novembro 26, 2006

666 -Os Microcontos

A revista americana WIRED convidou um monte de escritores de ficção científica, fantasia, quadrinhos e afins prum desafio de concisão: escrever contos de seis palavras. Você pode lê-los em www.melhoresdomundo.net/arquivos/004434.php ou http://wired.com/wired/archive/14.11/sixwords_pr.html

A maior parte deles são ditos espirituosos, piadinhas e afins, mas alguns realmente conseguiram escrever verdadeiros CONTOS de seis palavras, como Frank Miller (pra quem não sabe, o autor de CAVALEIRO DAS TREVAS e 300 DE ESPARTA), que criou uma bela história "noir" de sexo, romance e violência ("com mãos ensanguentadas eu dou-lhe adeus"). Ben Bova (que não faço a mínima idéia de quem seja) montou um épico religioso ("Para salvar a humanidade, ele morreu novamente" - em inglês isso cabe em meia dúzia de vocábulos). David Brin fez um épico sobre viagens no tempo ("O Vingador do tempo estava errado! Não fui eu..."). Aliás, curiosamente, Alan Moore (V de Vingança, Watchmen) e Darren Arronofsky (Réquim para um sonho, Pi) tiveram a mesma idéia sobre paradoxos temporais ("do tempo. Inesperadamente, inventei uma máquina", a versão de Moore, e "loop temporal! Socorro, estou preso num", a micro-historieta do cineasta). O genial autor fantástico Michael Moorcock (criador da impressionante saga ELRIC DE MELNIBONÉ) conseguiu concatenar uma verdadeira odisséia de história alternativa ("Que grande cantor Hitler em 1940!")

Obviamente fiquei tentado com a idéia também e escrevi os meus próprios microcontos, tentando me ater mais à idéia de realmente contar uma história em seis palavras (Não que não houvesse bons não-contos na antologia da Wired, como "Prazo estourando! Servem cinco palavras?"). Também lancei o desafio para alguns amigos, mas apenas a poeta (a maioria das mulheres odeia ser chamada de poetisa) Patrícia Evans (patevans.blogspot.com) e o filósofo Antônio Rogério da Silva (www.discursus.cjb.net) toparam. Eis aí os resultados:

EU, LUIZ HENRIQUES NETO:

Suas mãos, já mortas, arrastaram-me junto.

Ela fechou a porta.
E ficou.

Confesso! Fui eu!
Não aguentava mais!

Seus muros, inviolados, defendiam apenas morte.

- M-me... ensssina-ram... a... and-d-dar... na l-linha.

Ele sobrevivera.
Toda a humanidade pagaria.

Pode divulgar minha confissão agora, padre.

Gás.
Ridículo.
Como morrer numa sauna.

Vi-a uma única vez.
Décadas atrás.

Adeus, minha adorada.
Adeus, meus inimigos.

O presente esmagou, impiedosamente, o futuro.

Aventava pessoas naquela mui estranha tempestade.

O copo!!!!
Era o copo errado!!!!

Mas seria o Benedito?
E era!

Enfim livres.
Porém nus.

Só.
Afogada num mar de cabeças.

O zumbi sorriu.
O lobisomem chegara.

Prometo sempre dizer-lhe adeus, meu amor.

As plantas todas estavam mortas.
Sortudas.

Não ouvia seu coração.
Assim morreu.

Peças - e sexos! - encaixando com precisão.

- Filho, prometa que nunca se apaixonará!

Acendi um derradeiro cigarro e apaguei.

Nasci, cresci, envelheci... mas jamais morrerei!!!!!!!!


OS MICROCONTOS DE PATRÍCIA EVANS (patevans.blogspot.com):


Desta vez preferiu matar a morrer.

Com olhos cada vez mais parecidos.

Um conto inteiro - início, meio, início.

Se alguém gritasse em mim... Ecoaria.
Por amor negado desespera, assassina, chora.

Jogou aquilo fora, foi ser feliz.
Eu te amo, tenho esse direito!

E entregou-lhe a rosa morta.

Como foi o princípio, o fim.

Filetes rubros em vez de olhos.

Desatento, permanece sempre a me deixar.

Costurou o último orifício - lacrou-a.

Aliás, nenhum trem virá de Londres.

Aqueles meus olhos serenos, nunca mais.

Que os mortos possam perdoar-me.
Pois só assim a espécie perpetuaria.

Voltaram ao normal, porque eu rezei.

Tarde para dizer que estava errado.

Poderiam finalmente sentirem-se aliviados.

E preservou-a com sua saliva.
Mas aquilo, como isto, também passaria.

Mas não deitou, dormiu em pé.

Feito caem as tardes sem romance.

Eternidade!!!!!!!! Eu sou a eternidade agora!

E eu me lembro que ri.

Restou-lhe oferecer ao diabo solidariedade.


OS MICROCONTOS DE PATRÍCIA EVANS E LUIZ HENRIQUES:

E, esquálida, a mão trancou a porteira.

Restava-lhe apenas oferecer às formigas solidariedade.

Lembro-me que ri. Pela última vez.


OS MICROCONTOS DE ANTÔNIO ROGÉRIO DA SILVA (www.discursus.cjb.net)

Caro Urubu,
Eis seis palavras sobre:

1) História espartana, "Voltar com escudo ou sobre este";

2) Os Waltons, "Contou até seis e virou escritor";

3) Teoria econômica, "Almoço grátis lhe valeu um Nobel";

4) Fracasso filosófico, "Nasce Hipácia, humana mortal: silogismo trágico";

5) Big Bang, "Entre clarão e escuridão, o universo";

6) RIP, "Na lápide lisa, uma vida apagada";

Um abraço,
Antônio Rogério da Silva

Alguma sugestão sua?

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