dezembro 25, 2006

A Blitzkrieg Alemã - Parte II

A primeira parte deste artigo está aqui, em uma nova janela.

Quando paramos, na primeira guerra mundial, o combate havia se tornado um impasse. Com trincheiras escavadas em profundidade, rolos e rolos de arame farpado, metralhadoras e canhões de tiro rápido dominando a "terra de ninguém" - o espaço entre as duas linhas de combatentes -, a ordem de atacar havia se tornado uma sentença de morte. O sujeito levantava correndo, porque descobriram logo nos primeiros meses de hostilidades que caminhar ombro-a-ombro e lentamente era bom para armar uma parada em 7 de setembro, mas não para avançar sobre o inimigo, e tentava chegar vivo do outro lado, para aí sair na mão com os defensores.

E quando eu digo sair na mão era sair na mão mesmo, armado de baioneta e valendo chute e beliscão. O fuzil pesava cinco quilos carregado e era de ferrolho - aquele que a gente vê nos filmes, que o sujeito dá um tiro e tem que puxar uma alavanca para trás e para o lado para rearmar - medindo ainda quase um metro. Manipular com destreza esse desajeitado troço dentro de uma trincheira estreita, com inamistosos soldados tentando fazer daquele o dia em que você se chamaria saudade, era quase impossível. Os infantes logo começaram a preferir a pá à baioneta, por ter um cabo que aumentava o impacto cortante do "fio" e o equilíbrio, quando usado como porrete. E, depois disso tudo, se finalmente conquistavam a posição, logo descobriam que ela era quase indefensável - as defesas eram feitas para enfrentar um inimigo vindo pela frente, não um contra-ataque por trás, onde não havia parapeito e os obstáculos eram mais baixos, já pensados exatamente para facilitar uma retomada vinda da retaguarda.

O conceito que os alemães desenvolveram então foi o da "infiltração". Os melhores soldados de todo o exército eram juntados em unidades de elite, encarregadas do trabalho duro, formando as "tropas-trovão", os famigerados "sturmtruppen" (em inglês, stormtrooper, sim, exatamente, aquelas mesmas de Star Wars). Eles, na falta de uma metralhadora portátil, iam para o ataque carregados de granadas de mão para o combate aproximado, sem terem instruções táticas exatas. Iam na base do improviso e por isso só a nata dos infantes se prestava a este papel.

Esses soldados de elite partiam para a frente, tomavam a primeira trincheira e seguiam adiante. Dispensavam longas preparações de artilharia. Preferiam-nas curtas e intensas, para atordoar os defensores, não lhes dar tempo de preparar a defesa e não esburacar o terreno que teriam que atravessar. Eles tinham preferência pela infiltração, em vez da tomada de toda a linha. Uma vez aberta uma brecha, mais e mais atacantes passavam por ali e partiam para a retaguarda, causando confusão onde se orquestrava o contra-ataque e mantendo os inimigos fora de equilíbrio. Os aliados, pelo contrário, quando atacavam, faziam-no ao longo de toda a fronteira. Se um ponto forte segurasse os atacantes, eles desviavam toda a pressão do ataque para lá. A idéia era empurrar o exército adversário como se fora uma motoniveladora. Os alemães atacavam como cupins, cavando cada vez mais buracos onde surgisse a oportunidade, até que toda a frente desmoronasse. Não preciso dizer qual tática era a mais eficaz.

A infiltração foi a chave do grande sucesso inicial da campanha da primavera em 1918, a Ofensiva da Paz (porque se julgava que levaria os aliados a pedirem a paz). Ao contrário da segunda guerra mundial, ainda seis meses antes do fim do conflito os alemães estavam de posse da bola e levantando bola alta toda hora na área dos inimigos. Os diplomatas teutões chegaram mesmo a rascunhar os termos em que aceitariam a rendição dos anglo-franco-estadunidenses (e amigos), carregando em cláusulas muito mais abusivas do que as depois impostas a eles em Versalhes, aquelas mesmas cuja brutalidade eles usariam como desculpa para tentar conquistar o mundo de novo em 1939. Mas eles estavam pondo o carro adiante dos stormtroopers, que não conseguiram manter o ímpeto e, depois de avançar uma quantidade inédita de quilômetros na Frente Ocidental, tiveram que começar a recuar.

