novembro 12, 2011

Ascensão e Queda do Maior Gigante de Vendas Americano - do qual você provavelmente nunca ouviu falar

*Publicado originalmente no blogue de história da Editora Record que eu edito...

O Globo desta sexta-feira trazia uma matéria sobre os armazéns de secos & molhados que ainda funcionam no Rio de Janeiro, a maioria deles dividindo suas vitrines de cristal e ferro fundido com um bar vintage, pedaços perdidos no tempo de uma cidade pré-globalizada. Mas na verdade a decadência desse tipo de comércio, como sói acontecer, começou simultaneamente com o seu auge. A era pós-industrial já mostrava suas garras nos primeiros anos do século XX, ainda antes da I Guerra Mundial, a efeméride que para muita gente marca o início do mundo contemporâneo.

A sede da A & P no começo das lojas econômicas - com direito a trenzinho na porta!

Praticamente um século antes do Wal-Mart, outra empresa de varejo já sofria com as acusações de estar destruindo o comércio local e criando um monopólio perigoso para a economia do país. Embora pouco conhecida aqui em baixo, a Great Atlantic & Pacific Tea Co. foi uma das maiores corporações americanas, a ponto, de nos anos 50, vender menos apenas que a General Motors. De cada dólar gasto nos EUA, assombrosos dez centavos o eram nos caixas da A & P. Até que, como os armazéns familiares que eles jogaram no limbo junto com seu auge, chegou sua decadência, durante seis décadas, até o pedido de falência no ano passado.

Em 1859, a Great Atlantic & Pacific Tea Co., como o próprio nome diz começou em vendendo chá - ou seja, no princípio era a Starbucks e depois é que virou a Wal-Mart. O chá e o café entraram em moda com força no século XIX e o quilo podia custar aos varejistas até 2 dólares (muito dinheiro então). George Huntington Hartford e George Gilman resolveram então comprar a mercadoria diretamente das plantações chinesas. Sem a rede de comunicações de hoje em dia, um negócio arriscado, mas que baixou o preço do quilo para 0,60 centavos. Com publicidade agressiva e decoração chamativa, logo a cafeteria - não só vendia como servia bebidas - abria novas lojas.

Mas o grande ponto de virada da companhia foi quando Hartford, agindo como único proprietário, indicou seus filhos John e George para posições de liderança. O primeiro levou adiante a política de evitar atravessadores e intermediários manufaturando produtos por conta própria - plantando seu próprio café, por exemplo. O segundo, no entanto, foi quem realmente transformou a empresa num império, com seu conceito pós-industrial de loja econômica.

Os armazéns d'antanho eram lojas eminentemente locais e familiares. Os fregueses e vendedores eram muitas vezes vizinhos, frequentando a mesma comunidade, e os clientes tinham uma caderneta de crédito, onde anotavam suas compras para serem pagas somente ao fim do mês. Nos primórdios da geladeira, quando compras eram feitas por mulheres e criadas, as mercadorias eram depois entregues a domicílio. George Hartford aplicou nesse negócio então, a partir de 1912, uma política de corte de custos surpreendentemente moderna, depois de convencer o irmão e o pai da viabilidade de sua ideia.

Os novos estabelecimentos a serem abertos, para começar, não trabalhariam com longos contratos de aluguel. George pretendia que qualquer ponto que não se mostrasse rentável o suficiente pudesse ser realocado sem muita demora. Não haveria estoques de nada na loja, exceto das mercadorias de enorme saída. Não haveria crédito e nem entrega a domicílio. Um único empregado, no máximo dois, e a velha política de compras diretamente do produtor, ou produção própria. Um teste para saber o que as pessoas preferiam: tratamento personalizado, atendimento de primeira, ou preços. Adivinha quem ganhou. Uma dessas primeiras filiais foi aberta perto de uma das grandes lojas da rede. Em seis meses o armazém à moda antiga fechou.

Pelos próximos anos, em média 130 das novas "lojas econômicas" eram abertas A CADA MÊS. Em 1925, a cadeia tinha 14 mil lojas e vendas astronômicas. Tão volumosas eram suas vendas que sobreviveu praticamente incólume à quebra da bolsa de 1929. Uma nova ameaça, no entanto, estava surgindo, e a A & P, como agora era conhecida, já que bastante afastada de seu negócio inicial de cafeteria que vendia chá, precisava reagir com rapidez. Era o surgimento do supermercado.

Desde 1916 algumas cadeias já vinham experimentando com autoatendimento, como a Piggly Wyggly e Alpha Beta. Nos anos 20, começou a se popularizar o "shopping drive-in". Os armazéns do começo do século eram normalmente especializados - havia os açougues, as mercearias, os secos & molhados... a A & P, face ao estrondoso sucesso de sua cadeia, começou a tentar inovar vendendo também carne, mas outro formato já estava surgindo na época. Um amplo estacionamento com diversas dessas lojas lado a lado. Embora os estabelecimentos pertencessem a donos diferentes, o público via esses "shoppings" como uma única loja e daí a alguém juntar tudo sob o mesmo teto e bandeira, foi um pulo, normalmente creditado à rede King Willen. Nascia o supermercado (continua)

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