, não para alongar.
Há alguns anos, antes da Olimpíada de 96 e daquele jogo com o Japão que desestruturou todo o belo trabalho que Zagallo vinha fazendo pós-94, ainda farei uma coluna sobre este assunto, o Brasil fez um amistoso contra um time olímpico dinamarquês. Um dos mais belos gols foi uma jogada que começou com o avanço de Zé Maria pela lateral. Ao se ver cercado, ele voltou à bola ao meia direita, que tocou de lado para o meia-esquerda, que lançou Roberto Carlos, que correu e cruzou para Ronaldinho fazer o gol. Como foi tudo rápido e de primeira, a defesa que se organizara do lado direito não teve tempo de se rearmar. Isto é a simplicidade. A busca do caminho mais curto, mais direto, mais fácil, de menor resistência. Fundamental nesta anabolizada época em que vivemos, lembrem-se do que eu disse lá em cima, não há mais arte sem força. E para ver o quanto se evolui no campo da preparação física e desenvolvimento muscular, é só assistir aos tapes da Copa de 82, por exemplo, como todo mundo era mais magro. O Brasil, por exemplo, era composto de jogadores de pouco mais de 1m70. O metro e oitenta e três fariam de Ronaldinho um gigante naquele time.
E é aqui que acontece o paralelo com a guerra. Cheguei a citar o à l'outrance, à l'outrance quando falei dos defensores do futebol ofensivo acima de tudo. À l'outrance era a doutrina equivocada do exército francês na I Guerra Mundial. Privilegiava o ataque amplo e ilimitado como única forma de se obter vantagem no campo de batalha. Tal filosofia se baseava na guerra franco-prussiana de 1870. Os gauleses, detentores do primeiro bom rifle de carga pela culatra, que atirava duas vezes mais rápido e mais longe que os dos outros países, acreditaram que uma tática defensiva, usando o alcance do fuzil Chassepot, manteria os teutônicos à distância. Tal não aconteceu e os franceses foram atropelados pelos prussianos. Analisando o acontecido, cônscios de que mais cedo ou mais tarde iriam lutar novamente contra o mesmo inimigo, chegaram à conclusão que os defensores, mesmo com uma arma superiorm, não conseguiriam reunir poder de fogo suficiente para derrubar uma longa linha de atacantes determinados. Era também o conceito do Clausewitz, o grande pensador militar da época (http://www.monumental.com/cbassfrd/CWZHOME/CWZBASE.htm), que preconizava que uma nação deveria concentrar o máximo de sua força e jogá-la contra as tropas mais importantes do inimigo para decidir tudo logo de uma vez. Era o chamado "encontro decisivo".
Pois os franceses passaram quarenta e quatro anos incutindo na cabeça de seus soldados à l'outrance, à l'outrance, atacar a qualquer preço e sem parar. Nestes quarenta e quatro anos inventou-se o canhão de tiro rápido e bala explosiva e o fuzil de repetição, capaz de atirar mais longe, com muito mais precisão e cinco vezes mais rápido. E a metralhadora. Entrincheirados, quase inatingíveis para um infante caminhando em sua direção, os defensores podiam varrer seus inimigos em rajadas, podiam derrubá-los com precisos e rápidos tiros de rifle e despedaçá-los com cargas de canhão explosivas. Por sorte, o pensamento militar alemão também parara em Clausewitz e a carnificina acabou acontecendo dos dois lados, embora os gauleses insistissem por mais tempo que os germânicos na ofensiva guerra-arte, o que causou um motim de tropas e quase acabou com a França.
Foi assim que começou a predominar o pensamento militar de Sun Tzu. Um general chinês das antigas, autor de A Arte da Guerra (http://www.mit.edu/people/dcctdw/AOW/toc.html, em inglês), que previa que o objetivo da guerra era estar antes do inimigo onde devia estar. Procurar o ponto fraco de suas tropas. Procurar o elo quebradiço na cadeia de comando oponente. Velocidade, habilidade em enganar, iludir, preparação moral e psicológica dos exércitos, em suma, um estudo surpreendentemente amplo, atual e açambarcador dos mais diversos ramos da atividade humana, num texto de cerca de sessenta páginas. Vários de seus ditos se assestam perfeitamente ao futebol, principalmente quando ele fala de moral e sistema de recompensas. Mas o melhor nestes tempos de Van der Ley e Marcelinho não está no ensaio de Sun Tzu, desabusadamente usado em ensino de administração. O melhor está numa lenda sobre o grande comandante oriental:
Contam que um imperador, sabendo que Sun Tzu era conhecido como o maior general de seu tempo, capaz de organizar qualquer exército, pediu-lhe que treinasse militarmente suas concubinas, somente para ridicularizar o militar. Este sabia que não poderia recusar, mas exigiu que lhe fosse dada carta branca, como teria se estivesse treinando soldados normalmente. O imperador concordou. Depois de algumas instruções básicas e de nomear uma subcomandante, Sun ordenou-lhes "Tropas! Marchem!" e as mulheres começaram imediatamente a rir. Sun Tzu disse "se os comandados não seguem as ordens, ou estas não foram suficientemente claras, ou o oficial que as expediu não se fez compreender ou o comandante direto não soube manter a disciplina". E repetiu a ordem. As mulheres voltaram a rir daquele velhinho tão solene no meio daquela brincadeira toda. Sun disse "as ordens foram perfeitamente claras. Ou o oficial que as expediu não se fez compreender ou o oficial responsável não sobue manter a disciplina". E repetiu a ordem, da maneira mais límpida possível, causando novo acesso de riso na mulherada. O calejado soldado então disse, "se os comandados não seguem as ordens, que foram claras e o oficial que as expediu se fez compreender perfeitamente, então o comandante das tropas não soube manter a disciplina" e ordenou imediatamente que cortassem a cabeça da subcomandante. O imperador tentou impedir, mas Sun Tzu foi inflexível. A moça foi executada, o mulherio todo depois saiu marchando direitinho e o imperador achou que já estava bom e dispensou nosso sábio.
Talvez tivéssemos alguns atacantes a menos, mas com certeza teríamos melhores times.
CONTOS ERÓTICOS RECUSADOS
Um amigo meu que trabalhava numa revista de mulher pelada uma vez me avisou que estavam precisando de contos eróticos. Como um de meus sonhos sempre foi escrever a seção Fórum da Ele & Ela, "e então seu mastro dardejante penetrou minha úmida gruta", saí correndo e no dia seguinte tinha dois textos pra enviar. Infelizmente foram recusados por serem muito literários. Acabei postando-os num site da Net, onde fizeram bastante sucesso, principalmente o segundo, dos irmãos. Até um sujeito que tinha uma revista literária online me convidou pra escrever contos - não eróticos - pra ele. Seguem eles aí embaixo pra vocês darem uma olhada:
Andréa tinha vinte e dois anos, um corpo maravilhoso e a gerência de uma boutique, com um monte de funcionários que não gostavam dela, mas isso não fazia muita diferença num mundo globalizado neoliberal com o desemprego em alta, o que não dá muita saída além de aceitar mais hora extra não remunerada e mais cortes na comissão, mesmo sabendo que, como comentavam pelos cantos, "ela diz que os tempos estão tão duros quanto os peitos dela, quando na verdade estão, no máximo, tão duros quanto o membro viril do namorado dela", referência maldosa à idade do amado da jovem, um bem-sucedido publicitário de quase cinquenta anos. Porque Andréa era dessas meninas que, aos dezoito anos, só tem tailleurs no armário. Que nunca suava quando saía pra dançar. Que nunca se despenteava. Que só via filme europeu e frequentava o Estação Unibanco, saindo para discutir a mensagem da fita com seus amigos trintões e quarentões em algum sushi bar. E que ainda por cima, quando tinham que gargalhar, riam baixinho. Para não atrapalhar ninguém. Andréa já trabalhara como contato publicitária e como promotora de eventos, mas dizia aos empregados, que ganhavam uma fração de seu salário, que só estava naquele posto mal remunerado para ter tempo de terminar a faculdade de administração, já que desistira do Direito.
Mas isso não significava que ela não se dedicasse ao seu trabalho. Ela era profissional. Esforçada. Ambiciosa. Era por isso que não gostava de gente de sua idade. Um bando de irresponsáveis e brincalhões. Inconsequentes. Tolos. Fúteis. Reclamavam tanto de fazer hora extra, mas eram incapazes de tomar qualquer atitude. Era só ela anunciar serão para ouvir os lamentos. E só. Ninguém se queixava diretamente. Ninguém tinha coragem para tanto. Sem ambição. Fracos. Nenhum deles teria a disposição dela, a disposição de estar tão tarde da noite ainda na loja, checando os livros de caixa e o estoque. Ela tinha ouvido muito os empregados comentando sobre os shows que tinham ido assistir ultimamente. Muitos shows. E todos caros. Sem contar que o François havia mesmo comprado um carro. Podia parecer pouco, mas ela não chegara tão longe em tão pouco tempo de outra forma. Podia ser apenas um indício de que eles estavam aprendendo com ela a organizarem suas vidas, mas como ela não vira nenhuma mudança no comportamento deles, ela duvidava disso. Ela queria ter certeza de que ninguém estava roubando a loja.
E, pelo jeito, era isso que ela ia conseguir. Livros, planilhas, estoque, faturas, tudo conferia perfeitamente. Mas não batia. Algo ali não batia. Ela estudara Jung, Freud, Campbell e sabia que intuição era a maneira do subconsciente avisar você de alguns fatos coletados que você desprezou conscientemente. Ela sabia que não devia desprezar seus instintos. Alguma coisa andava errada com os funcionários daquela loja. Mas o quê? O quê?
Foi quando ela ouviu os passos.
Alguém estava se movimentando no estoque.
A gerente sorriu. Agora estava tudo claro para ela, ali, naquelas sombras. Não era uma manobra contábil.
Andréa aproximou-se intimorata da escuridão e chamou em voz patronal pelo empregado, "François?", mas as sombras permaneceram indevassáveis à sua vista e voz. Ela então inquiriu de novo, aumentando o tom de ordem.
"François"?
"Ouça-a, Mama Legba. Ela está sozinha e indefesa no escuro, mas ainda assim prefere ser desagradável e autoritária. Ela não demonstra o menor medo".
"Medo? Eu, François? Você é que deveria estar, andando pela loja a esta hora fazendo não sei o quê, logo depois de comprar um carro novo. Você vai ter muitas explicações a dar à Débora, depois do que eu contar a ela. Eu não, eu não tenho nada a esconder, não tenho nada a temer."
Ela mal acabou de falar, mal acabou de fazer seu discurso repreensivo, suas falácias de censura, quando uma voz feminina, uma voz de mulher, uma voz de uma mulher que viveu muito, que viu de tudo, a voz de uma mulher que conheceu mistérios deste e de outros mundos, uma voz de mulher com toda a autoridade advinda da experiência, a verdadeira autoridade que Andréa desconhecia completamente riu uma risada asmática, gasta em alegrias profanas e intermináveis em outros tempos e disse, em tom de ironia, "Pois deveria, menina. Isso não é coragem, é apenas estupidez". Andréa tentou localizar a voz, procurar uma sombra, uma silhueta, qualquer coisa que lhe indicasse quem estava lhe falando quando subitamente todo o depósito explodiu em luz, cegando-a tão completa e subitamente que ela caiu ao chão, tentando desesperadamente cobrir os olhos com o braço.
"Problemas com a visão, menina?"
"Onde você conseguiu esse refletor?"
"Não é de estranhar. Você sempre foi cega..."
"Desligue essa luz para podermos conversar..."
"Nunca teve olhos, por exemplo, para Fernando... você tem idéia do que ele sentia por você?"
"Fernando? Ele queria me adular... achava que poderia me subornar com flores e presentes..."
"Ele era perdidamente apaixonado por você, Andréa!!!!! Você não só ignorou os sentimentos do rapaz como ainda o demitiu por isso! Você sabe o que aconteceu com ele quando saiu da loja?"
"Eu não via porque manter contacto com alguém obviamente tão interesseiro..."
"Tão cega... tão perdida e completamente cega... ele entrou em depressão, Andréa. Tentou o suicídio... por uma mulher como você... que desperdício... que tolice..."
"S-suicídio?"
"Foi, menina má... Felizmente François tinha ido visitá-lo e o encontrou a tempo. Ele ainda está sob tratamento psiquiátrico. Vamos pular Ilana, que você demitiu porque ela estava conversando com aquele seu namorado, tentando ser simpática com o amado da patroa e você achou que ela estava dando em cima dele. Vamos falar logo de meu sobrinho-neto... François... e o carro que ele comprou..."
"François é seu sobrinho-neto..?"
"Sim, é... acho que ao menos casado você sabe que ele é... pois bem, o carro que ele comprou foi porque a Ana, esposa dele, estava grávida. Como eles sempre sonharam. No entanto, era gravidez de alto risco. Eles fizeram um esforço tremendo para comprarem o carro para que Ana pudesse chegar a tempo no hospital a qualquer sinal de que algo ia errado. Só que François contava com o pagamento das horas extras... que você cortou. E o carro foi tomado."
"Eu não tenho culpa! Ele não podia se endividar contando com um aumento ainda não decidido..."
"Não era um aumento, vagabunda! Eram meus direitos!"
"Calma, François. Ela vai ter o que merece", e Andréa pela primeira vez tremeu ao ouvir essas palavras da mulher, que em seguida dirigiu-se a ela, continuando a história.