As razões eram muitas. A nova tática cobrava alto número de baixas entre os infiltradores e, como eles eram soldados de elite, não eram fáceis de se substituir. À medida em que eles avançavam rumo à retaguarda, perdiam contacto com sua artilharia (rádios eram aparelhos canhestros e pesados, incompatíveis com o movimento, exceto em transatlânticos que batiam em icebergs e assemelhados) e ficavam dependendo apenas de seus fuzis e do que sobrara das granadas de mão para continuar o avanço, fundamental para manter o inimigo desequilibrado e sem condições de montar um contra-ataque. Este, uma vez iniciado, quase sempre era bem-sucedido: os ninhos de metralhadoras estavam voltados para o outro lado; as trincheiras eram mais baixas por trás e melhores alvos para os canhões, que mais se concentravam quanto mais longe da frente; a falta de comunicação impedia o reforço pelas reservas onde elas eram mais necessárias. Em suma, a idéia era boa, mas faltava alguma coisa. Uma coisa que fosse bem armada, de preferência com sua própria artilharia, que conseguisse manter um avanço contínuo por um longo tempo sem se cansar e em grande velocidade e profundidade e que carregasse sua própria parede grande de trincheira para não ficar exposta ao fogo inimigo. Essa coisa já existia, mas do lado dos aliados. Chamava-se "tanque". E a guerra contemporânea - pelo menos quando travada convencionalmente - é completamente concebida em torno dele. Veremos o porquê no terceiro capítulo.
- Sir Paul McCartney, por que o senhor se casou com uma puta perneta?
- Porque somando com as minhas três pernas a gente ficava na média. Aaaaah, eu sou foda!
As horas das luas cheias e as marés no sangue, a melhor época para se matar alguém, a melhor época para se engravidar alguém, o tempo do suor secando na roupa, as ruas cobertas de chuva e pó, os pés se afogando nos rios lamacentos de postes e motores, os cupins no chão longe das asas, a época dos melhores vinhos, da malha de algodão caindo no tapete, o mar tão morno que nem refresca e o vento trazendo a areia contra os olhos, a hora dos lábios untados de saliva e o cheiro, o cheiro de grama molhada, o começo dos pingos grossos, desabando sobre os braços e os cabelos, quanto pano descobrimos que vestimos, a terra esbraveja com as nuvens e o céu olha por nós, caminhantes homeotermos nas noites cheias de folhas, são os tempos férteis chegando, os tempos férteis estão de volta, soltem as crianças e ponham os vasos na janela, são os tempos férteis, os tempos férteis chegando, os tempos férteis estão voltando.

dezembro 22, 2006

Do roteiro de "Ódio Cego"

Aline:

Porra, você passa anos e anos sem falar comigo pra vir falar isso!!!!! Quem você pensa que é? Você não foi nada pra mim! Nem o primeiro e nem o último! Será que isso já te passou algum dia pela tua cabeça, que importante não é o primeiro, é o último? Aquele que vai segurar minha mão enquanto eu estiver morrendo??? Aquele que vai sentir minha mão fria e esfriando mais e eu nem vou sentir a dele, só vou saber que tô segurando porque vou olhar pra lé. Importante vai ser aquele pra quem eu vou olhar pela última vez, antes de nunca mais ter luz pros meus olhos, o som morrendo, a luz apagando e um último, um último rosto tentando me confortar enquanto meus olhos vão escurecendo e aquela imagem, aquela cara se apagando lentamente à medida em que o meu cérebro vai morrendo sem oxigênio, à medida em que a escuridão vai engolfando tudo e no centro, no centro uma última luzinha, uma última piscada, o meu último pensamento, um rosto, um rosto se apagando, eu nem lembro mais do meu nome, nem lembro mais o que é aquele rosto, mas vai ser a última coisa que vou pensar, antes de não me importar com mais nada, antes de finalmente nunca, nunca mais ter medo da morte! Isso é importante! O último, não o primeiro!!!!

dezembro 17, 2006

A Eternidade em um Beijo

Este é o projeto de um romance, baseado em alguns contos e roteiros. O começo seria assim:

Foi uma época em que o tempo perdeu a continuidade. Os empregados e seus trabalhos repetitivos vendo o relógio que não andava, as pessoas sempre andando na calçada sem chegarem a lugar nenhum (mesmo porque quando chegavam os lugares já tinham mudado e não eram mais aqueles aonde eles queriam ir) e fazendo planos inúteis para o futuro porque subitamente ele era o presente. As pessoas morriam antes de nascer e a comida saltava do prato no meio da refeição. Os jovens sabiam mais do que os velhos e estes não podiam nem mais viver em suas lembranças, pois como saber se elas realmente existiam? Os artistas tinham o fim mas não o começo e outros o início, mas não o final e todas as histórias eram um longo meio. Não havia mais um tempo de nascer nem outro de morrer, um de semear ou outro de colher, as coisas ruíam, o centro não conseguia segurar. A Terra podia parar em seu giro. Então decidiram que tudo devia estar acontecendo sempre. Alguém decidiu e fez as Leis que, no estado das coisas, começaram a ser cumpridas antes de serem decretadas. Para evitar que as pessoas ficassem presas sempre no mesmo momento e para que a vida e o trabalho pudessem progredir e ter algum significado, ninguém podia fazer sempre a mesma coisa. O patrão hoje era o faxineiro amanhã, o lavador de carros virava o motorista, depois o dono do carro, depois metalúrgico. O economista virava arqueólgo e o historiador virava paleontólogo. Os mandatos dos políticos eram de apenas um dia e isso aumentou muito o número de escândalos, mas ninguém ligava muito porque os acontecimentos eram muito vertiginosos. Muitos comemoraram porque era o fim da rotina, mas aos poucos foram percebendo que a variedade também era rotineira e que não podiam parar nem quando encontravam finalmente aquilo que sempre haviam sonhado. Era terminantemente proibido se repetir e só pensar nisso já era perigoso porque a polícia podia chegar antes do crime ser cometido e ninguém nunca sabia quanto da vida ia perder na prisão, ou mesmo se a prisão ainda existiria enquanto cumpriam pena, porque os lugares, também eles viviam sob o tempo e nunca se sabia se sua casa ainda seria a sua casa quando lá se chegasse, então todo mundo dormia no lugar que encontrava e acabou todo mundo se acostumando a viver com todo mundo, era uma aldeia global, o importante e o principal era se manter em movimento ou o mundo parava, e a raça humana não podia estagnar pois podia morrer em vida. Ninguém podia se repetir, nada podia se repetir, tudo isso era violentamente reprimido e vigiado. E como as pessoas sempre repetem os mesmos erros quando se trata de amor, então ninguém podia - de jeito nenhum, porque uma vez só já é arriscado - se apaixonar mais do que uma vez na vida.

