maio 11, 2006

A História da Copa do Mundo Capítulo IV - O Ferrolho Suíço e a Copa de 1938

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A EVOLUÇÃO TÁTICA - O FERROLHO SUÍÇO:

Retranca. Correria. Jogadores "polivalentes", que podem desempenhar várias funções, todos preocupados com a marcação. Não, não estamos falando do futebol-força nascido na década de 1960. Muito antes disso os suíços lançaram as sementes dessa idéia ao criar o "ferrolho", tática que não teve o destaque merecido por ter nascido na Suíça, país sem tradição no esporte, e por ser um sistema um tanto teórico, difícil de ser aplicado na prática por estar anos à frente de seu tempo.
Na pirâmide (2-3-5) a segunda linha de defesa era ao mesmo tempo o meio-campo. O WM dividiu as funções dessa linha média entre os meias-defensores e os meias-atacantes. Cada um tinha que marcar seu oposto do time adversário e os lances eram criados em embates individuais. O sistema funcionava, mas era rígido e exigia disciplina e dos jogadores, que eram exaustivamente treinados para se tornarem especialistas nas limitadas funções de sua posição, o que era bastante condizente com o profissionalismo que surgia, com atletas dedicados exclusivamente ao esporte.
Karl Rappan, um treinador tão fascinado pela teoria do jogo quanto Pozzo, não tinha esses profissionais ao seu dispor. Seus jogadores eram amadores com outros empregos, sem muito tempo para treinar. Ele criou então uma tática com maior mobilidade - e maiores responsabilidades - para os atletas.

FIGURA 10

Quando tinha a posse da bola, seu time se desdobrava em campo com os três defensores do WM, um beque e dois laterais; uma linha média semelhante à da pirâmide, completa com centromédio atacante, e uma linha de quatro no ataque, como no 4-2-4 do futuro. Atacando, as três linhas avançavam bastante, com a defesa chegando quase até o meio-campo. Uma vez perdida a bola, o adversário não tinha a opção do contra-ataque imediato porque, com os defensores tão adiantados, qualquer atacante enfiado estaria impedido. E naquele tempo todo mundo jogava enfiado porque os beques do WM e da pirâmide nunca saíam lá de trás.
Mas não era essa a grande novidade defensiva do Ferrolho. O que o tornava único e precursor do jogo contemporâneo é que quando perdiam a bola, os dez jogadores voltavam para marcar, mudando o desenho tático.

FIGURA 11

Os quatro atacantes deveriam atrapalhar a armação do jogo, dando tempo para os médios e os beques recuarem. O centromédio atacante volta mais do que seus companheiros direito e esquerdo e assume a posição do beque central do WM. Por sua vez, o beque central recua ainda mais, sem ter a missão de marcar ninguém. Ele fica atrás de todos os outros jogadores, na sobra, ou para corrigir erros dos companheiros, com liberdade para correr horizontalmente de um lado para o outro da defesa. Como um ferrolho, pata trancar o ataque adversário, daí o nome.
Este esquema abria mão do domínio de meio-campo. Assim, não tentava igualar os quatro jogadores que o WM desdobrava nesse setor, mas concentrava-se na defesa. Um adversário confrontado com esse sistema tinha a tendência a tocar a bola de um lado para o outro sem ter como penetrar na grande área, parecendo ter o domínio do jogo, mas na verdade sem opções e sujeito a contra-ataques velozes, facilitados pelo desenho tático que mudava rapidamente ao se recuperar a posse de bola.
O esquema exigia jogadores velozes, inteligentes o suficiente para compreenderem seus papéis e versáteis, porque até os atacantes tinham funções de marcação. Ninguém a usou fora da Suíça, mas sua mobilidade e versatilidade era o caminho para o futuro e o futebol contemporâneo, caminho que os brasileiros explorariam ao criar o 4-2-4.