"Sabe o que aconteceu, Andréa? No dia seguinte ao que o carro foi tomado, Ana começou a sentir-se mal, François estava na loja fazendo um serão de graça, para poder manter o emprego e o telefone estava desligado, por economia. Ela tentou tomar um táxi, mas não chegou ao hospital a tempo." A mulher fez uma pausa e Andréa começou a sentir-se mal, já adivinhando o que viria em seguida.
"Ela perdeu o bebê, Andréa. Um menino. E teve complicações. Ela nunca mais vai conseguir engravidar outra vez, Andréa. François não terá o filho que tanto queria com Ana".
Andréa começou a sentir-se mal. Pessimamente. Ela nunca imaginara que um empregado tão descuidado como François pudesse ser um marido tão empregado. Nunca lhe passara pela cabeça que alguém pudesse ser mais atencioso em sua vida sentimental do que em sua vida profissional.
"Eu... eu sinto muito... de verdade... eu não pretendia isso... por favor... apague esse refletor, para podermos conversar..."
"O refletor? Está bem. Apagaremos..."
A luz apagou de repente. Andréa finalmente pôde descobrir os olhos e ver com quem estava falando. Estavam todos ali. François. Fernando. Ilana. Uma senhora idosa, gorda e de branco. Em suas mãos, uma lanterna, agora apagada, com o foco dirigido aos olhos de uma pequena boneca.
Com as feições de Andréa, que teve um súbito choque ao se lembrar que François é um nome de língua francesa, falada, entre outros lugares, no Haiti.
A terra do vodu.
Mama Legba sorriu ao perceber o olhar aterrorizado de Andréa.
"Acho que você já percebeu tudo. Quer ver o que acontece quando eu ligo a lanterna nos olhos da boneca?"
Andréa ficou cega novamente. Cega e indefesa. Ela estava nas mãos deles.
"Apaguem essa luz... por favor... apaguem!"
"Está vendo agora o que é estar à mercê de outros, Andréa? O que você passou todo esse tempo fazendo com os funcionários da loja? Mas isso não é tudo. Estar nas suas mãos também significava estar vulnerável às suas neuras, como a Ilana. Ter os sentimentos mais secretos expostos e descobertos, como Fernando. Você quer ter idéia do que é estar exposto e vulnerável, Andréa?"
"Por favor, deixem-me em...", parou a frase. A voz de Andréa congelou de horror quando ela percebeu o que seus braços vinham fazendo sem que ela ao menos tivesse consciência do que estava acontecendo. Ela estava se despindo. Tirando sua roupa! O casaco e a saia já haviam ido e ela agora tirava a blusa. Estava agora somente de lingerie e meias na frente de seus empregados e sem a menor disposição de parar. Suas mãos cruzadas já abaixavam as alças do sutiã lentamente pelos ombros nus e chegavam ao colo dos seios.
"O que vocês estão fazendo comigo? Parem com isso! Parem com isso já ou vou chamar a polícia!!!!! Vocês vão todos presos!", gritou ela enquanto suas mãos procuravam nas costas o fecho do sutiã.
"Nós, Andréa? Por quê? Não a estamos tocando, ameaçando ou forçando a nada. Você é que está fazendo um espetáculo para nós..."
O sutiã soltou-se e desprendeu-se completamente. Dos quadris para cima, Andréa era apenas pele. Pele bronzeada, sem nenhuma marca de biquini, graças à piscina murada na casa de seu namorado. Seus seios saltaram livres e amorenados, frescos e convidativos ao toque, graças à sua aparência firme e sólida, graciosa, com uma curvatura acentuada em cima e suave e com boa base por baixo, o que os mantinha bem apontados para cima e duros, enviando o olhar para seu cerne, seu centro de sensibilidade e prazer, a região que define e delimita o peito, sem cuja visão não se conhece realmente um busto. Os mamilos amplos e róseos, lisos e redondos da gerente, que soluçava e chorava, incapaz de completar uma frase, contrastando com o seu corpo que fazia questão de continuar o strip tease e exibir-se orgulhosamente.
"Vejam esse peito... vocês ainda acham que eu não tinha nenhuma razão para me apaixonar?", riu Fernando.
"O que vocês estão fazendo comigo?", era o bordão que ela repetia sem parar, a única resistência que conseguia opor, enquanto sentia suas mãos percorrerem os quadris em busca do elástico da calcinha e a baixarem lentamente, expondo sua vagina, com pelos ralos e sedosos, tão convidativos quanto os de um gato, claros e delicados, protegendo a sua fenda vertical, de lábios tímidos, pequenos e fechados.
A calcinha ia descendo pelas torneadas coxas grossas malhadas da deliciosa gerente junto com as primeiras lágrimas em seu rosto. "Por quê... por que vocês estão fazendo isso comigo?", choramingava enquanto sua última peça de roupa se livrava de seu corpo esplêndido e a deixava ali, no depósito, completamente nua e indefesa, à mercê de seus vingativos empregados.
"Para que você veja o que é sentir-se à mercê de outros", foi a resposta de François, "Para que você saiba o que é sentir-se completamente exposta", foi a respostas de Fernando e "Para que você saiba o que é verdadeiramente o poder" foi a resposta de Mama Legba, fechada com uma grande gargalhada que assustou Andréa. A moça tentou esconder seu reflexo, mas seus seios livres e nus balouçaram gentilmente, firmes que eram, traindo seu medo.
"Parece que alguém aqui está tremendo".
"Deixem-me ir embora... por favor".
"Ah, Andréa, mas nós vamos... vamos mandar você embora. Mas não do jeito que entrou aqui. Vamos mandá-la de um modo muito mais gentil. Você vai ser incapaz de dizer não. Vai ser obrigada a obedecer qualquer ordem ou sugestão que lhe dêem. Em suma, vamos apagar seu livre arbítrio... ou livre arbitrariedade, como devia ser chamado no seu caso"
"Vocês não podem fazer isso!"
"Ora, cale-se, Andréa"
"N" foi o único som que a jovem nua pôde proferir antes que suas mandíbulas se cerrassem inexoravelmente. Ela tentou falar alguma coisa, mas nem sequer um suspiro pôde sair de seus lábios. Ela estava nua e agora muda.
"É claro que você vai continuar exatamente do jeito que é. Não vamos tocar na sua personalidade. Você pode continuar a tratar as pessoas como sempre tratou. Mas vamos ver se é isso que você vai fazer a partir de agora", explicou Mama Legba enquanto era seguido pelos olhos suplicantes da silenciosa gerente nua, movimento que continuava a fazer seus seios empinados balouçarem suavemente, como se tocados por uma brisa.
"Veja isso como um teste de personalidade", disse François, levando todo mundo a gargalhar, menos é claro, Andréa, que não o poderia mesmo que tivesse achado graça. O neto da sacerdotisa vodu continuou. "Pode falar agora, Andréa".
"P-por favor..." falou a moça nua, como se estivesse soltando a respiração após ficar debaixo d'água.
"Viu como funciona? Muito bem, Andréa, chega por hoje. Pode vestir-se e ir embora..."
"Vocês não podem me deixar ir embora assim".
"Tem razão. Espere, Andréa", disse Fernando.
Os braços nus da loura, que buscavam sua calcinha, pararam imediatamente.
"Lembra como você reclamava do meu cigarro? Que não suportava fumantes? Que não entendia o que eles viam no cigarro? Pois agora você vai entender... vai entender o que é obsessão... a mesma que eu tinha por você".
"Não", protestou fracamente a moça nua, enquanto tentava apertar o busto com os braços para expor menos seus belissimos seios, "por favor, não me faça fumar... cigarro mata".
"Não, não íamos querer que você estragasse esse lindo corpinho, não é mesmo? Eu tenho uma idéia muito melhor... muito melhor..."
Mais uma vez os seios da jovem tremeram, entregando seu medo.
"Você vai ser viciada em... esperma!"
"Não!"
"Sim! É disso que os receptores de seu cérebro mais vão gostar. Só uma dose de porra vai conseguir te satisfazer, quando você estiver sem um pouco há muito tempo. É esse que vai ser seu vício. Você vai ser dependente química de porra! Porra!"
Os braços de Andréa se alargaram. Ela cambaleou e quase caiu enquanto sentia seu estômago se revirar, suas entranhas se reconstruirem, enquanto seu cérebro lhe dava vontade de comer alguma coisa diferente e não era um sushi, nem comida alemã, nem comida italiana ou espanhola, ela precisava de um sabor mais forte, de um sabor mais temperado e forte, alguma coisa salgada e suada e só ao pensar isso, sentiu aumentar o calor entre suas pernas e essa sensação lembrou-a automaticamente que estava nua e sua pela completamente exposta levou seu pensamento diretamente a sexo, o que só fez aumentar a salivação em sua boca, ao pensar num sexo masculino ereto, com as bolas cheias, bem cheias.
Andréa sentiu um arrepio de medo percorrer sua espinha ao perceber que, ao pensar nisso, lambera os beiços inconscientemente.
"Será que funcionou?", perguntou Fernando a François, que lhe respondeu "não sei. Experimenta". O jovem tímido hesitou por um instante, pensou no constrangimento, mas, ao olhar aquela mulher maravilhosa nua, suas nádegas firmes e rijas, com uma marca de biquini que parecia ter nascido com ela, pequena e bem localizada, seus quadris amplos e sua cintura estreita, seus seios maravilhosos, suas pernas fartas e curvilíneas, chegou à conclusão que aquilo valia qualquer sacrifício e se aproximou dela.
Andréa, caída, levantou-se um pouco. Ajoelhou-se, ao ver Fernando se aproximar. Seus mamilos tornaram-se mais escuros e rijos. Fernando chegou perto. Sua virilha à altura da boca dela. O coração da gerente batia acelerado. Seu rosto avermelhava-se e ficava afogueado. Suas pálpebras tremiam e seus olhos demonstravam pavor, mas sua boca se entreabriu lentamente, esperando receber um presente.
Fernando parou. "E agora?", perguntou.
"Bota ele pra fora", pediu Andréa, bem baixinho.
"Como?", insistiu Fernando ironicamente. Ironia que não teve muito efeito. A gerente, lembrando o modo como conseguiu subir tão rápido na carreira, com decisão pulou sobre a calça de Fernando, desceu o zíper, enfiou a mão lá dentro e puxou uma tora um tanto curta e de grossura média e abocanhou-a tão logo ela viu o ar livre. "Ai!", soltou Fernando, assustado com a voracidade da moça. Os outros riram. "Devagar, Andréa. Eu sempre gostei de sua... elegância". "Mmmmmmm", protestou Andréa através de sua boca repleta, diminuindo o ritmo do boquete, como ordenado, contra a sua vontade.
"Se bem que ela não parece muito elegante agora".
"Com esse corpo, ela vai ser elegante de qualquer jeito, François", replicou Fernando, antes de fechar os olhos e acariciar os cabelos sedosos da garota, inutilmente, pois Andréa estava totalmente concentrada em como levar seu ex-empregado ao gozo o mais rápido possível, mesmo sendo obrigada a um ritmo mais cadenciado. Seu corpo inteiro estava focalizado em chupar o membro dele. Seu busto subia e descia, com os movimentos de sucção repetindo o vaivém de sua boca. Uma de suas mãos movimentava a pouca pele que não estava abocanhada, tentando ajudar o orgasmo com uma punheta. Ela sentia sua boceta pulsar antecipando o líquido quente e viscoso prestes a se derramar por sua língua. Cada vez que ela pensava isso, sua outra mão apertava o saco do rapaz, como se tentando espremer o conteúdo.
"Eu não imaginava que ela tivesse uma boca tão grande".
"Com o estímulo que ela recebeu, meu chapa, cabia qualquer coisa". Andréa ouviu isso e sentiu, ao longe, embaixo do frêmito de seu corpo, um vergonhoso sentimento de degradação. Mas se degradação era tão bom, qual o problema? Ela corou e tentou afastar os pensamentos enfiando mais do mastro de Fernando em sua boca, quase sufocando e sentindo os pelos púbicos do rapaz tocarem seu nariz e lábios. O cheiro salgado do suor depositado na virilha dele aumentou ainda mais sua fome e ela começou a temer que uma descarga não fosse o suficiente para o que ela precisava, o que aumentou ainda mais a sua ansiedade. Ela liberou a mão que tentava a desajeitada punheta e baixou-a até seu botãozinho. Ela precisava descarregar suas necessidades. A ponta de seus dedos percorreu suavemente a superfície de seu clitóris e ela sentiu uma pequenissima pontada de alívio da terrível fome que a castigava, mas ainda assim, era um alívio e ela começou a masturbar-se com força e vigorosamente, já que ninguém lhe ordenara que ali ela fosse devagar.
"Olha só...", comentou François, "parece realmente que o Edgar não dava conta satisfatoriamente de nossa chefinha", referindo-se ao namorado quarentão da garota. Andréa só pôde soltar outro murmúrio abafado de protesto, com todo o comprimento da espada de Fernando em sua boca. O murmúrio, no entanto, não acabou, continuou, mais forte e pausado, mais lento e certo, ela fechou os olhos e descontrolou-se, ela estava gozando, havia chegado ao orgasmo, sentia seus quadris pulsarem involuntariamente, sua boceta aberta sentindo o ar fresco, seu corpo, a partir de seu sexo, se petrificando e depois se liquefazendo, um movimento que a fazia murmurar longamente.