Depois, tirado de um roteiro sobre o tema, corta para o protagonista - que foi preso por tentar voltar para sua amada - está sendo julgado por uma comissão de liberdade condicional:

conselheiro 1: E o amor?

conselheiro 2: Você ainda guarda sentimentos por Ana?

o homem pensa um pouco, está nervoso.

Renato: Guardar?

conselheiro 2: (ALGO ENFASTIADO) Sim, guarda, ainda guarda sentimentos por ela?

Renato: Sentimentos por Ana? Guardar? Não. Não guardo. Por que guardaria? Já não nos vemos há tanto tempo... (PÁRA UM POUCO PARA PENSAR) Eu acho. Eu não sei. Quanto tempo será que já faz? Difícil dizer. Parece que foi ontem. Talvez tenha sido ontem. Não me lembro quando foi. Mas lembro que pareceu muito. Uma eternidade. Um tempo enorme. Muito maior do que todo aquele antes de eu a ter. Muito maior do que o que que se passou desde então. Por mais que os dias se arrastem. Por mais que eles pareçam monótonos. Por mais que pareçam não trazer razão ou motivos na hora de acordar. Por mais que os ponteiros do relógio repitam-se mais e mais na mesma posição, em cada hora de cada dia desde que nos separamos, ainda assim, ainda assim o tempo que passamos juntos foi maior e mais amplo, bem maior e mais amplo do que possa vir a ser qualquer dos mais longos dias que eu venho enfrentando sem ela. Guardar sentimentos por ela? Por que os faria? Tantos anos vivi sem sentir algo assim, tantos anos eu tentei sentir algo assim, me agarrando a mulheres por causa de seus rostos, seus seios, suas pernas, suas costas, sua maneira abusada de pedir uma cerveja ou sua graça em recusar uma, seu sorriso pacificador ou sua gargalhada agressiva, seu olhar profundo e sereno ou sensual e direto, tantas por tantas razões menos a certa, menos aquela que eu queria ter, sentir em mim, sentir nela, e tanto eu fiz, tanto eu me fiz fazer, tanto eu me iludi, chamando afeição de amor, obssessão de paixão e tesão de desejo, um homem se fazendo de menino para poder se sentir um homem de verdade e então veio Ana, finalmente descobri Ana, há tanto tempo, como nós podemos saber agora, se é que eu posso chamar o agora de agora, depois da Ana tudo foi só um depois, um longo depois, não, eu não guardo, não guardaria, jamais guardaria, como poderia eu fazer isso, com aquela sensação, o primeiro beijo com seu gosto de alucinação, miragem, ilusão, não pode estar acontecendo comigo, a primeira vez em que a vi nua, quando Deus criou você deitada nua na cama, ele sabia o que estava fazendo e criou o fogo, a água e as montanhas ao mesmo tempo, a primeira vez em que a senti por dentro, macia, morna e água, a vida toda vem da água, a vida toda vem de você, a vida toda vem de dentro de você, como guardar, jamais guardar, não há o que guardar, não se tem o que guardar, Ana foi o agora, Ana foi o então, o resto, o resto é só depois, o resto é só o que veio depois, o resto é silêncio (PAUSA). Não (PAUSA, MUDA O TOM). Não guardo nenhum sentimento por Ana.

detalhe de um lápis vermelho riscando alguma coisa. A câmera abre e revela finalmente que estamos numa prisão, ou melhor, numa comissão de exame de condicional que nem aquelas que vemos em filmes americanos, com os conselheiros de guarda-pó e óculos fazendo enormes riscos visivelmente desaprovadores em seus formulários e cochichando entre eles. Um deles se levanta.

conselheiro 1: Sr. Renato, na opinião do presidente desta Comissão de Avaliação, o senhor nada aprendeu no seu tempo de encarceramento sobre o que o trouxe a esta instituição e sobre os erros de seus atos. Minha decisão é de que o senhor deveria permanecer interno e sua condicional ser negada. Entretanto, como o senhor foi o último a ser ouvido hoje e sua exposição foi longa demais, meu relatório só será encaminhado amanhã, quando estarei já trabalhando em outra coisa e lugar e meu voto nada mais valerá. Portanto, não me darei ao trabalho de redigir um parecer contrário sobre seu caso. Boa sorte.

o presidente da comissão sai, tirando o guarda-pó e o óculos, exibindo uma roupa de, sei lá, bombeiro, couro sadomasoquista ou piloto de avião. Levanta-se outro conselheiro.

conselheiro 2: Sr. Renato, não houve evolução em seu quadro. O senhor está apegado a esta mulher. Demonstra falta de espírito. Falta de fibra. Falta de vontade de conhecer o amanhã que está sempre vindo. Veja como eu não tenho medo de encarar o futuro.

o conselheiro 2 arranca o guarda-pó, os óculos e pula através da janela. levanta-se O terceiro e último conselheiro.

conselheiro 3: Sr. Renato, na verdade eu queria mesmo era ser músico. Eu tinha uma banda emo. Há muito tempo. Eu acho. Quando começou. Eu acho. Eu concordo com o senhor. Eu acho. Inclusive eles dois não sabiam, mas parece que vai haver uma mudança de orientação, para valorizarmos mais os sentimentos. Eu acho. Acho que o senhor está liberado.