A COPA DE 1938 - A EUROPA (QUASE) SE CURVA AO BRASIL

O estatuto da FIFA já previa rodízio de continentes na organização da Copa. Depois da Itália, o próximo anfitrião deveria ser da América do Sul e a Argentina se candidatou. Mas a França também, e o coração de Jules Rimet por ela batia. Assim os franceses foram escolhidos para hospedar o torneio e os argentinos e uruguaios se recusaram a participar, pelo desrespeito às regras. Os ingleses continuavam achando que não podiam ficar se misturando com aquela turma de pernas-de-pau e ignoraram mais uma vez a competição. Tirando esse povo, todos os outros países importantes no esporte se inscreveram para as eliminatórias.
Todos não. A Áustria, terra do Wunderteam, de toque de bola magistral e belo, havia sido anexada pela Alemanha de Hitler. Seus jogadores foram encampados pela seleção alemã, que já era forte. Com este time reforçado o ditador nazista esperava fazer em 1938 o que Mussolini fizera em 1934, mostrar ao mundo como seu governo fizera dos alemães guerreiros imbatíveis, trazendo a Copa para casa. Poucos pensavam que esse esquadrão ariano pudesse ser detido. Talvez a Itália tivesse alguma chance. A Tcheco-Eslováquia ainda tinha em seu elenco vários atletas vice-campeões em 1934. E entre os competidores, havia um único sul-americano, mas de um país bem mais pobre que os respeitados Uruguai e Argentina. O Brasil.
Pela primeira vez os brasileiros chegaram bem preparados. A federação profissional e a amadora fizeram um acordo e mandaram o melhor time disponível. O técnico, Adhemar Pimenta, era competente, embora totalmente desatualizado, desconhecendo até o WM. Ainda assim a preparação foi bem feita, com o time chegando 19 dias antes da estréia, com tempo suficiente para se acostumar à França e à Copa.
As oitavas-de-final começaram sem surpresas. A Suécia nem precisou jogar, já que seu adversário seria a Áustria, que desaparecera anexada pelos nazistas em 1936. A Hungria venceu por 6 x 0 as Índias Holandesas, cuja matriz, a Holanda, que se autoproclamava melhor time só de amadores da competição, perdeu de 3 x 0 para a Tcheco-Eslováquia e terminou em penúltimo lugar, mostrando que a era do amadorismo estava totalmente ultrapassada. A Noruega, que nas Olimpíadas de Berlim em 1936 eliminou a Alemanha e nas eliminatórias derrotou equipes então fortes como a Irlanda e a Iugoslávia, deu trabalho aos campeões italianos, que precisaram da prorrogação para fazer 2 x 1.
As surpresas vieram de Cuba, que eliminou a Romênia num jogo-desempate, depois que o primeiro terminou 3 x 3 e, principalmente da Suíça de Karl Rappan e do Ferrolho, que eliminou os poderosos alemães. Foram dois jogos, 1 x 1 no primeiro e 4 x 2 no segundo, de virada. Talvez tenha contribuído para a derrocada alemã a mudança de técnico. Sepp Herberger substituiu Otto Nerz depois que este perdeu a Olimpíada e desapareceu misteriosamente. E na Alemanha de Hitler, quando alguém desaparecia não era por ter sido abduzido por extraterrestres, como o Penta perguntou.
O Brasil tinha pela frente a Polônia, semifinalista da Olimpíada de 1936. Os poloneses, como bons inimigos, se julgavam vitoriosos de véspera. Seu técnico dizia que sua equipe sabia como descobrir imediatamente os pontos fracos de qualquer adversário. E parece que foi assim contra os brasileiros, pois fizeram cinco gols. Infelizmente para eles a seleção fez seis.
O Brasil saiu na frente e fez 3 x 1, mas os poloneses empataram em 4 x 4. Na prorrogação os brasileiros abriram 6 x 4 e os polacos diminuíram, mas ficaram nisso. Leônidas da Silva marcou quatro gols, o primeiro jogador a conseguir tal façanha num jogo de Copa do Mundo, cinco minutos antes do polonês Willimowski fazer o mesmo. Começava a nascer a lenda do "Homem de Borracha", apelido que ganhou dos europeus devido a sua elasticidade e suas jogadas acrobáticas.

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Contra a Polônia, a chuteira de Leônidas estourou e ele a jogou para fora do campo para ser consertada e ficou em campo, com o pé descalço. Na jogada seguinte Hércules cobrou uma falta com violência e o goleiro espalmou a bola na direção de Leônidas. O brasileiro nem pestanejou, encheu o pé, sem querer saber se estava calçado ou não e marcou o quinto gol da seleção. O juiz validou o lance e o "gol de pé descalço" aumentou a lenda do "Homem de Borracha".