Fernando não pôde resistir ao espetáculo e começou a gozar também e ao sentir o primeiro jato, farto e grosso tocar as paredes de sua boca e sua língua, Andréa teve seu orgasmo multiplicado mil vezes. Ela queria ter o estômago inteiro repleto daquele néctar, todo o seu corpo estufado e recheado com aquele caldo, provar mais e mais e mais, ela apertou mais as bolas dele, aumentando a chupada, a sucção, querendo drenar todo o fluido sexual do seu ex-empregado.
A fonte secou. Os jorros pararam. Andréa ainda tentou sugar mais, mas Fernando estava esgotado. Ainda assim, ela insistiu com as chupadas e lambidas, ainda zonza e acesa com o cheiro. Fernando, entretanto, após recuperar as forças, puxou a cabeça dela para trás e tirou seu mastro da boca dela. Um ar de decepção se espalhava pelo rosto de Andréa.
"Bom, hein?"
Andréa, agora satisfeita e com a cabeça temporariamente livre da obsessão, não respondeu. Apenas baixou a cabeça. Mais lágrimas se juntaram às muitas outras já derramadas na noite.
"Agora está bem. Pode se vestir e ir embora".
"Não me deixem assim. Por favor."
"Você nunca soube o significado da expressão por favor, Andréa".
"Mas..."
"Chega. Pode ficar aqui mais se quiser, mas nós estamos indo".
"É melhor ir para casa recuperar as energias", disse Mama Legba enquanto se dirigia à porta, "acho que você vai precisar de muita no trabalho amanhã".
Os empregados que saíam riram e fecharam a porta. Andréa ficou lá, quieta, chorando, nua e indefesa no depósito vazio, deprimida.
Quando ela sentiu passar pela sua cabeça que talvez uma boa esporrada melhorasse sua depressão, ela teve um arrepio.
(Continua)
Eram uns estalidos. Baixos, pequenos, mas audíveis. Madeira e prego, o prego se dobrando, se enfiando, entrando mais e mais nas fibras, parando e voltando, parando e voltando. Era a cama do meu irmão. Ele estava se masturbando. Tocando uma punheta. Ele ia sair do quarto suado, vermelho, cheirando forte e ia terminar no banheiro. E depois ia se deitar.
Eu tinha quatorze anos e um namoradinho e o mais longe que chegamos foi ele me explicando exatamente o quê o meu irmão estava fazendo, um dia em que eu deitei no colo dele na minha cama e a gente começou a ouvir os barulhinhos, na mesma hora em que eu sentia na minha face pela primeira vez a forma, o tamanho e a consistência de um pau duro, de um jeito que os amassos que eu tinha dado até então não tinham conseguido me mostrar. E foi enquanto ele me fazia uma leve carícia nos meus cabelos e eu ficava pensando se aquilo que eu sentia encostado na minha bochecha ia conseguir entrar dentro de mim sem me machucar, de que jeito, que ele me explicou o que estava acontecendo do outro lado da parede.
Apesar de muito ingênua, eu já sabia que os garotos faziam essas coisas, mas era uma imagem vaga, uma coisa que os meninos feios, bobos, de óculos, faziam enquanto estavam na privada, uma coisa nojenta e não algo que meu irmão fizesse, na mesma parede que eu, aquele jovem bonito, esguio, forte, de voz pausada e tranquila. Meu irmão. Bem diferente do rapaz que me tinha no colo naquele momento e começou a me descrever como o Fernando estava tocando punheta. Hoje eu acho graça, ele devia estar tentando me provocar, me excitar, pra tentar qualquer coisa comigo, não devia ter muita idéia de como começar. E não era daquele jeito. Ele foi tão grosso que a gente acabou discutindo, acabei botando ele porta afora, ele saiu dizendo que daquele jeito nenhum homem jamais ia querer coisa nenhuma comigo e eu fiquei ali, sozinha na sala, pensando no tamanho do pau dele, se eu ia ter coragem de enfrentar aquilo, pensando em como os homens eram grossos, pensando que eu nunca ia encontrar alguém que realmente me amasse, que eram todos daquele jeito, ele é que estava certo, pensando tudo isso e caminhando de volta para o quarto. E encontrando o meu irmão no corredor. Perguntando o que tinha acontecido.
Eu disse que tinha brigado com o meu namorado, ele perguntou por quê. Ele estava suado e cheirava salgado. Ácido. Forte. E preocupado comigo. Sinceramente. Irracionalmente, a sensação do pau duro de meu namorado encostando em mim me voltou à cabeça. A idéia do meu irmão se masturbando, como um animal, ainda assim terna e gentilmente comovido comigo começou a ter em mim o efeito que o garoto inoportuno tentara causar. Comecei a sentir entre as pernas um calor irradiante e a inefável impressão de que ele podia perceber esse calor, que ele mesmo também estava quente e suave. Quando me dei conta, meus olhos haviam se dirigido instintivamente para o seu sexo estufado sob o short e eu mordia meu lábio inferior. Imediatamente, dei uma desculpa e me livrei dele, correndo para o meu quarto e fechando a porta. Eu estava envergonhada, constrangida e enrubescida, mas quanto mais eu pensava na atitude que eu tivera, mais aumentava o calor entre as minhas pernas e mais eu mordia o lábio inferior. Fernando ainda perguntou através da porta se estava tudo bem. Não. Não estava nada bem, mas eu não disse, eu não disse porque eu não sabia exatamente o quê não estava nada bem, não era o garoto que tinha ido embora, não era meu irmão demonstrando ter maus hábitos, não era eu não ter um grande amor e parecer não ter um grande amor, não era nada daquilo, era alguma coisa muito mais básica, muito mais urgente, muito mais imediata. Novamente, quando eu me dei por mim, eu estava deitada na cama e me acariciava. Minha mão tinha procurado instintivamente o biquinho do meu peito. A outra esfregava-se na coxa. Meu irmão bateu mais uma vez, perguntando por mim. Comecei a apertar com mais intensidade o biquinho enquanto a mão na coxa subia e atingia minha boceta. Fernando desistiu. Pude ouvir ele fechando a porta do seu quarto ao entrar. Minha mão começou a brincar com o grelinho. Eu sabia o que ia acontecer. Eu tinha certeza. As coisas já estavam melhores. Já estava melhorando. E iam melhorar mais. Só faltava uma coisa. Um detalhe. Apenas um, unzinho.
Os estalidos recomeçaram e eu gozei longa e fortemente pela primeira vez na vida.
E foi assim, por causa daquela cama mal pregada, que começou a minha obssessão. Sempre que eu percebia que meu irmão retirava-se discretamente para trancar-se em seu quarto, eu tentava fazer a mesma coisa, para me entregar às carícias de meus dedos em meu quarto e de Fernando em minha imaginação, gozando juntos em nossa intimidade familiar e proibida. A idéia de partilhar com meu irmão meu corpo, além de meu sangue, contrariando todas as regras morais e sociais, ainda que apenas em pensamento, sempre me deixava quente e lânguida, irmãos jovens e nus suando e se amando fraternal e sexualmente.
Permaneci nesta rotina, embora dificilmente se aplique a sensações de prazer tão satisfatórias a palavra "rotina", durante cerca de seis meses, quando nossos pais resolveram passar o fim de semana na casa de meus tios, em Petrópolis. Aquela cidade enevoada e pastel nunca me atraiu muito e pretendia assistir com as amigas a um filme que havia estreado. Além do mais, meu irmão disse que iria ficar no Rio para estudar e a simples idéia de completa liberdade para nossa masturbação já me inclinou completamente a permanecer em casa. Assim, eles se foram e nós ficamos, cheios de pão fatiado, queijo, presunto e ovos para nossos lanches e números de telefone, para qualquer emergência, embora já estivéssemos grandinhos o suficientes para cuidarmos de nós mesmos.
O sábado no Rio amanheceu ensolarado e Fernando e eu fomos à praia com a turma. Flertamos com nossos amigos e aproveitei para passar algum tempo deitada encostada contra o peito nu de meu irmão, gravando na mente as sensações do toque daquele corpo para minha planejada orgia solitária à noite. Eu sempre me senti feliz e relaxada quando voltava quente pra casa depois da praia e tê-la toda somente para mim e o homem de meus sonhos aumentava esta sensação.
Fui a primeira a tomar banho e aproveitei tudo que pude para provocar Fernando. Quando chegamos, soltei o sutiã em sua presença, mas de costas. Sentir meus seios completamente livres na casa, na presença de um homem, meu irmão, me excitou profundamente e em vez de correr, andei lentamente até o banheiro para usufruir longamente deste momento. Deixei a porta aberta e liguei o chuveiro, enquanto imaginava que Fernando estivesse me observando. Não resisti e comecei a esfregar meu clitóris, mas parei sempre que estava próxima do orgasmo. Queria guardar tudo para quando ouvisse os estalidos da cama e que viesse do fundo das minhas entranhas e me estourasse.
Saí do chuveiro e usei a toalha para me cobrir somente à frente quando chamei meu irmão e dessa vez ele não conseguiu esconder sua perturbação enquanto caminhava para o banheiro. Fui para o meu quarto e abri uma revista. Folheava as páginas sem ter a menor idéia do que estava ali escrito ou ilustrado. Tudo em que eu conseguia pensar era quando o meu irmão se deitaria ali do lado e a cama começaria a sacudir. Nem queria me acariciar pelo medo que tinha de chegar rápido demais ao gozo.
Ouvi a porta bater. E então, um "clic".
Nem me dei ao trabalho de fechar a minha porta. Apenas apaguei a luz e fiquei olhando para a noite pela janela. Uma noite bonita, com estrelas. A casa toda estava escura e a cama de meu irmão rangia e eu me sentia bem e livre e comecei a me masturbar. Tirei minha blusa e apertei o mamilo direito e o arrepio correu da minha boceta avermelhada e subiu até o peito e só me deixou um certo alívio depois que eu suspirei. Lembrei das costas lisas e musculosas de meu irmão e o calor de minha mão apertando meu sexo aumentou a intensidade do arrepio e eu tive que ir buscar imediatamente o meu grelo, para tentar buscar algum desafogo, algum consolo. Imaginava meu irmão com seu pinto na mão, duro como uma clava, com uma consistência rígida e macia, subindo e descendo, subindo e descendo enquanto ele, como eu, suava e revirava os olhos, entrando em outras regiões da mente. Meu irmão, completamente nu, o rapaz que falava calmo e me abraçava e apertava minha bochecha completamente tranquilo, com a paz da intimidade fraterna, pensava naquele jovem agora, atravessando agora as mesmas sensações que eu sentia agora, as estrelas estavam belas e eu fechei, fechei os olhos, apertava um mamilo e outro já machucando, pressionava meu grelinho até o fundo, com pressa, com velocidade, eu já ia gozar, eu não queria gozar tão rápido, mas ia ser profundo, ia vir lá de dentro, depois eu gozava mais, tinha o fim de semana todo pra mim, completamente, eu já sentia o orgasmo vindo, quando então, de repente, tudo parou.
Alguém segurou minha mão.
Eu tinha deixado a porta aberta.
E Fernando agora estava olhando para mim.
Suado, cheirando salgado, o cabelo molhado e descabelado.
Meu primeiro reflexo foi me cobrir, tentar ocultar meus seios flutuando livres, minhas pernas nuas, meus pelos castanhos-claro. Assustada, perguntei o que ele estava fazendo no meu quarto, ali, como tinha entrado e então ele me falou que já que há seis meses eu apreciava tanto gozar junto com ele, se não queria fazer isso de uma maneira melhor.
E foi então que eu baixei os olhos e vi pela primeira vez um cacete ereto.
Avermelhado e grosso, como algo que eu nunca tinha visto.
E ele estava sorrindo. Nenhuma grosseria ou baixaria, nem violência. Se eu tivesse dito que não, ele certamente teria se virado e ido embora e nunca mais tocaríamos no assunto, mas não havia como eu dizer não. Minha boceta parecia soltar faíscas com o gozo interrompido e ali, sem nada ou ninguém para me impedir, para me ameaçar ou me envergonhar, estava o objeto do meu desejo e da minha curiosidade de virgem. Há muito tempo eu tinha sonhos à noite imaginando as sensações de ter um homem dentro de mim e agora tinha à minha disposição aquele com quem eu tinha mais intimidade, amor e até desejo. E aquele objeto, tão diferente à minha vista do que em fotos ou em vídeo. Aquela alavanca atravessando o corpo de Fernando, aquela lança cravadaem sua virilha, exalando um cheiro que ocupava todo o quarto, um cheiro que se sobrepunha ao meu, como ele se sobrepunha ao meu sexo.
E parecia macio e gostoso, gostoso de morder, de lamber e foi isso a primeira coisa que fiz.
Meu irmão estava esperando outra reação. Um beijo, ele disse depois. Um beijo de língua com a irmã, algo com que ele também sempre sonhara. Mas minha curiosidade era grande demais para perder tempo com essas preliminares. Eu precisava saborear aquele membro quente e confortante. Precisava saber seu gosto, precisava saber sua consistência, precisava morder aquilo. E precisava mesmo, porque era muito bom.