O protagonista procura sua amada, mas sem saber, enquanto ela está na mesma rua que ele, com outro homem, ele acaba ficando com outra menina:

fabíola: Você não é um garçom, é?

renato: Não. Eu estou esperando que uma mulher que eu conheci lá reapareça.

fabíola: Ninguém nunca reaparece. Tudo vai embora. Eu fiz um piercing no mamilo. Quer ver?

renato: Não, obrigado.

fabíola: Não fode. Tem gente que faria tudo pra dar uma trepadinha comigo e você não quer nem ver meu peitinho?

renato sorri.

renato: Deve ter mesmo um monte de gente interessada.

fabíola: Você não quer ser um deles?

renato: Eu já disse...

fabíola: Eu não lembro. Faz muito tempo.

fabíola beija renato de leve. Renato hesita.

fabíola: He. Não me diga que você também é tímido...

renato: Não. Eu só... eu já...

fabíola: Não se preocupa com a tua paixão. Amanhã a gente já se esqueceu. É tão difícil lembrar. Por isso que eu não consigo me formar em nada. Eu já fiz arquitetura, letras, comunicação, agora tô fazendo psicologia. Eu não consigo estudar, esqueço tudo que aprendi...

renato: Você tenta..?

fabíola: Tento. Faço piercings e tatuagens... pra lembrar.

ela começa a mostrar as tatuagens.

fabíola: Esta borboleta... é preu lembrar do meu primeiro namorado. Eu me sentia leve, flutuando... aí tem esta estrela... foi quando eu passei no vestibular pra arquitetura e comecei um estágio no primeiro período ainda. Eu achava que tinha estrela. Tem esta tribal. No estágio eu me apaixonei pelo Guilherme... a gente saía pra acampar e ficávamos andando nus pelas praias, pelo mato, pelas cachoeiras... que nem índio. E este arame farpado... uma penitência... o que eu tive que estudar quando quis mudar pra comunicação...

renato: E os piercings?

fabíola: É pra lembrar como isso tudo doeu... quando meu primeiro namorado terminou, fui mandada embora do estágio, o Guilherme terminou comigo, quando fui estuprada...

renato: Você foi estuprada?

fabíola: Fui. Pelo meu primeiro namorado. Depois que a gente terminou. Por isso que eu botei um piercing no mamilo. Tem outro na boceta também. Pra doer. Cada vez que eu transar. Vai doer, mas eu vou transar. Eu não vou parar, Renato. Não vou parar de amar, de trepar. E não vai ser porque eu esqueci.

renato olha para a menina com respeito, enquanto ela exibe o piercing com um pesinho pendurado no mamilo.

renato: Você também... "fala legal".

fabíola: É... mas eu esqueço tudo. Vou esquecer tudo depois. Não vai servir pra nada. Mas foi por isso que gostei de você.

os dois começam a se beijar. Eles se amam e no dia seguinte, pela manhã, ele a leva em casa:

fabíola: É aqui que eu moro.

renato: Bem, então você está segura...

fabíola: Com você, sempre.

renato fica constrangido.

renato: Bem, então se é isso...

fabíola: Adorei a noite. Adorei a trepada. Adorei você. Me dá um beijo de despedida.

renato: Eu...

fabíola: Não se preocupa. Ninguém nunca reaparece.

renato: Você não vai fazer nenhuma tatuagem?

fabíola: Não. Talvez um piercing.

renato: Por quê? Te fiz sofrer?

fabíola: A mulher que você ama me fez. Vem, dá o beijo.

os dois se beijam. Ela o solta e se encaminha para a portaria. Vira-se para trás antes de entrar no prédio e desaparece no ar. Renato olha, sem estranhar, sabe como o tempo é estranho no mundo. Ouve a risada dela por trás dele. Vira-se e vê uma fabíola aparentemente mais nova, porém com mais piercings.

fabíola: He. Você tem uma cara sólida. Robusta.

renato: Fabíola?

fabíola: E sabe meu nome. He. Se você fosse mais novo, podia até rolar um clima. Mas eu não curto homem tão velho. (PAUSA) Mas você tem um ar interessante. He. Tenho que ir.

renato fica observando a moça sair correndo para a faculdade. ela novamente desaparece em pleno ar.





