Certa vez meu primo veio me falar que as ciências humanas eram bobagem, não eram a mesma coisa que as leis naturais. Tentei explicar pra ele que o que chamamos de ciência é na verdade uma cria da filosofia - não entendo muito do assunto, mas uma criação ou do Aristóteles ou da dupla dinâmica Sócrates/Platão. Não existem "leis naturais". Não está escrito em nenhuma Constituição do Universo que a matéria é regida pela gravidade/eletromagnetismo/interação fraca/interação forte. O simples fato de que o Sol nasceu no leste nos últimos 4,5 bilhões de anos não garante que ele vá nascer amanhã no mesmo lugar, ou mesmo dar as caras. É apenas uma assunção nossa extrapolada hipoteticamente que tem se mostrado perfeitamente correta por todo o tempo da humanidade neste planeta solitário.
É claro que eu acredito que o Sol vai nascer - e no leste -, assim como acredito em Evolução. Minha postura não é anti-científica, mas anti-onipotência científica. Lógica é baseado em teoria dos conjuntos e, se não me engano, Bertrand Russell já mostrou os buracos da coisa (epa!). Ciência funciona maravilhosamente para explicar as coisas objetivas e tem a vantagem de ser altamente adaptativa e positivista, buscando corrigir seus erros e suas idéias equivocadas (atualmente mesmo existe um grupo revisionista de teorias "da moda", que argumenta que pensamos em teorias científicas furadas aceitas no passado - frenologia, o éter espacial - como reflexo de sua época, enquanto não temos o mesmo senso crítico quanto à nossa época - devemos nos indagar se aquilo em que acreditamos não é também reflexo de nossa cultura atual).
Mas estou tergiversando. Uma das consequências dessa postura das pessoas que pensam que existe a Constituição do Universo é às vezes sequer questionar porque existem essas leis naturais. Por que dois elétrons, um de cada lado do Universo, sempre se portam segundo um certo conjunto de regras? Duas maçãs da mesma árvore não têm o mesmo gosto, mas essas partículas subatômicas sempre se comportam da mesma maneira? Se essa padronagem é tão forte, por que então o Cosmo não é igual de uma ponta a outra? Pela Segunda Lei da Termodinâmica, a da entropia, a tendência da energia (e, por conseguinte, da matéria, que é energia concentrada) é se desorganizar e, no fim dos tempos, tudo que restará será um enorme nada homogêneo e frio, após as quatro forças fundamentais desmontarem a integralidade do que existe.
Então, em algum momento, alguma coisa introduziu a aleatoriedade. Em algum instante, a gravidade foi mais forte de um lado, o Big Bang empurrou mais pra esquerda, a partícula tal correu mais rápido do que a gêmea dela... só por convenção, chamemos a esse momento randômico, esse momento criador, de "Deus". Seria uma ironia, já que a maioria dos mitos da criação, inclusive o dos gregos, atribui à força criadora inicial a ordenação do caos. Na verdade, teria sido o contrário - Deus introduziu o caos na ordem e daí surgiu o Universo, em vez da massa pastosa e morna de quarks distribuídos homogeneamente pelo espaço - se é que haveria um espaço.
Quem trabalha com computadores tem idéia disso - sabe o quanto é difícil fazer uma CPU gerar números realmente aleatórios. Mesmo os seres humanos também são incapazes disso, porque acabam sempre caindo numa certa padronagem. Na época do TK 85, um micro rudimentar dos anos 80 com 16 kilobytes (isso mesmo, KILObytes) de memória, eu tinha um programinha em que havia quatro pistas. Você escolhia uma para atirar sua bolinha e o computador, outra, tentando adivinhar. Depois de um certo número de jogadas, a máquina começava a acertar quase todas, porque conseguia descobrir seu padrão.
Nem nós conseguimos ser totalmente casuais e imprevisíveis. Porque esta é a verdadeira face de Deus - a imprevisibilidade. A Ordem e o Caos sempre foi uma das dicotomias básicas da filosofia, mas pouca gente percebe que o divino é o acaso.
março 16, 2009
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