Era salgado sem ter sal, era macio aos lábios e firme aos dentes. E grande, muito grande, tinha que ficar mexendo a língua e toda a boca para conseguir acomodá-lo e tudo que eu queria era acomodá-lo para sempre. E comecei a sugar e mamar, instintivamente, a saboreá-lo, a abocanhar até a porta de minha garganta e voltar até a ponta, sentir seu topo arredondado. Lá embaixo, entre as pernas, podia sentir o cheiro tremendamente aumentado de meu suco umedecendo completamente meus pelos. Eu estava em minha cama, nua, chupando um pau e com meu irmão me tranquilizando e assistindo a tudo, até porque o pau era dele. Como era bom ter um irmão com quem você se dava bem!
Minha boca estava completamente ocupada por aquele colosso e minha boceta continuava a soltar faíscas lá embaixo. Eu sentia como se lava quente estivesse escorrendo lentamente e se depositando nas minhas coxas. A ponta de meus mamilos batendo vez por outra nas pernas peludas dele também me obsedava mais e mais. Eu precisava me masturbar, meu corpo não poderia aguentar tanto estímulo, precisava de alívio, precisava descarregar, precisava brilhar como um raio. Levei minha mão ao meu grelinho, mas meu irmão me segurou. "Não", ele disse, "ainda não, Camila. Ainda é muito cedo".
E puxou-me pelos cabelos. Aumentei a sucção e pude ouvir um suave "plop" quando minha boca desconectou-se de sua espada. Minha língua ainda avançou um pouco para fora, tentando manter o contacto, sem forças e sem vontade, mas fomos definitivamente separados pela sua mão firme em meus cabelos, com um aperto cuja força e decisão me excitava mais ainda. Ele levantou meus olhos, que buscavam os contornos daquele mastro, buscando reconhecer agora com um pouco mais de calma as formas e volumes que minha língua explorara e deixara completamente meladas de minha abundante saliva. A branda erupção entre minhas pernas aumentou quando ele me puxou e senti meus seios livres balançarem lentamente, apontando para a cama e roçando levamente em seus pelos, eriçando completamente minha nunca.
"Vem cá, maninha. Vem ver o resto de mim, que você gosta tanto. Ou pensa que eu não percebi você se roçando em mim na praia?"
E afogou minha cabeça em seu peito. Meus seios se apoiaram em sua coxa, enquanto eu lambia todo o seu corpo. Em seguida, desci até a virilha e ele, sempre me puxando pelos cabelos, me fez desviar de seu sexo e descer pelas pernas. A sensação dos pelos na boca me incomodou e ele pareceu adivinhar, já que acabou o percurso rapidamente e finalmente me olhou novamente nos olhos.
E empalmou-me entre as pernas.
Foi a primeira vez que ele tocou minha pele e a intempestividade e força do gesto fez a erupção recomeçar com toda a força e violência. Sua mão, bem maior do que a minha, cobria muito mais de minha fenda e me apertava com muito mais vontade. Seus olhos pareciam mais estarem me observando, analisando minhas reações, um irmão mais velho ensinando sua irmãzinha a fazer alguma coisa e essa segurança aumentava ainda mais minha excitação.
Sua mão percorreu minha vagina, de cima a baixo e de lado a lado. Evitou escrupulosamente meu grelinho, sabendo que qualquer carícia a mais poderia me fazer derreter de vez. Eu olhei para baixo para ver meu corpo nu sob suas mãos e novamente para ele, que apenas me encarava muito seriamente. Senti uma vontade incontrolável de beijá-lo, mas ele me deteve, "agora não, agora espera, Camila", ele disse.
Sua mão, completamente encharcada, atravessou toda a minha bocetinha e comecei a sentir seus dedos em minhas nádegas. Com a outra mão, ainda me olhando, ele começou a pinçar meus mamilos, alternadamente, adicionando uma pontada violenta à sensação da lava se despejando em cascatas de minha vagina empalmada, enquanto sentia seu indicador encontrar a circunferência de meu cuzinho, que instintivamente se recolheu ao toque.
Fernando então recolheu sua mão e, sempre me olhando, fez-me lamber longamente seus dedos, um por um. "Capricha, Camila, é para você", foi tudo que ele disse. Eu lambi cada um deles, sentindo na boca entretanto uma certa decepção, faltava a grossura e o volume daquele saboroso cacete. Então ele novamente pinçou meu mamilo, me fazendo suspirar inevitavelmente e desceu pelas minhas costas até minhas nádegas, serpenteou em meu rego e seu dedo médio procurou um pouco, até encontrar a porta de meu cuzinho, novamente.
E desta vez entrou, enquanto ele puxava meu mamilo e me extraiu um longo, profundo, sentido suspiro. Pela primeira vez na minha vida, meu corpo era invadido, penetrado. A melação em minha virilha era tão grande que seu dedo penetrou suavemente e a sensação estranha era agradável e provocante, embora o toque do invasor me parecesse excessivamente duro e frio. E pequeno.
Meu corpo precisava ser preenchido por algo mais quente, aveludado e volumoso e por isso mergulhei novamente de boca em seu bastão. Aquilo tudo me enlouquecia. Meus seios balançavam ao ar livre, um deles pinçado. Estava afogada numa firme vara de carne, enquanto um corpo estranho entrava e saía lentamente de minha bundinha. Minha bocetinha se contraía violentamente, como se buscando no ar algo para preenchê-la. Chupava cada vez mais violentamente, meu corpo inteiro estava pulsando e se contorcendo, minha bunda se jogando para trás, procurando mais preenchimento, minha boca circulando e lambendo e chupando o cacete, meus seios se esfregando no braço que apertava meu biquinho.
"Está ótimo, Camila. Perfeito", levantou novamente meu irmão minha cabeça pelos cabelos. Meu corpo continuou se contorcendo. Fui obrigada a sentar em sua frente, mas continuei rebolando na cama em cima do dedo. Ele o tirou. Me largou completamente. Nada mais nos unia, mas eu abria e fechava as coxas e esfregava-as com as mãos, "não pára, Fernando, não pára", murmurei, enquanto abria a boca salgada dos fluidos dele em busca de um beijo. Ele no entanto recusou meus lábios, saiu de lado e me fez deitar de bruços, enquanto comentava, "parar, maninha? Agora é que nós vamos começar...", enquanto eu estava ali, deitada, nua, excitada e completamente indefesa nos braços de meu irmão pelado.
Era agora.
Senti algo percorrendo minhas costas, quando ele se ajeitou atrás de mim. Senti a ponta macia de sua lança descer entre minhas nádegas e se ajeitar na ponta de meu cuzinho. Ele pressionou um pouco e o anelzinho percebeu que não iria ser algo tão fácil de entrar quanto o dedo. Seria muito mais volumoso. Muito mais invasivo, muito mais penetranto, muito mais grosso, muito mais largo e principalmente, muito mais violento e incisivo.
Ia ser ótimo.
Ele deu a primeira pressão, sentado sobre minhas coxas. Eu soltei um murmúrio. Ele recuou. Forçou novamente. Eu mordi os lábios e soltei um pequeno suspiro de dor. Ele recuou e parou.
"Não, Fernando, nunca", eu comecei a rebolar debaxo dele, "me amassa, me come, me enraba, não pára, maninho, meu irmão querido, meu irmãozão, vem cá, tanto que a gente brigou, me machuca agora mais um pouco, mais um pouquinho só, vem".
Eu não sei que cara ele fez quando eu gritei todas essas bobagens, mas sei a cara que eu fiz quando seu mastro dardejante afastou as paredes de meu cuzinho para o lado e aconchegou-se naquele almofada perfurada. A dor momentânea foi como se eu tivesse levado uma topada. Cerrei os dentes e pensei que passaria, assim como passa uma topada. Ainda mais com algo me apertando. O pau dele entrava em mim, indo e saindo e eu podia senti-lo quente, quente e macio, bem mais macio do que o dedo, apesar de mais grosso, uma sensação extremamente agradável uma vez ultrapassado o anelzinho, extremamente confortável quando alcançava as minhas entranhas.
A pontada realmente passou e agora eu podia curtir completamente aquela vara dentro de mim. Ela saía e entrava, cada vez mais fundo e parecia que não ia parar mais de entrar. Eu sentia uma agradável sensação de calor se espalhando em minha bunda e se unindo ao de meu sexo. Toda aquela região do meu corpo havia se transformado numa mole pasta, em que a única coisa dura era o cacete invasor de meu próprio irmão. O garoto que me defendia na escola, que me ajudava no dever de casa, que ajudava meu pai nas compras, que assistia tevê comigo, aquele inofensivo rapaz agora estava sentado em cima de mim com uma vara enterrando-se no interminável abismo de meu rabo. Eu estava empalada, com uma sensação de preenchimento, de estar entalada, com a boca cheia, arrolhada, como se meu cuzinho fosse feito exclusivamente para aquilo, somente para ter um pau enfiado nele.
Finalmente, senti algo suspenso bater levemente em meus lábios vaginais. Eram suas bolas. Seu cacete havia entrado até o cabo e eu estava enrabada até a borda. E amando. Foi quando meu irmão pôs as mãos em meus ombros e me puxou, deixando-nos ambos sentados na cama, eu presa por um pino de segurancá firmemente instalado dentro de minha bunda. Livre, eu comecei imediatamente a rebolar lentamente, percebendo que seu mastro girava dentro de mim, pressionando as paredes para um lado e para o outro, enquanto me esfregava, sentindo nas costas os pelos de seu peito. Foi quando meu irmão começou a bombar dentro de mim.
Senti que toda aquela região do meu corpo havia se transformado não em pasta, mas em lava fervente. E que não cabia mais dentro de meu corpo, precisava sair. E o único caminho para fora era pela minha bocetinha. Os fluidos todos pareciam estar se concentrando junto aos meus lábios enquanto ele mexia. Eu sentia minhas costas molhadas e suadas, nós dois salgados, nós dois lubrificados e oleosos, mornos e gelatinosos, com a única exceção daquele tronco de carno, liso e sem galhos, rodando e bombando dentro de mim, em minhas entranhas. Pela primeira vez, senti meu irmão pressionando com um dos braços meus seios, achatando-os contra sua pele, contra seus músculos, enquanto a outra novamente agarrava meus cabelos, girava meu rosto e me fazia encará-lo.
E, pela primeira vez, nossos lábios se uniram.
A erupção começou e nada poderia pará-la. Eu soterraria Pompéia, destruiria Krakatoa, submergiria a Sicília e calaria o Vesúvio e ainda assim haveria muito que aliviar, muita lava que escorrer, muito fogo a expelir. O calor que derretera todo meu corpo da cintura para baixo alcançou meu cérebro. A única coisa sólida em todo o meu corpo eram os meus biquinhos achatados debaixo do braço de meu irmão. Eu estava gozando de uma forma que achava inimaginável, impensável, inalcançável, de uma forma que me dava medo de morrer, medo de morrer por ter descoberto algum segredo fora do alcance dos mortais, de estar tendo uma visão de um mistério proibido, de estar adentrando uma zona esquecida da mente humana, para nunca mais sair, nunca mais terminar, nunca mais voltar a ser um ser humano, a pedir para meu irmão atender o telefone, a jogar com ele Banco Imobiliário, a me levar à festa dos amigos dele, a me enrabar, me enrabar com força e jeito, a me mostrar que eu nasci para isso, para ser enrabada pela pessoa mais íntima de mim, pelo único homem que poderia arrancar de mim tal orgasmo, dada a nossa proximidade, a proibição tácita de nos tocarmos e nos desejarmos, nos amarmos, à proibição inominável, eu estava pondo para fora tudo que havia dentro de mim, toda e qualquer neuroso que eu tivesse, enquanto gritava sem parar, gritava como o animal à qual fora reduzida, sem um verniz de civilização, de racionalidade, de responsabilidade, porque eu estava em primeiro lugar tão jovem e já transando, em segundo lugar, levando atrás em vez de na frente e, em terceiro e principalmente, dando para o meu irmão, tudo que era proibido, tudo que era reprimido, saía de mim por todos os buracos livres, eu gozava, babava, gritava, chorava, molhada e suada, taquicárdica e fervendo, levando não só a mente como meu corpo aos limites.
Finalmente, o vôo foi terminando. Consegui ver terra firme. Sentia-me abrindo amplamente as asas enquanto planava sobrevoando o mar e preparando para aterrar na praia. Estava chegando. Meus músculos se desligaram completamente e eu caí de vez sobre o peito de meu irmão, sua vara ainda dura me mantendo em posição. O gozo terminara e eu estava derretida, gelatinosa, pastosa, desmontada, com apenas sua alavanca me dando um vislumbre de sustentação.
E, então, ele começou a escorregar para fora de mim.
"Não, Fernando, não tira!", eu implorei. Ele retrucou que a posição o estava incomodando, mas eu insisti, me atirei contra sua virilha, não queria deixá-lo sair. "Mas eu quero gozar, Camila e estou formigando" e, num gesto brusco, saiu de mim, me deixando com uma terrível sensação de vazio e abandono.
"Não, Fernando", eu pedia, enquanto ele se afastava. Seu bastão passou perto de minha boca, ainda duro e lustroso. Em meio a tantas atitudes proibidas desta noite, passou-me a vontade de prová-lo ainda com meu gosto nele e o abocanhei. Meu irmão gostou da idéia, pelo longo suspiro que soltou e a mão que imediatamente alcançou meus cabelos e começou a tentar forçar um vaivém. Mas eu continuava vazia, precisando ser preenchida. Puxei sua mão, levei seus dedos até a porta de minha bundinha, sugerindo-lhe que pelo menos aquilo ele me enfiasse. Ele começou a fazer isso, mas subitamente parou.