, que vive muitas aventuras difíceis de serem resumidas aqui, enquanto ficamos sabendo de sua história de paixão. Durante tudo isso, o amigo mais velho e sábio do protagonista morre e ele procura um lugar onde enterrá-lo.

burocrata: Bem, eles montaram uma arquibancada num vale. Tem uma abertura entre as montanhas que parece enquadrar o pôr-do-Sol. E tem aquela mata, aqueles lagos e as cachoeiras. Dizem que a vista é lindíssima.

renato: Não era uma arquibancada?

burocrata: Pois é. A vista é tão bonita que puseram uma arquibancada lá. Pras pessoas. Elas vão lá e sentam e ficam olhando a vista e o pôr-do-Sol. Dizem que é maravilhoso.

renato: E o que tem isso a ver com cemitério? Eu quero um lugar digno para o meu amigo.

burocrata: Pois lá é um lugar muito bonito. E todo mundo é amigo. Dizem que rolam vinho e maconha uns entre os outros. E tocam violão. E ficam lá, observando o pôr-do-Sol. Só não tem comida.

renato: Não?

burocrata: Não. Eles ficam lá até morrer. Morrem vendo o pôr-do-Sol, de mãos dadas com os amantes, sentados ali, aquela luz vermelha maravilhosa caindo sobre eles. E o cheiro da mata molhada, o barulho da água da cachoeira. Dizem que é muito lindo lá. Eu não posso garantir, porque você só pode ir lá pra ficar pra sempre. Os degraus mais baixos dizem que já estão cheios de esqueletos. Acho que deixariam você botar o seu amigo lá.

E, depois que os amantes se reencontram. Ana tenta não ceder a Renato, mas acaba fazendo-o:

ana: Ana o caralho, seu filho da puta! Eu te odeio! Você e aqueles piercings! Mas principalmente você! Você e aquele seu amor envolvente, você e aquele teu jeito cativante, tua firmeza, mesmo quando em dúvida, mesmo quando não sabia o que fazer, mesmo quando fazendo o que não queria fazer e fazendo, que nem mocinho de cinema quando sem querer fica com o microfilme e os espiões correm atrás dele... eu te odeio, seu filho da puta... eu te odeio porque tenho uma vida tão equilibrada, ainda ontem fui promovida, porque eu sou equilibrada, e eu sou equilibrada por quê? Por tua causa, porque eu sabia, eu sabia que o que quer que eu fizesse eu ia te encontrar no bar do Janus, ia rir, ia te ter, uma coisa eu já tinha acertada na vida, o resto ia vir sozinho, mesmo depois que a gente terminou, ainda assim, eu sabia, eu sabia ainda que você me amava, por isso que eu pude amar tanto e tão bem, porque eu sabia que você me amava e que eu poderia ter você no fim... eu podia ser tranquila, calma, fria, racional sempre que eu amava... tão tranquila... eu estava só esperando você... aguardando você...

eles são obrigados a fugir porque os policiais descobrem que eles já se amaram antes. Fabíola, que estava dando um amasso na rua ali perto, ajuda-os:

ela pega um relógio de bolso no bolso da calça cargo de clubber e chega na frente dos policiais. Começa a sacudir o relógio em movimento pendular na frente dos policiais para hipnotizá-los.

fabíola: Olhem para este pêndulo! Vocês estão sob meu poder!

policial 1: Sai da frente, menina, ou você vai presa também!

fabíola: Olhem para o relógio!

policial 2: Saia da frente!

Os policiais se aproximam. Fabíola recua. O relógio não está funcionando. Ela tem uma idéia. Ela abaixa o decote e mostra as aréolas pefuradas com pequenos pesinhos. Ela balança o busto e os pêndulos nos mamilos começam a hipnotizar os policiais.

fabíola: Olhem para este pêndulo... (ELA OLHA PARA BAIXO) Digo, para estes pêndulos. Vocês estão sob meu poder...

os policiais param, com ar apalermado, olhando os belos peitos de fabíola.
policial 1: Nós estamos sob seu poder...

policial 2: Nós estamos sob seu poder...

fabíola vira-se para renato e ana.

fabíola: Vão! Eu não sou muito boa nisso! Eles não vão ficar assim muito tempo!

renato: Tudo bem, obrigado, valeu... (A ANA) Vamos, vamos embora daqui...

ana: Já? Mas você não vê que aqui é o nosso canto? Nosso lugar especial?

renato: Deixa de brincadeira, Ana...

ana olha com atenção para fabíola.

ana: Peraí... eu sei quem ela é.

renato: Eu não. Vamos, vamos embora!

os dois vão saindo.

ana: Eu sei sim... você está me escondendo algo.

renato responde com sinceridade, não lembrando mesmo de fabíola.

renato: Não, Ana, eu só quero esconder você dos policiais...

os dois saem. Fabíola olha para eles. manda um beijinho.

fabíola: Eu lembro... quem diria, eu lembro...
.

hannah/renato/policiais/mortos vivos

rua da distorção/ext/noite

a câmera passeia lentamente, lateralmente, por uma rua, ao rés do chão, mostrando caídos pela calçada e pela sarjeta pessoas em variados estados de decomposição, quase incapazes de se mover, abandonadas e entregues . ela vai andando e, ao chegar ao final, gira e mostra hannah e renato na esquina da rua. Hannah olha para trás e vê os policiais vindo.

hannah: Eles estão vindo.

renato: Sempre estão. Esse mundo não pára.

hannah: E o que vamos fazer? Eu não quero ir presa, Renato. Ainda mais agora que eu quero ficar com você...

renato: Vamos atravessar.

hannah: Mas aqui a distorção temporal é pior, Renato. E ainda tem todos esses mortos vivos aí...

renato: Cadaveras.

hannah: Como?

renato: Cadaveras. Cadáveres de verdade. Um trocadilho. Tem gente que os chama assim. Pessoas moribundas que vieram para cá na esperança de que a distorção temporal os congelaria em seus últimos instantes de vida e eles viveriam para sempre. Que maneira de conseguir...

