fevereiro 01, 2011

A Primeira Doença da Modernidade

Não foi o estresse e nem a depressão, embora essas duas sejam a cara da Era da Máquina. Hoje em artigo no Globo discute-se como se está próximo de sua erradicação, graças à tecnologia moderna. No entanto foi exatamente a melhoria das condições de vida advindas da Revolução Industrial que proporcionou não seu surgimento, mas seu desenvolvimento. Até que o número de casos atingiu índices alarmantes mesmo nos países mais ricos. Aliás, o mais intrigante é que era justamente neles...

Todo mundo tem um(s) amigo(s) que gosta de repassar e-meios espirituosos, às vezes com anexos com arquivos de PowerPoint. Logo, as chances são boas de que você já tenha recebido aquela apresentação sobre como o pessoal que viveu antes dos anos 80 conseguiu sobreviver sem milhões de medidas de segurança e supervisão constante dos adultos através de celulares, creches e escolas. Se entretanto você é um sujeito impopular, que não recebe cartinha eletrônica de ninguém, pode checar os slides aqui ou só o texto mesmo aqui. Pode parecer piada, mas a verdade é que a falta de exposição ao mundo real pode causar problemas sérios e um dos primeiros que surgiu quando a humanidade começou a modificar o planeta para que ele parecesse um condomínio de luxo foi a poliomielite.



Embora haja descrições da doença até no Antigo Egito, a pólio sempre foi uma doença com pouca penetração e menos ainda repercussão. Tanto que só foi classificada em 1840. E justamente a partir da segunda metade do século XIX é que ela começou a atingir proporções epidêmicas, principalmente nos países desenvolvidos, chegando a números alarmantes por volta de 1910. O que aconteceu nessa época para propiciar essa difusão?

A melhoria da higiene.

Sim, exatamente. Com mais cidades construindo esgotos e aperfeiçoando as condições sanitárias, menos crianças passaram a ter contato com o vírus, que vive normalmente no intestino e se espalha através de ingestão de partículas fecais (ou por transmissão oral-oral). Anteriormente o agente patogênico era praticamente ubíquo e as pessoas tinham contato com ele desde o nascimento, o que reforçava suas imunidades natural e herdada pelo aleitamento. A idade típica dos casos da doença era por volta de seis meses, o que mostra que as crianças eram expostas desde muito jovens a ela.

Mas com a melhora das condições higiênicas e sanitárias, os cidadãos das nações mais desenvolvidas não tinham contato com o vírus e iam aos poucos perdendo suas defesas. A idade típica dos casos subiu para quatro anos e o número de casos subiu estratosfericamente. Em pleno século XX atingia pessoas normalmente pouco sujeitas a epidemias, como Franklin Roosevelt. Em 1950 ainda era preocupante e a busca de uma vacina era uma prioridade em todo o mundo. Tanto que acabaram conseguindo, primeiro a Salk, depois a muito melhor Sabin.

Hoje em dia a pólio está erradicada das Américas e só em meia dúzia de nações ela ainda é considerada endêmica. Numa delas, o Egito, tão em voga atualmente, há anos não se tem um novo caso. O vírus nos acompanhou sem causar grande dano em toda a história da civilização e somente mostrou força quando a Revolução Industrial começou a criar em alguns lugares no mundo mais um confortável jardim do que o acidentado planeta abrigando a luta pela sobrevivência. Por isso mesmo, existe hoje em dia uma corrente médica que, mais ou menos no espírito dos slides do PowerPoint acima, pregam que criança possa comer uma bala que caiu no chão (de casa, não na rua, também não precisa exagerar) e nem precisa se preocupar tanto com higiene a ponto de transformar prática de esportes e tratamento de arranhões um festival de paranoia. Afinal de contas, somente se nos expormos à vida é que ela se expõe a nós.

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