Essa daí foi a primeira tevê transistorizada do Brasil. Lembro dos anúncios de página inteira no jornal anunciando "inteiramente transistorizada", com um "splash" mostrando o tal do transístor - pra mim parecia um banquinho de cozinha. Ela era minúscula, uma tela de 10 polegadas (ou 12, não medi) e quase nada em volta - na época os televisores eram cercados por um enorme chassis cheio de válvulas. Na minha postagem sobre televisões pleistocenas um guia pra compra explicava que o comprador de um desses avançadíssimos e excitantes aparelhos que trariam o mundo para sua casa precisava levar em consideração os custos de manutenção: devido à sua tremenda complexidade, elas teriam mais afinidades com os intrincadíssimos radares militares do que com rádios, com os quais qualquer entusiasta de eletrônica caseira poderia lidar. Elas chegavam a ter 17 válvulas!!!!
Frente e Verso
O comercial de tevê enfatizava a portabilidade da traquitana: um sujeito, no meio do nada, saltava do carro e assistia a um jogo de futebol, gritando goooooool feito um louco, sozinho no meio de uma imensa planície. O carro era porque as baterias de níquel-cádmio ainda eram um distante sonho, monitores de cristal líquido uma utopia e o voraz tubo de imagem dela precisava ser alimentado pelo menos por uma bateria de automóvel.
Um design modernista clássico, típico dos anos 70. Não era com certeza aquela década de 50 ou 60 dos seus pais...
E essa tevê também foi muito importante culturalmente. O final dos anos 60, começo dos anos 70 foi a época em que o aparelho realmente tornou-se onipresente na classe média, incluindo a baixa. Meus pais compraram sua primeira quando eu tinha cerca de 1 ano. Quando eu tinha uns 7 o preço baixo advindo da tecnologia do transistor - bem como o pequeno tamanho mesmo - tornou viável a compra de um SEGUNDO televisor, por vários motivos: o monstrengo usado que minha família tinha vivia queimando válvula e precisávamos ficar dias sem ela normalmente, a Philco podia funcionar como substituta; e as emissoras tornaram-se modernas e competentes o suficiente pra apresentarem programas concurrentes com qualidade suficiente para rachar os lares - eu quero ver isso, eu quero ver aquilo! - numa época sem as reprises dos canais por assinatura e vídeo-cassete. A Amazonas foi não somente a primeira televisão de muita gente graças a seu baixo custo, como também inaugurou nos lares não tão abastados assim o hábito da "segunda tevê".
A tela nem um pouco plana tornava difícil ver alguma coisa nela um pouco mais de lado...
Com a televisão colorida lançada logo depois, em pouco tempo as tevês em preto e branco estariam relegadas aos quartos das crianças e até das empregadas. A Philco Amazonas foi demovida a terceiro aparelho da casa pouco depois e a nossa terminou seus dias sendo dada prum parente que estava internado num hospital. Já nessa época tínhamos o clássico tevezão colorido, mais uma monocromática pra cada filho - a minha era uma Telefunken que tinha um chassis bem maior do que a Amazonas e não era portátil - embora eu nunca tenha me aproveitado da portabilidade da bichinha a não ser em 1982, quando a levei pra faculdade pra assistirmos a alguns jogos no CA. E vou te contar - de portátil aquele troço não tinha nada, vai carregar ela até o ponto de ônibus...
Os botões low tech analógicos costumavam quebrar com facilidade - principalmente o seletor de canais, que tinha uma trava de mola. Os botões de vertical e horizontal ficavam atrás, pra manter o visual limpo. Quem tem menos de 30 anos não deve fazer a menor idéia do que estou falando, "vertical" ou "horizontal". Pois imaginem então que o anel em volta do seletor era para a "sintonia fina"
Não sendo valvulada, a Philco Amazonas era extremamente mais robusta do que suas congêneres contemporâneas. Mesmo as primeiras tevês coloridas (a nossa foi uma Colorado RQ - Reserva de Qualidade. Minha mãe um dia deu um ataque de consumismo e levou meu pai numa terça - as lojas de Copacabana fechavam mais tarde nas terças e sextas - pra comprar uma. Ele se endividou todo pra isso, coitado. Pra aumentar a nostalgia, compramos a bichona no Rei da Voz) ainda eram eivadas do que os maus tradutores de hoje chamam de "tubo de vácuo". Um tributo à sua durabilidade foi que a última vez em que a vi foi no meio dos anos 90, em Iriri, no ES, mais de 20 anos depois de encerrada sua produção, numa barraca que vendia batidas, ligada a uma bateria de carro. Na época já era difícil ver televisores monocromáticos e aparelhos dos anos 70 nem de longe tinham a resistência a quebras que os simples chassis das máquinas de hoje apresentam. Valente, democrática e lendária, a Philco Amazonas marcou seu lugar no imaginário da minha geração.
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