hannah: Eu não quero entrar aí, Renato. Nós podemos sair como dois velhos moribundos. Ou nem chegar, voltar a ser protoplasma. Eu não vou entrar aí.

renato puxa hannah para perto, com força e dominaçào e lhe fala quase em tom de ordem.

renato: Vai sim, Hannah. Vai entrar porque haja o que houver, o tempo e sua passagem, alterados ou não, é um privilégio nosso. E a privação de liberdade não. Vamos entrar.

hannah: Eu não quero!

corte para plano geral deles, em contra-plongée. Renato empurra hannah um passo dentro da rua. Ela pula de volta para a esquina. Renato a olha, pega-a, levanta-a como se fosse uma noiva prestes a entrar no domicílio conjugal após o casamento e entra com ela na rua. Corte para os cadaveras olhando para eles com seus olhos apodrecidos. corte para renato pondo hannah no chão, em pv lateral e a câmera faz um traveling acompanhando suas caminhadas tensas.

hannah: Renato... eu estou com medo.

renato: É bom. Quer dizer que você preza sua vida.

hannah: Esse pessoal todo na calçada também...

renato: Não. Eles prezaram muito mais a própria morte em toda sua vida. Por isso vieram parar aqui. E os policiais?

hannah vira a cabeça e vê os policiais parados na esquina da rua, amontoados, como se houvesse uma parede invisível que lhes impedisse a progressão.

hannah: (COM VOZ DE CRIANÇA) Pararam. Num vêm não.

renato: (SURPRESO) Tudo bem com você, Hannah?

hannah: (INFANTIL) Tudo. Me dá a mão.

renato: O que você quiser, Hannah...

hannah: (COM VOZ ROUFENHA, DE VELHA) Não precisa de mais nada, meu Renato... só me dê sua mão. Me dê sua mão e aperte forte...

renato: Você está mudando, Hannah...

hannah: (NORMAL) Eu não. Você.

renato: (INFANTIL) Mentira. Vou chamar a mamãe.

hannah: Você sim, Renato. Uma hora é um velho e em outra, uma criança.

renato: (INFANTIL) Você que é, mentirosa!

hannah: Nós estamos mudando, Renato. Nós dois. Só que não conseguimos perceber. Só o outro.

renato: (NORMAL) Será?

Visão subjetiva de renato para os cadaveras.

renato: Como será então que parecemos a eles?

hannah: (ADOLESCENTE) Eles eu não sei, mas você é um gato... (PAUSA) Eu tô com tesão, Renato... esse pessoal sem poder fazer nada na rua e só a gente aqui...

renato: Nós temos que passar por isso, Hannah...

hannah: Ah, vem, pára só um pouquinho...

renato: Não na frente deles, Hannah, não na frente deles.

hannah: (ADOLESCENTE) Você não quer nada comigo?

renato: Eu quero tudo, Hannah. Tudo. Vem comigo.

hannah: Eu acho que quero um filho, Renato...

ao falar isso, hannah é puxada para fora de quadro por renato. vemos ao longe os policiais discutindo entre si. alguns deles apontam para outros lados, como sugerindo caminhos alternativos. Finalmente, eles chegam a um consenso e vão embora. hannah e renato continuam andando.

hannah: Renato... eu agora... acho que recuei... recuei demais.

renato: Demais?

hannah: É. Parece outra vida... outra encarnação...

cena xxxii

quarto de dormir do começo do século

aninha/avó/médico/pai/mãe/tio/tia/primos/familiares

uma menina de uns nove, dez anos - aninha, a câmera começa nela para deixar bem claro que é esta a personificação de hannah na cena - está sendo levada, numa casa de relativa abastança do começo do século, para o quarto onde sua avó agoniza. O médico está conversando com a mãe. Enquanto hannah fala, aninha é levada a dar a mão à avó, enquanto familiares choram, primos menores parecem incapazes de compreender a solenidade do momento e brincam. a Avó olha para a jovem aninha e, com tremenda dificuldade, passa a mão pela sua cabeça e parece tossir violentamente. O médico toma o pulso, a mãe de aninha chora, consolada pelo pai e o médico, finalmente, cruza os braços dela e a pòe numa pose de repouso.

hannah: (OFF) O começo do século... Acho que é minha avó. Não existe UTI e ela está agonizando no quarto dela lá em casa. Está doente há meses e todos na casa estão acompanhando o lento caminhar dela para a morte. O médico falou que hoje ela termina o passeio por esta vida. Todos nós estamos ao lado dela. Todos nós vamos lhe dar adeus. Todos nós vamos cumprimentar a ceifadora. Todos nós a conhecemos desde cedo e sabemos que a é parte da família. Tão parte da família quanto nossa avó que viu várias mortes como essa no quarto de cima de sua casa. São apenas duas amigas se reencontrando. Duas senhoras... que fazem parte da família. Nada demais. Nada de extraordinário nisso. E eu sei. Eu estou ali. Estou ali olhando. E vendo.

cena xxxiii

esquina final da rua da distorção/ext/noite

hannah/renato

close em hannah.

renato: Abra os olhos, Hannah, pode ver aqui também.