Senti que ele se esticava, como se para alcançar algo mais distante da cama, o interruptor ou algo sobre minha penteadeira. Ele novamente se ajeitou sobre a cama. Eu continuei a chupar seu pau, a percorrê-lo e circulá-lo, e procurei seu braço, novamente tentando fazê-lo me preencher.
Foi aí que eu percebi que ele tinha pego um tubo de desodorante.
"Hmmmmmmmmm", murmurei longamente, a boca cheia e os lábios fendidos pela pica de Fernando, num protesto sem nenhuma convicção, imaginando que ia ser submetida a mais um ato sexual que meninas de minha idade não fazem e que por isso mesmo novamente iria descobrir um prazer que garotinhas da minha idade não sentem. O pau de meu irmão na boca, minha cabeça indo e voltando puxada pelos cabelos e aquele tubo de desodorante prestes a me invadir, prestes a ocupar o vazio deixado pela tora que me levara ao paraíso.
O tubo era mais fino, mas também mais duro e frio. Entrou de uma única vez, com suas paredes plásticas lisas e escorregadias, com pouco atrito, face ao alargamento de meu cuzinho e à melação toda que o lubrificara. Estava longe de ser confortável quanto carne, mas eu podia senti-la na boca enquanto estava preenchida atrás. Eu acabara de ser enrabada, estava chupando um pau e ainda tinha um consolo no cuzinho. Tudo isso com meu irmão. E ainda era virgem.
Comecei novamente a me contorcer e a chupar com mais volúpia e vontade. Meu irmão não resistiu muito. Mais tarde ele passaria a gozar mais rápido, diria que naquele dia estava nervoso demais para chegar logo ao orgasmo. De qualquer forma, senti pela primeira vez o caldo viscoso e amargo do homem em minha boca, seus jatos que me provocavam ainda mais. Levei a mão até o tubo de desodorante firmemente fincado entre minhas nádegas e bombei um pouco para acompanhar o gozo de Fernando. Engoli tudo. Nem me passou pela cabeça não fazer aquilo, por mais que o sabor não tivesse me agradado, bastante diferente do delicioso salgado do fluido lubrificante anterior.
Paramos um pouco. Esticamos e nos relaxamos na cama. Tanta excitação havia exaurido nossas forças e agora éramos folhas ao vento. Chuva secando. Foi então que Fernando falou, "vem, Camila, estamos todos melados. Vamos tomar banho". Eu repliquei que queria ficar mais um pouco ali, que gostava dos cheiros, que gostava de tudo, mas meu irmão insistiu e me puxou para me deixar de pé. E, quando ele conseguiu, eu entendi porque ele queria me levantar da cama. O primeiro passo que eu dei, o tubo de desodorante rolou em minha bunda e pressionou as paredes de meu cuzinho e me fez me apertar toda novamente.
A noite ainda ia ser longa e eu estava em minha cama, em meu quarto, com minha família, com a casa toda para mim e meu irmão. Ainda tínhamos todo o fim de semana para fazer ranger a cama dele, o sofá, a cama de nossos pais. Uns estalidos. Apenas isso tudo e começou a longa viagem de nós dois pelos proibidos e obscuros caminhos, segredos e mistérios do sexo. Eu seria enrabada ainda muitas e muitas vezes, com Fernando mantendo minha virgindade longa e torturantemente, até uma ocasião muito especial. A chegada de nossos primos, para passar uns dias durante as férias.
(Continua)
Andréa tinha vinte e dois anos, um corpo maravilhoso e a gerência de uma boutique, com um monte de funcionários que não gostavam dela, mas isso não fazia muita diferença num mundo globalizado neoliberal com o desemprego em alta, o que não dá muita saída além de aceitar mais hora extra não remunerada e mais cortes na comissão, mesmo sabendo que, como comentavam pelos cantos, "ela diz que os tempos estão tão duros quanto os peitos dela, quando na verdade estão, no máximo, tão duros quanto o membro viril do namorado dela", referência maldosa à idade do amado da jovem, um bem-sucedido publicitário de quase cinquenta anos. Porque Andréa era dessas meninas que, aos dezoito anos, só tem tailleurs no armário. Que nunca suava quando saía pra dançar. Que nunca se despenteava. Que só via filme europeu e frequentava o Estação Unibanco, saindo para discutir a mensagem da fita com seus amigos trintões e quarentões em algum sushi bar. E que ainda por cima, quando tinham que gargalhar, riam baixinho. Para não atrapalhar ninguém. Andréa já trabalhara como contato publicitária e como promotora de eventos, mas dizia aos empregados, que ganhavam uma fração de seu salário, que só estava naquele posto mal remunerado para ter tempo de terminar a faculdade de administração, já que desistira do Direito.
Mas isso não significava que ela não se dedicasse ao seu trabalho. Ela era profissional. Esforçada. Ambiciosa. Era por isso que não gostava de gente de sua idade. Um bando de irresponsáveis e brincalhões. Inconsequentes. Tolos. Fúteis. Reclamavam tanto de fazer hora extra, mas eram incapazes de tomar qualquer atitude. Era só ela anunciar serão para ouvir os lamentos. E só. Ninguém se queixava diretamente. Ninguém tinha coragem para tanto. Sem ambição. Fracos. Nenhum deles teria a disposição dela, a disposição de estar tão tarde da noite ainda na loja, checando os livros de caixa e o estoque. Ela tinha ouvido muito os empregados comentando sobre os shows que tinham ido assistir ultimamente. Muitos shows. E todos caros. Sem contar que o François havia mesmo comprado um carro. Podia parecer pouco, mas ela não chegara tão longe em tão pouco tempo de outra forma. Podia ser apenas um indício de que eles estavam aprendendo com ela a organizarem suas vidas, mas como ela não vira nenhuma mudança no comportamento deles, ela duvidava disso. Ela queria ter certeza de que ninguém estava roubando a loja.
E, pelo jeito, era isso que ela ia conseguir. Livros, planilhas, estoque, faturas, tudo conferia perfeitamente. Mas não batia. Algo ali não batia. Ela estudara Jung, Freud, Campbell e sabia que intuição era a maneira do subconsciente avisar você de alguns fatos coletados que você desprezou conscientemente. Ela sabia que não devia desprezar seus instintos. Alguma coisa andava errada com os funcionários daquela loja. Mas o quê? O quê?
Foi quando ela ouviu os passos.
Alguém estava se movimentando no estoque.
A gerente sorriu. Agora estava tudo claro para ela, ali, naquelas sombras. Não era uma manobra contábil.
Andréa aproximou-se intimorata da escuridão e chamou em voz patronal pelo empregado, "François?", mas as sombras permaneceram indevassáveis à sua vista e voz. Ela então inquiriu de novo, aumentando o tom de ordem.
"François"?
"Ouça-a, Mama Legba. Ela está sozinha e indefesa no escuro, mas ainda assim prefere ser desagradável e autoritária. Ela não demonstra o menor medo".
"Medo? Eu, François? Você é que deveria estar, andando pela loja a esta hora fazendo não sei o quê, logo depois de comprar um carro novo. Você vai ter muitas explicações a dar à Débora, depois do que eu contar a ela. Eu não, eu não tenho nada a esconder, não tenho nada a temer."
Ela mal acabou de falar, mal acabou de fazer seu discurso repreensivo, suas falácias de censura, quando uma voz feminina, uma voz de mulher, uma voz de uma mulher que viveu muito, que viu de tudo, a voz de uma mulher que conheceu mistérios deste e de outros mundos, uma voz de mulher com toda a autoridade advinda da experiência, a verdadeira autoridade que Andréa desconhecia completamente riu uma risada asmática, gasta em alegrias profanas e intermináveis em outros tempos e disse, em tom de ironia, "Pois deveria, menina. Isso não é coragem, é apenas estupidez". Andréa tentou localizar a voz, procurar uma sombra, uma silhueta, qualquer coisa que lhe indicasse quem estava lhe falando quando subitamente todo o depósito explodiu em luz, cegando-a tão completa e subitamente que ela caiu ao chão, tentando desesperadamente cobrir os olhos com o braço.
"Problemas com a visão, menina?"
"Onde você conseguiu esse refletor?"
"Não é de estranhar. Você sempre foi cega..."
"Desligue essa luz para podermos conversar..."
"Nunca teve olhos, por exemplo, para Fernando... você tem idéia do que ele sentia por você?"
"Fernando? Ele queria me adular... achava que poderia me subornar com flores e presentes..."
"Ele era perdidamente apaixonado por você, Andréa!!!!! Você não só ignorou os sentimentos do rapaz como ainda o demitiu por isso! Você sabe o que aconteceu com ele quando saiu da loja?"
"Eu não via porque manter contacto com alguém obviamente tão interesseiro..."
"Tão cega... tão perdida e completamente cega... ele entrou em depressão, Andréa. Tentou o suicídio... por uma mulher como você... que desperdício... que tolice..."
"S-suicídio?"
"Foi, menina má... Felizmente François tinha ido visitá-lo e o encontrou a tempo. Ele ainda está sob tratamento psiquiátrico. Vamos pular Ilana, que você demitiu porque ela estava conversando com aquele seu namorado, tentando ser simpática com o amado da patroa e você achou que ela estava dando em cima dele. Vamos falar logo de meu sobrinho-neto... François... e o carro que ele comprou..."
"François é seu sobrinho-neto..?"
"Sim, é... acho que ao menos casado você sabe que ele é... pois bem, o carro que ele comprou foi porque a Ana, esposa dele, estava grávida. Como eles sempre sonharam. No entanto, era gravidez de alto risco. Eles fizeram um esforço tremendo para comprarem o carro para que Ana pudesse chegar a tempo no hospital a qualquer sinal de que algo ia errado. Só que François contava com o pagamento das horas extras... que você cortou. E o carro foi tomado."
"Eu não tenho culpa! Ele não podia se endividar contando com um aumento ainda não decidido..."
"Não era um aumento, vagabunda! Eram meus direitos!"
"Calma, François. Ela vai ter o que merece", e Andréa pela primeira vez tremeu ao ouvir essas palavras da mulher, que em seguida dirigiu-se a ela, continuando a história.
"Sabe o que aconteceu, Andréa? No dia seguinte ao que o carro foi tomado, Ana começou a sentir-se mal, François estava na loja fazendo um serão de graça, para poder manter o emprego e o telefone estava desligado, por economia. Ela tentou tomar um táxi, mas não chegou ao hospital a tempo." A mulher fez uma pausa e Andréa começou a sentir-se mal, já adivinhando o que viria em seguida.
"Ela perdeu o bebê, Andréa. Um menino. E teve complicações. Ela nunca mais vai conseguir engravidar outra vez, Andréa. François não terá o filho que tanto queria com Ana".
Andréa começou a sentir-se mal. Pessimamente. Ela nunca imaginara que um empregado tão descuidado como François pudesse ser um marido tão empregado. Nunca lhe passara pela cabeça que alguém pudesse ser mais atencioso em sua vida sentimental do que em sua vida profissional.
"Eu... eu sinto muito... de verdade... eu não pretendia isso... por favor... apague esse refletor, para podermos conversar..."
"O refletor? Está bem. Apagaremos..."
A luz apagou de repente. Andréa finalmente pôde descobrir os olhos e ver com quem estava falando. Estavam todos ali. François. Fernando. Ilana. Uma senhora idosa, gorda e de branco. Em suas mãos, uma lanterna, agora apagada, com o foco dirigido aos olhos de uma pequena boneca.
Com as feições de Andréa, que teve um súbito choque ao se lembrar que François é um nome de língua francesa, falada, entre outros lugares, no Haiti.
A terra do vodu.
Mama Legba sorriu ao perceber o olhar aterrorizado de Andréa.
"Acho que você já percebeu tudo. Quer ver o que acontece quando eu ligo a lanterna nos olhos da boneca?"
Andréa ficou cega novamente. Cega e indefesa. Ela estava nas mãos deles.
"Apaguem essa luz... por favor... apaguem!"
"Está vendo agora o que é estar à mercê de outros, Andréa? O que você passou todo esse tempo fazendo com os funcionários da loja? Mas isso não é tudo. Estar nas suas mãos também significava estar vulnerável às suas neuras, como a Ilana. Ter os sentimentos mais secretos expostos e descobertos, como Fernando. Você quer ter idéia do que é estar exposto e vulnerável, Andréa?"
"Por favor, deixem-me em...", parou a frase. A voz de Andréa congelou de horror quando ela percebeu o que seus braços vinham fazendo sem que ela ao menos tivesse consciência do que estava acontecendo. Ela estava se despindo. Tirando sua roupa! O casaco e a saia já haviam ido e ela agora tirava a blusa. Estava agora somente de lingerie e meias na frente de seus empregados e sem a menor disposição de parar. Suas mãos cruzadas já abaixavam as alças do sutiã lentamente pelos ombros nus e chegavam ao colo dos seios.
"O que vocês estão fazendo comigo? Parem com isso! Parem com isso já ou vou chamar a polícia!!!!! Vocês vão todos presos!", gritou ela enquanto suas mãos procuravam nas costas o fecho do sutiã.
"Nós, Andréa? Por quê? Não a estamos tocando, ameaçando ou forçando a nada. Você é que está fazendo um espetáculo para nós..."
