novembro 09, 2008

R. E. M. na Arena Multiuso

Suzy assiste ao REM

Foi a primeira vez em que tanto eu quanto o REM pusemos os pés na arena multiuso que inauguraram para o Pan. Uma espécie de Maracanãzinho mais civilizado, mais primeiro mundo, como o pessoal gosta de falar, limpo, iluminado, organizado e até dispondo de camarotes para pessoas obesas (vou fazer uma dieta), o que logo de cara deixa as estrelas internacionais que porventura vierem tocar aqui sabendo que no governo Lula o brasileiro começou a comer!

Vou começar uma dieta

Não havia fila na bilheteria para trocar os vouchers que se compra na Internet por ingresso. Não havia tumulto na entrada. Não havia fila sequer no caixa pra comprar cerveja e cachorro-quente. Não havia fila no bar. Não havia fila no banheiro. Ajudava em boa parte também que a média de idade do público estivesse mais próxima dos trinta do que dos vinte anos. A duzentas pratas por cabeça (cem se você tivesse ou falsificasse uma carteirinha de estudante – que saudade dos tempos em que nós, formados, podíamos pagar preços razoáveis por shows porque não havia essa derrama de meia-entradas) a arena estava cheia, embora longe de lotada. E foi assim, nesse clima de civilização, que o R. E. M. entrou para dar seu espetáculo.

A civilizada Arena Multiuso

A primeira impressão que a banda passou foi a de envelhecimento. O REM chegou na última era de dominância do rock já no segundo tempo, pouco antes da prorrogação que o Nirvana promoveu, daí sempre se pensar nela como uma banda “nova”. Mas é apena mais uma prova de como nossas percepções e nosso cérebro podem se enganar perfeitamente. Com exceção do Michael Stipe, os roqueiros estavam com uma aparência de Pink Floyd nos anos 90. O Stipe nem tanto, já que é magro e sempre foi careca, mas também apresentava algumas rugas e gordurinhas que o deixaram com uma cara de primo sensível do Henry Fonda (ou talvez eu esteja vendo bangue-bangues demais ultimamente). Aliás, por falar em primo sensível, há coisa de um mês, quase como para se promover o show, ele assumiu sua homossexualidade numa entrevista. Uau. Um gesto tão surpreendente e inesperado quanto, sei lá, Artur Xexéo fazer uma coisa dessas (1).

O primo carioca do Michael Stipe viu o show ao lado da Suzy

Como colaboradores da Zé Pereira são uma raça à parte, capaz de se reconhecerem de longe, eu e Suzy batemos logo no início da apresentação no Arnaldo Branco, que desta vez não estava a desenhar bonequinhos, apesar da facilidade que seria retratar Michael Stipe, mesmo com bonecos de pauzinhos. O show começou e, mantendo o clima de civilização a platéia empolgou-se comportadamente, dando umas leves sacudidas nas músicas dançantes mas não suingadas da banda. O próprio vocalista e superstar do grupo também estava comportado, não mostrando sinais de estar completamente bêbado como no Rock in Rio oito anos atrás, quando passou boa parte do espetáculo tomando (e elogiando) doses e doses de caipirinha.

Arnaldo Branco brinca com a perspectiva da lente grande angular

Mas um público de mais de 50 mil pessoas e um público de umas mil pessoas são multidões diferentes. A primeira vez em que a platéia realmente se animou foi em “Imitation of life”, mas a empolgação só durou um pouco antes de todos voltarem a se balançar polidamente, preocupados em não incomodar o vizinho. O REM estava animado, mãos se levantavam e palmas eram batidas durante algum tempo, mas nada que rompesse o tênue limite entre o “show muito bom” e “show inesquecível”.

Talvez não ajudasse também que, além da completa ausência do típico cheiro de concerto de rock, como diria a Marge, não fosse permitido sequer o consumo de cigarros caretas pelos pagantes. O blogueiro presenciou uma cena inesperada – meninas fumando escondidas na porta do banheiro – em espetáculos desse tipo e, embora tenha abandonado o tabagismo há dez anos, nada tem contra o cigarro e não acredita que duas horas numa arena esfumaçada pudesse realmente comprometer sua saúde, numa metrópole regida por automóveis, mas de repente foi exigência do Michael Stipe, vai saber.

Depois da primeira parte do show com as canções novas, a banda adentrou o hit list e mandou ver bastante no repertório de “Monster”. Oito anos atrás, no Rock in Rio, o blogueiro passou a apresentação inteira deles berrando “let me in”, ao que o valente editor desta revista-saite, Zé José, sempre replicava, “esquece, eles NUNCA vão tocar “let me in”. Para contradizê-lo, Stipe juntou os músicos num cantinho num momento intimista e cantou a agoniada música (veja o clipe) em versão acústica, antes de detonar geral com Os Maiores Sucessos do REM (só ficou faltando “Shiny Happy People”). A galera finalmente começou a dançar pra valer com “It´s the end of the world as we know it”, mas a idade e o ritmo extenuante pesaram e em dois minutos já estavam se balançando cordialmente outra vez.


Apesar das assertivas de Zé José, eles TOCARAM "Let me in"

Daí eles foram embora, voltaram para dizer que adoravam o Rio, Michael Stipe, na falta de caipirinha, elogiou a Itaipava que tomava de uma latinha (ai!), e inverteram a ordem lógica, tocando primeiro “Losing my religion” e fechando com “Man on the moon”. Depois foi pegar o carro e 15 minutos de engarrafamento porque, apesar da multiplicidade de pistas disponíveis na Avenida Embaixador Abelardo Bueno, a saída do estacionamento se dá por uma ruazinha de mão-dupla que só dá passagem para um automotor por vez. Obviamente a galera invadiu a mão contrária e complicou tudo ainda mais quando um sujeito provavelmente indo pra casa tentou seguir a lei e andar no sentido correto contra a corrente.

Foi praticamente o único momento terceiro mundo do show. O que foi uma pena, já que faltou aquela animação tipicamente brasileira pra consagrar uma excelente apresentação. A continuar assim, vamos começar a parecer aquele povo que assiste White Stripes em teatro italiano, sentadinho na cadeira. Aliás, o Vivo Rio já está fazendo isso, botando mesa perto do palco e a pista láááá atrás. É. Vamos sentir falta do subdesenvolvimento. Culpa do Lula.

(1) O blogueiro sempre achou bastante típica a música “To the one I love”, com seu refrão que traduzido seria “Esta é dedicada à PESSOA que eu amo”.

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