Ela abre os olhos e a câmera abre, mostrando que eles atravessaram a rua.

renato: Chegamos ao fim da rua da distorção.

cena xxxiv

ladeira da casa de renato/ext/noite

renato/hannah

renato e hannah são vistos subindo a ladeira pavimentada com paralelepípedos e entrando no prédio onde renato mora, um bem antigo.

cena xxxv

sala da casa de renato/int/noite

renato/hannah

renato e hannah entram no apartamento de renato, cheio de objetos de diversas décadas. Estátuas art nouveau, astrolábio, globo, lampião, rádio anos trinta e assim por diante. os dois entram, hannah olha bem para o espetáculo e é abraçada por trás por renato. Os dois se beijam.

hannah: O que vamos fazer agora?

renato: Adivinha...

os dois se beijam mais ainda e com muito ardor e desabam no sofá, fora de quadro. a câmera segue até a janela, onde as cortinas esvoaçam e corta para a chama de um isqueiro se acendendo com força, uma pequena brincadeira com a velha lareira que se avivava quando os personagens trepavam nos filmes antigos. O isqueiro é para acender o cigarro de renato. Os dois estão suados, desgrenhados e sem roupa no tapete da sala. Hannah sobe lentamente, esfregando sua pele na pele do namorado até chegar perto dele.

hannah: Me dá um trago.

renato: Outro?

hannah: Do cigarro.

renato passa o cigarro para ela. Ela dá um trago longo, acendendo bem a brasa. Ele pega de volta e traga também, como que sorvendo o que ficou dela no filtro.

hannah: Eu perguntei o que íamos fazer não nesse sentido.

renato: E existe outro?

hannah: (DE BRINCADEIRA) Outro? Não... você foi o único, Renato.

renato: (TAMBÉM DE BRINCADEIRA) Mentira que eu tive que conhecer um monte de namorados seus pra te achar.

hannah: Você realmente me desejou, né?

renato: Aquela noite foi muito boa pra esquecer assim tão fácil. Pra deixar o tempo apagar tão sem resistência...

hannah: Mas o que vamos fazer agora que estamos juntos? Você sabe que eles vão acabar nos pegando, não é?

renato: Eles quem? A morte e os impostos? Sei há muito tempo. Eles pegam todo mundo.

hannah: Esses não. A polícia.

renato: Que tem eles? Nós os deixamos pra trás.

hannah: Mas eles vão chegar. Mais cedo ou mais tarde. Eles têm todo o tempo do mundo. Podem investigar durante todo o futuro e virem nos prender agora...

renato se levanta e caminha até o armário onde há uma coleção de discos. tira um vinil de dentro de uma capa.

hannah: Discos de vinil? Que coisa mais antiga...

renato: Deixe cada coisa a seu tempo, Hannah. Agora vamos dançar...

hannah: Dançar?

renato: Da melhor maneira possível. Sem roupa.

ele a pega e a tira para dançar, ao som de cheek to cheek.

hannah: E os policiais?

renato: Deixa eles. Deixa tudo pra lá. Agora só ouve a música.

close na vitrola. O disco está arranhado e começa a repetir o mesmo trecho da música - HEAVEN, i'M IN HEAVEN.

hannah: O disco está arranhado.

renato: Eu sei.

eles dançam mais um pouco.

hannah: Eu te amo, Renato.

renato: Eu sei.

hannah: Quero te amar para sempre, Renato. Para sempre.

renato: Não usa essa palavra, Hannah. Nada é para sempre.

OS DOIS CONTINUAM DANÇANDO E SE BEIJAM, EM PLANO GERAL, NA MEIA-LUZ.

Os policiais finalmente chegam e começam a tentar arrombar a porta:

De tanto apanhar a porta acaba cedendo e se entrega, frouxa em seus caixilhos e trôpega em sua tranca, revelando finalmente os aposentos por ela velados. O primeiro policial quase cai para a frente quando ela se abre, sob o impulso de seu violento movimento, mas ao ver a cena diante de si consegue parar a tempo, antes mesmo de pôr o pé adentro, e estica o braço até o portal, para impedir que seus companheiros sigam em frente, deixando os vizinhos e curiosos na ponta dos pés tentando divisar o que está lá dentro, afinal, que tanto preocupa os guardinhas.

- Nós os perdemos.

Uma vitrola, um velho toca-discos, com suas linhas ainda modernas e arrojadas, luta em vão contra os microssulcos de um vinil arranhado, repetindo sem parar um único verso de uma clássica canção americana, "Heaven, I´m in heaven... szzzcrrat... Heaven, I´m in heaven... szzzcrrat... Heaven, I´m in heaven... szzzcrrat... Heaven, I´m in heaven... szzzcrrat...". Aos seus pés, roupas atiradas pelo chão, calça, camisa, cueca, calça, camisa, sutiã, calcinha, seguindo pelo tapete até pés presos num passo de dança, pés parados sobre o carpete, a mesa de centro deslocada para abrir espaço, pés subindo por dois pares de pernas, um liso, macio e curvilíneo, entrelaçado a outro musculoso e peludo, mantendo pressionados e imóveis seus centros de prazer e identidade sexual, seus ventres, seus abdomes, seus peitos, os alabastrinos seios da moça apoiando-se e descansando suas suculentas formas contra o amplo tórax do homem, para aproximar as bocas, imobilizadas e coladas num beijo, lábio a lábio, língua a língua, com um pequeno gosto de dentes e saliva e faces, maciez e aspereza, barba e suavidade, macho e fêmea.