O jogo foi disputado debaixo de enorme temporal e é considerado um dos mais emocionantes da história das Copas. Mais importante do que os gols que fez foi o show de bola de Leônidas. Tanto que ninguém lembra do artilheiro polonês. Depois de terminada a partida o técnico Adhemar Pimenta comentou, "mas que terrível adversário foi a chuva".
Nas quartas-de-final os suíços, usando o Ferrolho, uma tática que privilegiava o físico, vindos de dois jogos difíceis, um com prorrogação, não resistiram diante da Hungria, que tivera uma semana de descanso depois da moleza que foi enfrentar as Índias Holandesas. A Itália eliminou a anfitriã por 3 x 1. O time francês não era lá essas coisas, para infelicidade de Jules Rimet. Os suecos terminaram suas férias com um 8 x 0 sobre Cuba. E os vice-campeões do mundo, os tcheco-eslovacos, tinham pela frente os brasileiros, que tiveram que viajar mil quilômetros para a partida.
Outro jogo duro. O Brasil começou batendo muito e teve Zezé Procópio expulso. Machado e Riha trocaram bofetões no final do primeiro tempo e também foram mandados para fora.
No segundo tempo quem baixou o sarrafo, sob o olhar dessa vez complacente do juiz, foram os tcheco-eslovacos. A vantagem de 1 x 0 conseguida por Leônidas no primeiro tempo não conseguiu ser mantida. Nejedly empatou de pênalti e o jogo foi para a prorrogação. Zero a zero.
Na partida-desempate, dois dias depois, Adhemar Pimenta mudou o time todo, menos Leônidas, que empatou o jogo depois que a Tcheco-Eslováquia saiu na frente. Mas os reservas brasileiros eram tão bons quanto os titulares e o ponta-direita Roberto fez o gol da vitória. O Brasil só precisava viajar 17 horas até Marselha, vencer os campeões do mundo e estaria na final.
A semifinal contra a Itália é motivo de várias controvérsias. A primeira foi a ausência de Leônidas. Adhemar Pimenta não o escalou alegando que o centroavante estava contundido, mas alguns jornalistas presentes à Copa garantem que ele estava em condições de jogo e teria sido poupado para a final. Na história oficial das Copas pela FIFA e na imprensa internacional esta é a versão aceita.
No entanto, era preciso lembrar que o jogo seria em 16 de junho. No dia 12 Leônidas jogara 120 minutos e no dia 14 jogara mais 90. Ele realmente estava se queixando de contusão e, mesmo que ela não impedisse sua entrada em campo, seria um risco fazer um jogador tão exausto disputar uma partida importantíssima sem estar 100% fisicamente, com o risco de agravar seu estado. E, como visto no capítulo sobre regras de futebol, antes de 1967, se um time perdesse um jogador teria que jogar com 10 até o fim, já que não havia substituição, uma das grandes tolices da história do bárbaro esporte bretão.
Assim, para escalar Leônidas fora de sua melhor forma, Pimenta estava se arriscando a perder seu principal jogador, ficar com 10 em campo contra os campeões do mundo e a entrar sem seu atacante numa eventual final. Um treinador mais ousado poderia ter preferido correr o risco, mas Pimenta acreditou no potencial do resto da equipe, para se tornar motivo de chacota até no DVD "FIFA Fever", em que se conta a história oficial das Copas.
A segunda controvérsia foi a escalação do ataque. O reserva de Leônidas era Niginho, mas foi descoberto em cima da hora que o atacante abandonara a Brasilazio, o time da Lazio cheio de brasileiros, ainda com contrato por cumprir, para voltar à pátria da qual estava morrendo de saudades. Atitude inegavelmente patriótica e romântica, mas antiesportiva. Os italianos certamente sabiam da história e a FIFA poderia desclassificar o Brasil. Assim Pimenta escalou na linha de frente jogadores que nunca tinham sequer treinado juntos e fora de posição.
Mas os brasileiros eram bons de bola e a seleção segurou o 0 x 0 até os 10 minutos do segundo tempo, quando Colaussi, em jogada pessoal, fez o primeiro gol. Ainda assim o time não se entregou até cinco minutos mais tarde, quando o juiz marcou pênalti contra o Brasil e deu início à terceira controvérsia. Domingos da Guia, o maior zagueiro já nascido nestas terras, foi provocado desde o início do jogo por Piola. Quando o lance estava no meio-campo, aproveitou para dar uma rasteira no centroavante. Infelizmente para ele o juiz viu o lance e marcou a falta.
Há várias versões desta história: a infração teria sido cometida quando a bola estava fora e Domingos esperava ser expulso, mas não que fosse ser pênalti; Piola chutou Domingos e este reagiu, mas o árbitro foi parcial; que os jogadores brasileiros simplesmente não sabiam que podia ser marcada uma falta fora da jogada. Mas tudo leva a crer que Domingos simplesmente se irritou com a provocação do italiano e aplicou-lhe um pontapé. O gol subsequente acabou com as esperanças brasileiras, que não foram reavivadas nem com o gol de Romeu aos 42 minutos, fechando o escore em 2 x 1.