O sutiã soltou-se e desprendeu-se completamente. Dos quadris para cima, Andréa era apenas pele. Pele bronzeada, sem nenhuma marca de biquini, graças à piscina murada na casa de seu namorado. Seus seios saltaram livres e amorenados, frescos e convidativos ao toque, graças à sua aparência firme e sólida, graciosa, com uma curvatura acentuada em cima e suave e com boa base por baixo, o que os mantinha bem apontados para cima e duros, enviando o olhar para seu cerne, seu centro de sensibilidade e prazer, a região que define e delimita o peito, sem cuja visão não se conhece realmente um busto. Os mamilos amplos e róseos, lisos e redondos da gerente, que soluçava e chorava, incapaz de completar uma frase, contrastando com o seu corpo que fazia questão de continuar o strip tease e exibir-se orgulhosamente.
"Vejam esse peito... vocês ainda acham que eu não tinha nenhuma razão para me apaixonar?", riu Fernando.
"O que vocês estão fazendo comigo?", era o bordão que ela repetia sem parar, a única resistência que conseguia opor, enquanto sentia suas mãos percorrerem os quadris em busca do elástico da calcinha e a baixarem lentamente, expondo sua vagina, com pelos ralos e sedosos, tão convidativos quanto os de um gato, claros e delicados, protegendo a sua fenda vertical, de lábios tímidos, pequenos e fechados.
A calcinha ia descendo pelas torneadas coxas grossas malhadas da deliciosa gerente junto com as primeiras lágrimas em seu rosto. "Por quê... por que vocês estão fazendo isso comigo?", choramingava enquanto sua última peça de roupa se livrava de seu corpo esplêndido e a deixava ali, no depósito, completamente nua e indefesa, à mercê de seus vingativos empregados.
"Para que você veja o que é sentir-se à mercê de outros", foi a resposta de François, "Para que você saiba o que é sentir-se completamente exposta", foi a respostas de Fernando e "Para que você saiba o que é verdadeiramente o poder" foi a resposta de Mama Legba, fechada com uma grande gargalhada que assustou Andréa. A moça tentou esconder seu reflexo, mas seus seios livres e nus balouçaram gentilmente, firmes que eram, traindo seu medo.
"Parece que alguém aqui está tremendo".
"Deixem-me ir embora... por favor".
"Ah, Andréa, mas nós vamos... vamos mandar você embora. Mas não do jeito que entrou aqui. Vamos mandá-la de um modo muito mais gentil. Você vai ser incapaz de dizer não. Vai ser obrigada a obedecer qualquer ordem ou sugestão que lhe dêem. Em suma, vamos apagar seu livre arbítrio... ou livre arbitrariedade, como devia ser chamado no seu caso"
"Vocês não podem fazer isso!"
"Ora, cale-se, Andréa"
"N" foi o único som que a jovem nua pôde proferir antes que suas mandíbulas se cerrassem inexoravelmente. Ela tentou falar alguma coisa, mas nem sequer um suspiro pôde sair de seus lábios. Ela estava nua e agora muda.
"É claro que você vai continuar exatamente do jeito que é. Não vamos tocar na sua personalidade. Você pode continuar a tratar as pessoas como sempre tratou. Mas vamos ver se é isso que você vai fazer a partir de agora", explicou Mama Legba enquanto era seguido pelos olhos suplicantes da silenciosa gerente nua, movimento que continuava a fazer seus seios empinados balouçarem suavemente, como se tocados por uma brisa.
"Veja isso como um teste de personalidade", disse François, levando todo mundo a gargalhar, menos é claro, Andréa, que não o poderia mesmo que tivesse achado graça. O neto da sacerdotisa vodu continuou. "Pode falar agora, Andréa".
"P-por favor..." falou a moça nua, como se estivesse soltando a respiração após ficar debaixo d'água.
"Viu como funciona? Muito bem, Andréa, chega por hoje. Pode vestir-se e ir embora..."
"Vocês não podem me deixar ir embora assim".
"Tem razão. Espere, Andréa", disse Fernando.
Os braços nus da loura, que buscavam sua calcinha, pararam imediatamente.
"Lembra como você reclamava do meu cigarro? Que não suportava fumantes? Que não entendia o que eles viam no cigarro? Pois agora você vai entender... vai entender o que é obsessão... a mesma que eu tinha por você".
"Não", protestou fracamente a moça nua, enquanto tentava apertar o busto com os braços para expor menos seus belissimos seios, "por favor, não me faça fumar... cigarro mata".
"Não, não íamos querer que você estragasse esse lindo corpinho, não é mesmo? Eu tenho uma idéia muito melhor... muito melhor..."
Mais uma vez os seios da jovem tremeram, entregando seu medo.
"Você vai ser viciada em... esperma!"
"Não!"
"Sim! É disso que os receptores de seu cérebro mais vão gostar. Só uma dose de porra vai conseguir te satisfazer, quando você estiver sem um pouco há muito tempo. É esse que vai ser seu vício. Você vai ser dependente química de porra! Porra!"
Os braços de Andréa se alargaram. Ela cambaleou e quase caiu enquanto sentia seu estômago se revirar, suas entranhas se reconstruirem, enquanto seu cérebro lhe dava vontade de comer alguma coisa diferente e não era um sushi, nem comida alemã, nem comida italiana ou espanhola, ela precisava de um sabor mais forte, de um sabor mais temperado e forte, alguma coisa salgada e suada e só ao pensar isso, sentiu aumentar o calor entre suas pernas e essa sensação lembrou-a automaticamente que estava nua e sua pela completamente exposta levou seu pensamento diretamente a sexo, o que só fez aumentar a salivação em sua boca, ao pensar num sexo masculino ereto, com as bolas cheias, bem cheias.
Andréa sentiu um arrepio de medo percorrer sua espinha ao perceber que, ao pensar nisso, lambera os beiços inconscientemente.
"Será que funcionou?", perguntou Fernando a François, que lhe respondeu "não sei. Experimenta". O jovem tímido hesitou por um instante, pensou no constrangimento, mas, ao olhar aquela mulher maravilhosa nua, suas nádegas firmes e rijas, com uma marca de biquini que parecia ter nascido com ela, pequena e bem localizada, seus quadris amplos e sua cintura estreita, seus seios maravilhosos, suas pernas fartas e curvilíneas, chegou à conclusão que aquilo valia qualquer sacrifício e se aproximou dela.
Andréa, caída, levantou-se um pouco. Ajoelhou-se, ao ver Fernando se aproximar. Seus mamilos tornaram-se mais escuros e rijos. Fernando chegou perto. Sua virilha à altura da boca dela. O coração da gerente batia acelerado. Seu rosto avermelhava-se e ficava afogueado. Suas pálpebras tremiam e seus olhos demonstravam pavor, mas sua boca se entreabriu lentamente, esperando receber um presente.
Fernando parou. "E agora?", perguntou.
"Bota ele pra fora", pediu Andréa, bem baixinho.
"Como?", insistiu Fernando ironicamente. Ironia que não teve muito efeito. A gerente, lembrando o modo como conseguiu subir tão rápido na carreira, com decisão pulou sobre a calça de Fernando, desceu o zíper, enfiou a mão lá dentro e puxou uma tora um tanto curta e de grossura média e abocanhou-a tão logo ela viu o ar livre. "Ai!", soltou Fernando, assustado com a voracidade da moça. Os outros riram. "Devagar, Andréa. Eu sempre gostei de sua... elegância". "Mmmmmmm", protestou Andréa através de sua boca repleta, diminuindo o ritmo do boquete, como ordenado, contra a sua vontade.
"Se bem que ela não parece muito elegante agora".
"Com esse corpo, ela vai ser elegante de qualquer jeito, François", replicou Fernando, antes de fechar os olhos e acariciar os cabelos sedosos da garota, inutilmente, pois Andréa estava totalmente concentrada em como levar seu ex-empregado ao gozo o mais rápido possível, mesmo sendo obrigada a um ritmo mais cadenciado. Seu corpo inteiro estava focalizado em chupar o membro dele. Seu busto subia e descia, com os movimentos de sucção repetindo o vaivém de sua boca. Uma de suas mãos movimentava a pouca pele que não estava abocanhada, tentando ajudar o orgasmo com uma punheta. Ela sentia sua boceta pulsar antecipando o líquido quente e viscoso prestes a se derramar por sua língua. Cada vez que ela pensava isso, sua outra mão apertava o saco do rapaz, como se tentando espremer o conteúdo.
"Eu não imaginava que ela tivesse uma boca tão grande".
"Com o estímulo que ela recebeu, meu chapa, cabia qualquer coisa". Andréa ouviu isso e sentiu, ao longe, embaixo do frêmito de seu corpo, um vergonhoso sentimento de degradação. Mas se degradação era tão bom, qual o problema? Ela corou e tentou afastar os pensamentos enfiando mais do mastro de Fernando em sua boca, quase sufocando e sentindo os pelos púbicos do rapaz tocarem seu nariz e lábios. O cheiro salgado do suor depositado na virilha dele aumentou ainda mais sua fome e ela começou a temer que uma descarga não fosse o suficiente para o que ela precisava, o que aumentou ainda mais a sua ansiedade. Ela liberou a mão que tentava a desajeitada punheta e baixou-a até seu botãozinho. Ela precisava descarregar suas necessidades. A ponta de seus dedos percorreu suavemente a superfície de seu clitóris e ela sentiu uma pequenissima pontada de alívio da terrível fome que a castigava, mas ainda assim, era um alívio e ela começou a masturbar-se com força e vigorosamente, já que ninguém lhe ordenara que ali ela fosse devagar.
"Olha só...", comentou François, "parece realmente que o Edgar não dava conta satisfatoriamente de nossa chefinha", referindo-se ao namorado quarentão da garota. Andréa só pôde soltar outro murmúrio abafado de protesto, com todo o comprimento da espada de Fernando em sua boca. O murmúrio, no entanto, não acabou, continuou, mais forte e pausado, mais lento e certo, ela fechou os olhos e descontrolou-se, ela estava gozando, havia chegado ao orgasmo, sentia seus quadris pulsarem involuntariamente, sua boceta aberta sentindo o ar fresco, seu corpo, a partir de seu sexo, se petrificando e depois se liquefazendo, um movimento que a fazia murmurar longamente.
Fernando não pôde resistir ao espetáculo e começou a gozar também e ao sentir o primeiro jato, farto e grosso tocar as paredes de sua boca e sua língua, Andréa teve seu orgasmo multiplicado mil vezes. Ela queria ter o estômago inteiro repleto daquele néctar, todo o seu corpo estufado e recheado com aquele caldo, provar mais e mais e mais, ela apertou mais as bolas dele, aumentando a chupada, a sucção, querendo drenar todo o fluido sexual do seu ex-empregado.
A fonte secou. Os jorros pararam. Andréa ainda tentou sugar mais, mas Fernando estava esgotado. Ainda assim, ela insistiu com as chupadas e lambidas, ainda zonza e acesa com o cheiro. Fernando, entretanto, após recuperar as forças, puxou a cabeça dela para trás e tirou seu mastro da boca dela. Um ar de decepção se espalhava pelo rosto de Andréa.
"Bom, hein?"
Andréa, agora satisfeita e com a cabeça temporariamente livre da obsessão, não respondeu. Apenas baixou a cabeça. Mais lágrimas se juntaram às muitas outras já derramadas na noite.
"Agora está bem. Pode se vestir e ir embora".
"Não me deixem assim. Por favor."
"Você nunca soube o significado da expressão por favor, Andréa".
"Mas..."
"Chega. Pode ficar aqui mais se quiser, mas nós estamos indo".
"É melhor ir para casa recuperar as energias", disse Mama Legba enquanto se dirigia à porta, "acho que você vai precisar de muita no trabalho amanhã".
Os empregados que saíam riram e fecharam a porta. Andréa ficou lá, quieta, chorando, nua e indefesa no depósito vazio, deprimida.
Quando ela sentiu passar pela sua cabeça que talvez uma boa esporrada melhorasse sua depressão, ela teve um arrepio.
(Continua)
Eram uns estalidos. Baixos, pequenos, mas audíveis. Madeira e prego, o prego se dobrando, se enfiando, entrando mais e mais nas fibras, parando e voltando, parando e voltando. Era a cama do meu irmão. Ele estava se masturbando. Tocando uma punheta. Ele ia sair do quarto suado, vermelho, cheirando forte e ia terminar no banheiro. E depois ia se deitar.
Eu tinha quatorze anos e um namoradinho e o mais longe que chegamos foi ele me explicando exatamente o quê o meu irmão estava fazendo, um dia em que eu deitei no colo dele na minha cama e a gente começou a ouvir os barulhinhos, na mesma hora em que eu sentia na minha face pela primeira vez a forma, o tamanho e a consistência de um pau duro, de um jeito que os amassos que eu tinha dado até então não tinham conseguido me mostrar. E foi enquanto ele me fazia uma leve carícia nos meus cabelos e eu ficava pensando se aquilo que eu sentia encostado na minha bochecha ia conseguir entrar dentro de mim sem me machucar, de que jeito, que ele me explicou o que estava acontecendo do outro lado da parede.