E os guardas mantiveram as pessoas afastadas e ficaram olhando, os vizinhos e curiosos ainda esticando os seus pescoços enquanto mulheres mais baixas e crianças perguntavam "e aí", "tá vendo alguma coisa", e o casal, os dois, a moça e seu par, permaneciam ali, parados, imobilizados, nus e alheios a todo o movimento, imóveis e inamovíveis, hermeticamente selados num beijo, para sempre, por um único momento, por um instante, por toda uma eternidade.

dezembro 04, 2006

Mais Pretensão - De uma Peça minha (FATA SUBURBAS0:

FATA
Aceitas sempre assim tranquilamente o que os outros lhe dizem?

PEDREIRO
( BRINCANDO ) Vindo de ossos falantes, sempre.

FATA
( RI, TODA CONTENTE ) Hi! Já troças de mim! Estamos íntimos!

PEDREIRO
Eu, íntimo teu? Nem sei o que você é, como uma mulher foi virar um osso dentro de uma pedra...

FATA
Como? Alguns dizem que há tempos fui aprisionada dentro de uma rocha usada na construção deste prédio. Outros dizem que me decepcionei com o mundo e encasulei-me em busca de tempos mais propícios. Contam também que sou uma metáfora da magia encerrada dentro de nós... outros tantos que sou um teste como a espada na pedra - aquele que me libertar será o rei de sua vida e seu destino. Há os que dizem que cada pedaço de matéria é um ovo chocando algo como eu. E os que propagam que eu seria a encarnação dos sonhos dos moradores daqui, absorvidos pela pedra noite após noite, sono após sono.

PEDREIRO
E qual é a verdade?

FATA
Certamente uma das versões que mencionei, pois se tantos não conseguiram descobri-la, certamente não seria eu a conseguir imaginá-la...

PEDREIRO
Mas você consegue saber até o que vai acontecer com a minha filha...

FATA
Mas o já acontecido não me interessa.

PEDREIRO
Se é o que você diz...( COMEÇA A QUEBRAR PEDRA ) Se importa?

FATA
Não, ao contrário, adoro ver-te trabalhando, sentir-te esculpindo...

PEDREIRO
Eu não sou escultor...

FATA
Só as nossas obras sabem de nós...


CORTA PARA A CENA FINAL:

FATA
Nada me aperta mais! Nada me tolhe mais! Meu peito inala e exala novamente! Meu coração bate! Eu estou livre outra vez! Ah, todos vós, eu estou livre para singrar e descobrir! Mares, nunca dantes navegados! Onde homem nenhum jamais esteve! O infinitamente grande, todo dentro do infinitamente pequeno! Oh, Criação, Filha do Cataclisma, preparai-vos, pois tuas sementes cresceram e agora se preparam para confrontar-vos ! ( AO PEDREIRO ) E a ti, me despeço mais falando do amanhã: O mundo terminará em fogo, o mundo terminará em água, o mundo terminará com um estrondo, o mundo terminará com um suspiro e o sangue derramado no interior de cada um de vós se encontrará ao fim de tudo e suspirará por uma velha rocha escura suspensa no vazio e sorrireis uma última vez antes de vos voltardes para o futuro, para as luzes no vazio, cada vez maiores...

PEDREIRO
( EMOCIONADO ) E você, que sabe tudo, a gente ainda se revê?

FATA
Ver é o de menos...mas quanto ao futuro, tens que aprender a descobri-lo sozinho. Obrigada. ( APROXIMA-SE DO PEDREIRO CONSTRANGIDO E BEIJA SUA TESTA ) Teu suor é gostoso. (VIRA-SE ) Guarda minhas palavras e minhas imagens. No fim, o que existe é o que lembramos. Adeus! Adeus! Que vos guiem os anjos! (EFEITOS DE ILUMINAÇÃO E SOM. A MÚSICA PÁRA. TODOS OBSERVAM A PARTIDA DA FATA. ELA VAI. A ILUMINAÇÃO VOLTA AO NORMAL. AS PESSOAS SE DISPERSAM. MARCOS E VERINHA JÁ SE BEIJAM SENTADOS. O PEDREIRO CONTINUA OBSERVANDO A PARTIDA DA FATA).

Da Peça FATA SUBURBAS

Um Pouco de Poesia e Pretensão Depois de Tanta Mulher Pelada (Uh! Tererê!)

Não é que os cegos não vejam
Eles vêem o futuro

O tempo todo.



PERFECCIONISTA

Ando pela casa
Ajeitando os quadros
para que fiquem paralelos ao chão.

Todos eles, o tempo todo,
Quero-os perfeitamente
paralelos ao solo, alinhados,
ajeitados, retos, bem resolvidos,
como minha vida deveria ser

Então subitamente me ocorre
A Terra é redonda.

dezembro 03, 2006

Da série "Ela depila lá embaixo" - Karina Bacchi


Com direito a piercing (Simone, ex-Autoramas, amiga minha, conta que uma amiga dela foi fazer um desses e perdeu a sensibilidade, por isso que ela não faria de jeito nenhum).
Mas eu casava com uma que tivesse um desses.
No mamilo já era legal.

Da série "Ela depila lá embaixo" - Britney Spears






E ainda ficamos sabendo que ela não é adepta do parto natural...