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Por causa do pênalti sobre Piola, o termo domingada passou a ser usado por locutores para descrever uma lambança da defesa. Injustiça com Domingos da Guia, o mais técnico e elegante zagueiro da história brasileira.

Na outra semifinal a Hungria derrotou os turistas suecos por 5 x 1. A turma da Suécia também não viu a cor da bola na decisão do terceiro lugar, quando perdeu de 4 x 2 para o Brasil com Leônidas de volta. O centroavante marcou duas vezes, tornando-se o artilheiro com 8 gols. Somado ao que fez em 1934, totalizou 9, tornando-se o maior goleador das Copas até então. Ademir igualaria a marca em 1950.
Na final, mesmo com toda a torcida francesa contra eles, os italianos não tiveram dificuldades em fazer 4 x 2 sobre uma Hungria que o próprio Piola reconheceu tecnicamente superior. O treinamento profissional de Pozzo e suas táticas provaram ser mais adequados a um esporte que rapidamente estava tornando os estilistas puros coisa do passado e exigindo um desempenho mais atlético de seus praticantes. A seleção italiana provou ter mais força, velocidade e um sistema de jogo em que cada um sabia exatamente o que fazer em campo. O "método" mostrou-se mais adequado sob tais condições. O "Ferrolho" dos suíços era mais moderno, mas sem jogadores da mesma qualidade, não foi muito adiante e passou quase desapercebido.
Em concordância com esses novos tempos, embora Meazza ainda jogasse e se destacasse, o craque da Itália foi Silvio Piola, aquele mesmo do pênalti de Domingos da Guia, não tão técnico, mas rápido, com excelente impulsão e reflexos incomparáveis na frente do gol.
Mussolini adorou. Hitler nem tanto. Infelizmente, sua próxima tentativa de mostrar ao mundo em que guerreiros imbatíveis ele havia transformado os alemães foi no ano seguinte, quando ele iniciou a II Guerra Mundial e interrompeu a Copa do Mundo por 12 anos.

DOMINGOS DA GUIA

Elba de Pádua Lima, o Tim, jogou na Copa de 1938 pelo Brasil e foi um dos maiores dribladores do nosso futebol, tornando-se mais tarde técnico vitorioso e festejado. Numa mesa-redonda de tevê nos anos 80, ele contou:
- Olha, dizem que já me viram fazendo, mas eu mesmo não me lembro de alguma vez ter driblado o Domingos. Eu jogava olhando para ele. Se ele estivesse deste lado, eu driblava para o outro. Se ele vinha para cá, eu driblava para lá. O negócio era fugir dele.
E os atacantes fugiam dele, mas não adiantava. A bola acabava sempre nos pés de Domingos. Todo mundo corria de um lado para o outro, até os fotógrafos desesperados, tentando não perder o toque rápido e mortal de um Leônidas, por exemplo. Mas quando Domingos entrava no lance, a partida parecia ficar em câmera lenta. Ele parecia não suar a camisa, parecia não correr, mas a bola acabava sempre em seus pés.
E os atacantes tinham sua razão para temer Domingos. Na Copa Rio Branco de 1931, em que o Brasil derrotou os uruguaios por 2 x 0, o ponta-direita campeão do mundo, Dorado balançou as redes, gritou gol e seus companheiros correram para abraçá-lo e comemorar. E quando procuraram pela bola para levá-la ao meio de campo, ela não estava lá. Estava com Domingos.
Seu futebol impressionou tanto os campeões olímpicos e mundiais que foi contratado pelo Nacional de Montevidéu, onde ganhou o apelido de "Divino Mestre", com a idade de 20 anos. Foi-lhe oferecida a cidadania uruguaia para que ele pudesse se juntar à seleção celeste.
Centromédio deslocado para a zaga, Domingos, apesar de sua elegância e sobriedade em campo, não tinha temperamento fácil. Reservado e introvertido, com um estilo quase pedante de jogar, apesar de admirado não era idolatrado como Leônidas. Em campo às vezes se enervava com as provocações, como quando parou a bola a dois metros do gol aberto de seu time, num Botafogo e Flamengo e chamou os adversários para tomarem a bola dele. E eles vieram. Ele driblou um, dois, três, quatro, cinco, em fintas milimétricas, para em seguida esticar um lançamento de 50 metros. Depois de um longo silêncio de preocupação e estupefação, foi aplaudido de pé pelo estádio.
Domingos nasceu em 1912 e jogou também pelo Bangu, Boca Juniors, Vasco da Gama e, no melhor período de sua carreira, no Flamengo. Do rubro-negro saiu para o Coríntians em 1944, na mais cara transação até a época. Encerrou a carreira no Bangu, em 1949. Seu filho Ademir da Guia comandou a "Academia" do Palmeiras nos anos 70, e participou da Copa de 1974, sendo o único caso brasileiro de pai e filho que jogaram em Copas do Mundo.