Apesar de muito ingênua, eu já sabia que os garotos faziam essas coisas, mas era uma imagem vaga, uma coisa que os meninos feios, bobos, de óculos, faziam enquanto estavam na privada, uma coisa nojenta e não algo que meu irmão fizesse, na mesma parede que eu, aquele jovem bonito, esguio, forte, de voz pausada e tranquila. Meu irmão. Bem diferente do rapaz que me tinha no colo naquele momento e começou a me descrever como o Fernando estava tocando punheta. Hoje eu acho graça, ele devia estar tentando me provocar, me excitar, pra tentar qualquer coisa comigo, não devia ter muita idéia de como começar. E não era daquele jeito. Ele foi tão grosso que a gente acabou discutindo, acabei botando ele porta afora, ele saiu dizendo que daquele jeito nenhum homem jamais ia querer coisa nenhuma comigo e eu fiquei ali, sozinha na sala, pensando no tamanho do pau dele, se eu ia ter coragem de enfrentar aquilo, pensando em como os homens eram grossos, pensando que eu nunca ia encontrar alguém que realmente me amasse, que eram todos daquele jeito, ele é que estava certo, pensando tudo isso e caminhando de volta para o quarto. E encontrando o meu irmão no corredor. Perguntando o que tinha acontecido.
Eu disse que tinha brigado com o meu namorado, ele perguntou por quê. Ele estava suado e cheirava salgado. Ácido. Forte. E preocupado comigo. Sinceramente. Irracionalmente, a sensação do pau duro de meu namorado encostando em mim me voltou à cabeça. A idéia do meu irmão se masturbando, como um animal, ainda assim terna e gentilmente comovido comigo começou a ter em mim o efeito que o garoto inoportuno tentara causar. Comecei a sentir entre as pernas um calor irradiante e a inefável impressão de que ele podia perceber esse calor, que ele mesmo também estava quente e suave. Quando me dei conta, meus olhos haviam se dirigido instintivamente para o seu sexo estufado sob o short e eu mordia meu lábio inferior. Imediatamente, dei uma desculpa e me livrei dele, correndo para o meu quarto e fechando a porta. Eu estava envergonhada, constrangida e enrubescida, mas quanto mais eu pensava na atitude que eu tivera, mais aumentava o calor entre as minhas pernas e mais eu mordia o lábio inferior. Fernando ainda perguntou através da porta se estava tudo bem. Não. Não estava nada bem, mas eu não disse, eu não disse porque eu não sabia exatamente o quê não estava nada bem, não era o garoto que tinha ido embora, não era meu irmão demonstrando ter maus hábitos, não era eu não ter um grande amor e parecer não ter um grande amor, não era nada daquilo, era alguma coisa muito mais básica, muito mais urgente, muito mais imediata. Novamente, quando eu me dei por mim, eu estava deitada na cama e me acariciava. Minha mão tinha procurado instintivamente o biquinho do meu peito. A outra esfregava-se na coxa. Meu irmão bateu mais uma vez, perguntando por mim. Comecei a apertar com mais intensidade o biquinho enquanto a mão na coxa subia e atingia minha boceta. Fernando desistiu. Pude ouvir ele fechando a porta do seu quarto ao entrar. Minha mão começou a brincar com o grelinho. Eu sabia o que ia acontecer. Eu tinha certeza. As coisas já estavam melhores. Já estava melhorando. E iam melhorar mais. Só faltava uma coisa. Um detalhe. Apenas um, unzinho.
Os estalidos recomeçaram e eu gozei longa e fortemente pela primeira vez na vida.
E foi assim, por causa daquela cama mal pregada, que começou a minha obssessão. Sempre que eu percebia que meu irmão retirava-se discretamente para trancar-se em seu quarto, eu tentava fazer a mesma coisa, para me entregar às carícias de meus dedos em meu quarto e de Fernando em minha imaginação, gozando juntos em nossa intimidade familiar e proibida. A idéia de partilhar com meu irmão meu corpo, além de meu sangue, contrariando todas as regras morais e sociais, ainda que apenas em pensamento, sempre me deixava quente e lânguida, irmãos jovens e nus suando e se amando fraternal e sexualmente.
Permaneci nesta rotina, embora dificilmente se aplique a sensações de prazer tão satisfatórias a palavra "rotina", durante cerca de seis meses, quando nossos pais resolveram passar o fim de semana na casa de meus tios, em Petrópolis. Aquela cidade enevoada e pastel nunca me atraiu muito e pretendia assistir com as amigas a um filme que havia estreado. Além do mais, meu irmão disse que iria ficar no Rio para estudar e a simples idéia de completa liberdade para nossa masturbação já me inclinou completamente a permanecer em casa. Assim, eles se foram e nós ficamos, cheios de pão fatiado, queijo, presunto e ovos para nossos lanches e números de telefone, para qualquer emergência, embora já estivéssemos grandinhos o suficientes para cuidarmos de nós mesmos.
O sábado no Rio amanheceu ensolarado e Fernando e eu fomos à praia com a turma. Flertamos com nossos amigos e aproveitei para passar algum tempo deitada encostada contra o peito nu de meu irmão, gravando na mente as sensações do toque daquele corpo para minha planejada orgia solitária à noite. Eu sempre me senti feliz e relaxada quando voltava quente pra casa depois da praia e tê-la toda somente para mim e o homem de meus sonhos aumentava esta sensação.
Fui a primeira a tomar banho e aproveitei tudo que pude para provocar Fernando. Quando chegamos, soltei o sutiã em sua presença, mas de costas. Sentir meus seios completamente livres na casa, na presença de um homem, meu irmão, me excitou profundamente e em vez de correr, andei lentamente até o banheiro para usufruir longamente deste momento. Deixei a porta aberta e liguei o chuveiro, enquanto imaginava que Fernando estivesse me observando. Não resisti e comecei a esfregar meu clitóris, mas parei sempre que estava próxima do orgasmo. Queria guardar tudo para quando ouvisse os estalidos da cama e que viesse do fundo das minhas entranhas e me estourasse.
Saí do chuveiro e usei a toalha para me cobrir somente à frente quando chamei meu irmão e dessa vez ele não conseguiu esconder sua perturbação enquanto caminhava para o banheiro. Fui para o meu quarto e abri uma revista. Folheava as páginas sem ter a menor idéia do que estava ali escrito ou ilustrado. Tudo em que eu conseguia pensar era quando o meu irmão se deitaria ali do lado e a cama começaria a sacudir. Nem queria me acariciar pelo medo que tinha de chegar rápido demais ao gozo.
Ouvi a porta bater. E então, um "clic".
Nem me dei ao trabalho de fechar a minha porta. Apenas apaguei a luz e fiquei olhando para a noite pela janela. Uma noite bonita, com estrelas. A casa toda estava escura e a cama de meu irmão rangia e eu me sentia bem e livre e comecei a me masturbar. Tirei minha blusa e apertei o mamilo direito e o arrepio correu da minha boceta avermelhada e subiu até o peito e só me deixou um certo alívio depois que eu suspirei. Lembrei das costas lisas e musculosas de meu irmão e o calor de minha mão apertando meu sexo aumentou a intensidade do arrepio e eu tive que ir buscar imediatamente o meu grelo, para tentar buscar algum desafogo, algum consolo. Imaginava meu irmão com seu pinto na mão, duro como uma clava, com uma consistência rígida e macia, subindo e descendo, subindo e descendo enquanto ele, como eu, suava e revirava os olhos, entrando em outras regiões da mente. Meu irmão, completamente nu, o rapaz que falava calmo e me abraçava e apertava minha bochecha completamente tranquilo, com a paz da intimidade fraterna, pensava naquele jovem agora, atravessando agora as mesmas sensações que eu sentia agora, as estrelas estavam belas e eu fechei, fechei os olhos, apertava um mamilo e outro já machucando, pressionava meu grelinho até o fundo, com pressa, com velocidade, eu já ia gozar, eu não queria gozar tão rápido, mas ia ser profundo, ia vir lá de dentro, depois eu gozava mais, tinha o fim de semana todo pra mim, completamente, eu já sentia o orgasmo vindo, quando então, de repente, tudo parou.
Alguém segurou minha mão.
Eu tinha deixado a porta aberta.
E Fernando agora estava olhando para mim.
Suado, cheirando salgado, o cabelo molhado e descabelado.
Meu primeiro reflexo foi me cobrir, tentar ocultar meus seios flutuando livres, minhas pernas nuas, meus pelos castanhos-claro. Assustada, perguntei o que ele estava fazendo no meu quarto, ali, como tinha entrado e então ele me falou que já que há seis meses eu apreciava tanto gozar junto com ele, se não queria fazer isso de uma maneira melhor.
E foi então que eu baixei os olhos e vi pela primeira vez um cacete ereto.
Avermelhado e grosso, como algo que eu nunca tinha visto.
E ele estava sorrindo. Nenhuma grosseria ou baixaria, nem violência. Se eu tivesse dito que não, ele certamente teria se virado e ido embora e nunca mais tocaríamos no assunto, mas não havia como eu dizer não. Minha boceta parecia soltar faíscas com o gozo interrompido e ali, sem nada ou ninguém para me impedir, para me ameaçar ou me envergonhar, estava o objeto do meu desejo e da minha curiosidade de virgem. Há muito tempo eu tinha sonhos à noite imaginando as sensações de ter um homem dentro de mim e agora tinha à minha disposição aquele com quem eu tinha mais intimidade, amor e até desejo. E aquele objeto, tão diferente à minha vista do que em fotos ou em vídeo. Aquela alavanca atravessando o corpo de Fernando, aquela lança cravadaem sua virilha, exalando um cheiro que ocupava todo o quarto, um cheiro que se sobrepunha ao meu, como ele se sobrepunha ao meu sexo.
E parecia macio e gostoso, gostoso de morder, de lamber e foi isso a primeira coisa que fiz.
Meu irmão estava esperando outra reação. Um beijo, ele disse depois. Um beijo de língua com a irmã, algo com que ele também sempre sonhara. Mas minha curiosidade era grande demais para perder tempo com essas preliminares. Eu precisava saborear aquele membro quente e confortante. Precisava saber seu gosto, precisava saber sua consistência, precisava morder aquilo. E precisava mesmo, porque era muito bom.
Era salgado sem ter sal, era macio aos lábios e firme aos dentes. E grande, muito grande, tinha que ficar mexendo a língua e toda a boca para conseguir acomodá-lo e tudo que eu queria era acomodá-lo para sempre. E comecei a sugar e mamar, instintivamente, a saboreá-lo, a abocanhar até a porta de minha garganta e voltar até a ponta, sentir seu topo arredondado. Lá embaixo, entre as pernas, podia sentir o cheiro tremendamente aumentado de meu suco umedecendo completamente meus pelos. Eu estava em minha cama, nua, chupando um pau e com meu irmão me tranquilizando e assistindo a tudo, até porque o pau era dele. Como era bom ter um irmão com quem você se dava bem!
Minha boca estava completamente ocupada por aquele colosso e minha boceta continuava a soltar faíscas lá embaixo. Eu sentia como se lava quente estivesse escorrendo lentamente e se depositando nas minhas coxas. A ponta de meus mamilos batendo vez por outra nas pernas peludas dele também me obsedava mais e mais. Eu precisava me masturbar, meu corpo não poderia aguentar tanto estímulo, precisava de alívio, precisava descarregar, precisava brilhar como um raio. Levei minha mão ao meu grelinho, mas meu irmão me segurou. "Não", ele disse, "ainda não, Camila. Ainda é muito cedo".
E puxou-me pelos cabelos. Aumentei a sucção e pude ouvir um suave "plop" quando minha boca desconectou-se de sua espada. Minha língua ainda avançou um pouco para fora, tentando manter o contacto, sem forças e sem vontade, mas fomos definitivamente separados pela sua mão firme em meus cabelos, com um aperto cuja força e decisão me excitava mais ainda. Ele levantou meus olhos, que buscavam os contornos daquele mastro, buscando reconhecer agora com um pouco mais de calma as formas e volumes que minha língua explorara e deixara completamente meladas de minha abundante saliva. A branda erupção entre minhas pernas aumentou quando ele me puxou e senti meus seios livres balançarem lentamente, apontando para a cama e roçando levamente em seus pelos, eriçando completamente minha nunca.
"Vem cá, maninha. Vem ver o resto de mim, que você gosta tanto. Ou pensa que eu não percebi você se roçando em mim na praia?"
E afogou minha cabeça em seu peito. Meus seios se apoiaram em sua coxa, enquanto eu lambia todo o seu corpo. Em seguida, desci até a virilha e ele, sempre me puxando pelos cabelos, me fez desviar de seu sexo e descer pelas pernas. A sensação dos pelos na boca me incomodou e ele pareceu adivinhar, já que acabou o percurso rapidamente e finalmente me olhou novamente nos olhos.
E empalmou-me entre as pernas.
Foi a primeira vez que ele tocou minha pele e a intempestividade e força do gesto fez a erupção recomeçar com toda a força e violência. Sua mão, bem maior do que a minha, cobria muito mais de minha fenda e me apertava com muito mais vontade. Seus olhos pareciam mais estarem me observando, analisando minhas reações, um irmão mais velho ensinando sua irmãzinha a fazer alguma coisa e essa segurança aumentava ainda mais minha excitação.
Sua mão percorreu minha vagina, de cima a baixo e de lado a lado. Evitou escrupulosamente meu grelinho, sabendo que qualquer carícia a mais poderia me fazer derreter de vez. Eu olhei para baixo para ver meu corpo nu sob suas mãos e novamente para ele, que apenas me encarava muito seriamente. Senti uma vontade incontrolável de beijá-lo, mas ele me deteve, "agora não, agora espera, Camila", ele disse.
Sua mão, completamente encharcada, atravessou toda a minha bocetinha e comecei a sentir seus dedos em minhas nádegas. Com a outra mão, ainda me olhando, ele começou a pinçar meus mamilos, alternadamente, adicionando uma pontada violenta à sensação da lava se despejando em cascatas de minha vagina empalmada, enquanto sentia seu indicador encontrar a circunferência de meu cuzinho, que instintivamente se recolheu ao toque.
Fernando então recolheu sua mão e, sempre me olhando, fez-me lamber longamente seus dedos, um por um. "Capricha, Camila, é para você", foi tudo que ele disse. Eu lambi cada um deles, sentindo na boca entretanto uma certa decepção, faltava a grossura e o volume daquele saboroso cacete. Então ele novamente pinçou meu mamilo, me fazendo suspirar inevitavelmente e desceu pelas minhas costas até minhas nádegas, serpenteou em meu rego e seu dedo médio procurou um pouco, até encontrar a porta de meu cuzinho, novamente.
E desta vez entrou, enquanto ele puxava meu mamilo e me extraiu um longo, profundo, sentido suspiro. Pela primeira vez na minha vida, meu corpo era invadido, penetrado. A melação em minha virilha era tão grande que seu dedo penetrou suavemente e a sensação estranha era agradável e provocante, embora o toque do invasor me parecesse excessivamente duro e frio. E pequeno.
Meu corpo precisava ser preenchido por algo mais quente, aveludado e volumoso e por isso mergulhei novamente de boca em seu bastão. Aquilo tudo me enlouquecia. Meus seios balançavam ao ar livre, um deles pinçado. Estava afogada numa firme vara de carne, enquanto um corpo estranho entrava e saía lentamente de minha bundinha. Minha bocetinha se contraía violentamente, como se buscando no ar algo para preenchê-la. Chupava cada vez mais violentamente, meu corpo inteiro estava pulsando e se contorcendo, minha bunda se jogando para trás, procurando mais preenchimento, minha boca circulando e lambendo e chupando o cacete, meus seios se esfregando no braço que apertava meu biquinho.
"Está ótimo, Camila. Perfeito", levantou novamente meu irmão minha cabeça pelos cabelos. Meu corpo continuou se contorcendo. Fui obrigada a sentar em sua frente, mas continuei rebolando na cama em cima do dedo. Ele o tirou. Me largou completamente. Nada mais nos unia, mas eu abria e fechava as coxas e esfregava-as com as mãos, "não pára, Fernando, não pára", murmurei, enquanto abria a boca salgada dos fluidos dele em busca de um beijo. Ele no entanto recusou meus lábios, saiu de lado e me fez deitar de bruços, enquanto comentava, "parar, maninha? Agora é que nós vamos começar...", enquanto eu estava ali, deitada, nua, excitada e completamente indefesa nos braços de meu irmão pelado.
Era agora.
Senti algo percorrendo minhas costas, quando ele se ajeitou atrás de mim. Senti a ponta macia de sua lança descer entre minhas nádegas e se ajeitar na ponta de meu cuzinho. Ele pressionou um pouco e o anelzinho percebeu que não iria ser algo tão fácil de entrar quanto o dedo. Seria muito mais volumoso. Muito mais invasivo, muito mais penetranto, muito mais grosso, muito mais largo e principalmente, muito mais violento e incisivo.
Ia ser ótimo.
Ele deu a primeira pressão, sentado sobre minhas coxas. Eu soltei um murmúrio. Ele recuou. Forçou novamente. Eu mordi os lábios e soltei um pequeno suspiro de dor. Ele recuou e parou.
"Não, Fernando, nunca", eu comecei a rebolar debaxo dele, "me amassa, me come, me enraba, não pára, maninho, meu irmão querido, meu irmãozão, vem cá, tanto que a gente brigou, me machuca agora mais um pouco, mais um pouquinho só, vem".
Eu não sei que cara ele fez quando eu gritei todas essas bobagens, mas sei a cara que eu fiz quando seu mastro dardejante afastou as paredes de meu cuzinho para o lado e aconchegou-se naquele almofada perfurada. A dor momentânea foi como se eu tivesse levado uma topada. Cerrei os dentes e pensei que passaria, assim como passa uma topada. Ainda mais com algo me apertando. O pau dele entrava em mim, indo e saindo e eu podia senti-lo quente, quente e macio, bem mais macio do que o dedo, apesar de mais grosso, uma sensação extremamente agradável uma vez ultrapassado o anelzinho, extremamente confortável quando alcançava as minhas entranhas.
A pontada realmente passou e agora eu podia curtir completamente aquela vara dentro de mim. Ela saía e entrava, cada vez mais fundo e parecia que não ia parar mais de entrar. Eu sentia uma agradável sensação de calor se espalhando em minha bunda e se unindo ao de meu sexo. Toda aquela região do meu corpo havia se transformado numa mole pasta, em que a única coisa dura era o cacete invasor de meu próprio irmão. O garoto que me defendia na escola, que me ajudava no dever de casa, que ajudava meu pai nas compras, que assistia tevê comigo, aquele inofensivo rapaz agora estava sentado em cima de mim com uma vara enterrando-se no interminável abismo de meu rabo. Eu estava empalada, com uma sensação de preenchimento, de estar entalada, com a boca cheia, arrolhada, como se meu cuzinho fosse feito exclusivamente para aquilo, somente para ter um pau enfiado nele.
Finalmente, senti algo suspenso bater levemente em meus lábios vaginais. Eram suas bolas. Seu cacete havia entrado até o cabo e eu estava enrabada até a borda. E amando. Foi quando meu irmão pôs as mãos em meus ombros e me puxou, deixando-nos ambos sentados na cama, eu presa por um pino de segurancá firmemente instalado dentro de minha bunda. Livre, eu comecei imediatamente a rebolar lentamente, percebendo que seu mastro girava dentro de mim, pressionando as paredes para um lado e para o outro, enquanto me esfregava, sentindo nas costas os pelos de seu peito. Foi quando meu irmão começou a bombar dentro de mim.
Senti que toda aquela região do meu corpo havia se transformado não em pasta, mas em lava fervente. E que não cabia mais dentro de meu corpo, precisava sair. E o único caminho para fora era pela minha bocetinha. Os fluidos todos pareciam estar se concentrando junto aos meus lábios enquanto ele mexia. Eu sentia minhas costas molhadas e suadas, nós dois salgados, nós dois lubrificados e oleosos, mornos e gelatinosos, com a única exceção daquele tronco de carno, liso e sem galhos, rodando e bombando dentro de mim, em minhas entranhas. Pela primeira vez, senti meu irmão pressionando com um dos braços meus seios, achatando-os contra sua pele, contra seus músculos, enquanto a outra novamente agarrava meus cabelos, girava meu rosto e me fazia encará-lo.
E, pela primeira vez, nossos lábios se uniram.
A erupção começou e nada poderia pará-la. Eu soterraria Pompéia, destruiria Krakatoa, submergiria a Sicília e calaria o Vesúvio e ainda assim haveria muito que aliviar, muita lava que escorrer, muito fogo a expelir. O calor que derretera todo meu corpo da cintura para baixo alcançou meu cérebro. A única coisa sólida em todo o meu corpo eram os meus biquinhos achatados debaixo do braço de meu irmão. Eu estava gozando de uma forma que achava inimaginável, impensável, inalcançável, de uma forma que me dava medo de morrer, medo de morrer por ter descoberto algum segredo fora do alcance dos mortais, de estar tendo uma visão de um mistério proibido, de estar adentrando uma zona esquecida da mente humana, para nunca mais sair, nunca mais terminar, nunca mais voltar a ser um ser humano, a pedir para meu irmão atender o telefone, a jogar com ele Banco Imobiliário, a me levar à festa dos amigos dele, a me enrabar, me enrabar com força e jeito, a me mostrar que eu nasci para isso, para ser enrabada pela pessoa mais íntima de mim, pelo único homem que poderia arrancar de mim tal orgasmo, dada a nossa proximidade, a proibição tácita de nos tocarmos e nos desejarmos, nos amarmos, à proibição inominável, eu estava pondo para fora tudo que havia dentro de mim, toda e qualquer neuroso que eu tivesse, enquanto gritava sem parar, gritava como o animal à qual fora reduzida, sem um verniz de civilização, de racionalidade, de responsabilidade, porque eu estava em primeiro lugar tão jovem e já transando, em segundo lugar, levando atrás em vez de na frente e, em terceiro e principalmente, dando para o meu irmão, tudo que era proibido, tudo que era reprimido, saía de mim por todos os buracos livres, eu gozava, babava, gritava, chorava, molhada e suada, taquicárdica e fervendo, levando não só a mente como meu corpo aos limites.
Finalmente, o vôo foi terminando. Consegui ver terra firme. Sentia-me abrindo amplamente as asas enquanto planava sobrevoando o mar e preparando para aterrar na praia. Estava chegando. Meus músculos se desligaram completamente e eu caí de vez sobre o peito de meu irmão, sua vara ainda dura me mantendo em posição. O gozo terminara e eu estava derretida, gelatinosa, pastosa, desmontada, com apenas sua alavanca me dando um vislumbre de sustentação.
E, então, ele começou a escorregar para fora de mim.
"Não, Fernando, não tira!", eu implorei. Ele retrucou que a posição o estava incomodando, mas eu insisti, me atirei contra sua virilha, não queria deixá-lo sair. "Mas eu quero gozar, Camila e estou formigando" e, num gesto brusco, saiu de mim, me deixando com uma terrível sensação de vazio e abandono.
"Não, Fernando", eu pedia, enquanto ele se afastava. Seu bastão passou perto de minha boca, ainda duro e lustroso. Em meio a tantas atitudes proibidas desta noite, passou-me a vontade de prová-lo ainda com meu gosto nele e o abocanhei. Meu irmão gostou da idéia, pelo longo suspiro que soltou e a mão que imediatamente alcançou meus cabelos e começou a tentar forçar um vaivém. Mas eu continuava vazia, precisando ser preenchida. Puxei sua mão, levei seus dedos até a porta de minha bundinha, sugerindo-lhe que pelo menos aquilo ele me enfiasse. Ele começou a fazer isso, mas subitamente parou.
Senti que ele se esticava, como se para alcançar algo mais distante da cama, o interruptor ou algo sobre minha penteadeira. Ele novamente se ajeitou sobre a cama. Eu continuei a chupar seu pau, a percorrê-lo e circulá-lo, e procurei seu braço, novamente tentando fazê-lo me preencher.
Foi aí que eu percebi que ele tinha pego um tubo de desodorante.
"Hmmmmmmmmm", murmurei longamente, a boca cheia e os lábios fendidos pela pica de Fernando, num protesto sem nenhuma convicção, imaginando que ia ser submetida a mais um ato sexual que meninas de minha idade não fazem e que por isso mesmo novamente iria descobrir um prazer que garotinhas da minha idade não sentem. O pau de meu irmão na boca, minha cabeça indo e voltando puxada pelos cabelos e aquele tubo de desodorante prestes a me invadir, prestes a ocupar o vazio deixado pela tora que me levara ao paraíso.
O tubo era mais fino, mas também mais duro e frio. Entrou de uma única vez, com suas paredes plásticas lisas e escorregadias, com pouco atrito, face ao alargamento de meu cuzinho e à melação toda que o lubrificara. Estava longe de ser confortável quanto carne, mas eu podia senti-la na boca enquanto estava preenchida atrás. Eu acabara de ser enrabada, estava chupando um pau e ainda tinha um consolo no cuzinho. Tudo isso com meu irmão. E ainda era virgem.
Comecei novamente a me contorcer e a chupar com mais volúpia e vontade. Meu irmão não resistiu muito. Mais tarde ele passaria a gozar mais rápido, diria que naquele dia estava nervoso demais para chegar logo ao orgasmo. De qualquer forma, senti pela primeira vez o caldo viscoso e amargo do homem em minha boca, seus jatos que me provocavam ainda mais. Levei a mão até o tubo de desodorante firmemente fincado entre minhas nádegas e bombei um pouco para acompanhar o gozo de Fernando. Engoli tudo. Nem me passou pela cabeça não fazer aquilo, por mais que o sabor não tivesse me agradado, bastante diferente do delicioso salgado do fluido lubrificante anterior.
Paramos um pouco. Esticamos e nos relaxamos na cama. Tanta excitação havia exaurido nossas forças e agora éramos folhas ao vento. Chuva secando. Foi então que Fernando falou, "vem, Camila, estamos todos melados. Vamos tomar banho". Eu repliquei que queria ficar mais um pouco ali, que gostava dos cheiros, que gostava de tudo, mas meu irmão insistiu e me puxou para me deixar de pé. E, quando ele conseguiu, eu entendi porque ele queria me levantar da cama. O primeiro passo que eu dei, o tubo de desodorante rolou em minha bunda e pressionou as paredes de meu cuzinho e me fez me apertar toda novamente.
A noite ainda ia ser longa e eu estava em minha cama, em meu quarto, com minha família, com a casa toda para mim e meu irmão. Ainda tínhamos todo o fim de semana para fazer ranger a cama dele, o sofá, a cama de nossos pais. Uns estalidos. Apenas isso tudo e começou a longa viagem de nós dois pelos proibidos e obscuros caminhos, segredos e mistérios do sexo. Eu seria enrabada ainda muitas e muitas vezes, com Fernando mantendo minha virgindade longa e torturantemente, até uma ocasião muito especial. A chegada de nossos primos, para passar uns dias durante as férias.
(Continua)
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