LEÔNIDAS DA SILVA

O colunista inglês Mike Gibbons o descreve como provavelmente o melhor jogador da história do futebol antes de 1945. Alguns de seus contemporâneos chegaram a dizer que se o Brasil tivesse ganho a Copa de 1938 sua lenda seria tão grande ou maior do que a de Pelé. Principalmente ele mesmo. Leônidas da Silva, o "Diamante Negro" foi indiscutivelmente em sua época um fenômeno de popularidade tão grande quanto Pelé, Romário ou Ronaldo, o primeiro a ter sua imagem explorada pela publicidade. Simpático, acessível e bem-humorado, o "Diamante Negro" foi o maior ídolo que aquela nação doida por futebol já vira.
Nascido em 1913, filho de um marinheiro português e uma cozinheira, Leônidas entrou para o juvenil do São Cristóvão aos 13 anos e começou a se destacar no futebol comandando a linha de frente do Bonsucesso em 1931. Armado por Gentil Cardoso no então moderno WM, o time pequeno teve o ataque mais positivo do campeonato, mesmo chegando em sexto. Leônidas foi convocado para a seleção carioca, para o campeonato brasileiro, então disputado por seleções estaduais. O titular Nilo, que jogara a Copa de 1930, estava na Europa com o Vasco. Quando voltou havia perdido a vaga.
Leônidas fazia coisas em campo que nunca tinham sido vistas antes, como plantar bananeira com a bola nos pés, antes de terminar a jogada com uma cambalhota. Acrobático e rápido, participava do jogo muito mais do que os atacantes anteriores, indo atrás da jogada buscar a bola, em vez de ficar esperando-a, como Nilo e os outros atacantes da época. Nilo, aliás, fora o autor dos dois gols do histórico triunfo sobre o Uruguai em 1931. Na revanche, em 1932, sua posição já era de Leônidas, que também marcou os dois gols da vitória brasileira. Um dos gols foi de "bicicleta" (em que o jogador se joga no chão com as costas e, com as pernas para o alto, bate na bola), cuja invenção é creditada a ele, embora o próprio "Diamante Negro" atribuísse a honra a Petronilho, dizendo que apenas aperfeiçoara o lance.
A atuação lhe valeu a contratação pelo futebol profissional dos campeões do mundo, mas fracassou no Peñarol e voltou para o Brasil, para passagens sem muito brilho no Vasco e no Botafogo antes de se fixar por cinco anos no Flamengo, entre 1936 e 1941. Foi quando sua carreira atingiu o auge, tornando-se o maior ídolo da história do esporte. A famosa marca de chocolate "Diamante Negro" foi lançada para explorar sua imagem e existe até hoje. Grande parte da popularidade do Flamengo foi conquistada por sua causa, principal estrela de um time que contava também com Domingos da Guia, "o Divino Mestre" e Fausto, "a Maravilha Negra", três negros numa época ainda de preconceitos.
Em 1938 foi eleito o melhor jogador da Copa após marcar oito gols em quatro jogos e ganhou o apelido de "Homem de Borracha". Ele não participou da única derrota brasileira no torneio, contra a Itália por conta de uma história mal contada, tão misteriosa até hoje quanto a participação de Ronaldo na final de 1998. Na volta desfilou pelas ruas em carro aberto, antecipando as paradas dos futuros campeões mundiais.
Sem outras chances de disputar outros campeonatos mundiais por causa da II Guerra, ele saiu do Flamengo em 1942 para o São Paulo, onde jogou até 1950, ainda ganhando vários títulos. Largou o futebol nesse ano, após ser cortado da seleção que treinava para a Copa por Flávio Costa, com quem sempre teve desavenças. Tornou-se comentarista e locutor esportivo e faleceu em 2004.

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