maio 19, 2008

Aviões de Combate Parte I

Todo mundo sabe a diferença entre um bombardeiro e um caça, certo, mas você saberia diferenciar um interceptador de um caça de supremacia aérea para qualquer tempo? E, a bem da verdade, pouca gente classificaria o F-111 como bombardeiro. Então, para os bem principiantes fãs de aviões de combate - que certamente acompanham quase toda semana COMBATES AÉREOS no History Channel, uma rápida explicação de alguns tipos de aeronaves militares e suas propriedades:

Bombardeiros

História

Quando Louis Blériot cruzou pela primeira vez em 1909 o Canal da Mancha com um "mais-pesado-do-que-o-ar" (já havia sido feito de balão), os jornais estamparam nas manchetes "A Inglaterra não é mais uma ilha". E o que era pior, a única nave capaz de carregar uma carga significativa de bombas por um longo percurso era o zeppelin, que só os alemães sabiam construir na época. Flanando mais alto do que qualquer aeroplano da época, ele afigurava-se invencível, surgindo no horizonte para despejar sua carga mortífera.

Na verdade, com a tecnologia da época, sem visores de bombardeiros para travar no alvo, sem uma carga realmente significativa de bombas e nem zeppelins em quantidade suficiente, os dirigíveis rígidos pouco fizeram além de matar um azarado infeliz ou outro que ficou no caminho de seus petardos. Além do mais, o rápido desenvolvimento tecnológico dos "mais-pesados-do-que-o-ar" lembrou a todo mundo que eles eram gigantescos sacos cheios de hidrogênio combustível. O aumento da potência dos motores e a engenhosidade russa de Igor Sikorsky (mais tarde o pai do helicóptero) criariam os primeiros grandes aviões quadrimotores. Olhando para os bichos, biplanos, feitos de madeira e tecido, cheios de cabos e estais é difícil imaginar que eles conseguissem sair do chão, quanto mais serem armas mortíferas, mas era essa sua verdadeira face.

Os bombardeiros russos - e depois os Caproni italianos - já tinham quase tudo que caracterizaria as fortalezas voadoras da II Guerra - quatro motores, grande compartimento de bombas, torres giratórias de metralhadoras para auto-defesa. Os alemães e ingleses preferiram os bimotores - os Gotha e DeHavilland DH4. Porém, apesar do entusiasmo de Douhet e Billy Mitchell, que pregavam o bombardeio estratégico como a arma de dissuasão e vitória definitiva, alegando que eles sempre conseguiriam penetrar qualquer defesa, quando a Grande Guerra 2 - A Missão estourou em 1939, só os americanos tinham um quadrimotor que se prestava a esse papel, o B-17, tão único nos anos 30 que ficou conhecido como a "Fortaleza Voadora".

Os americanos tinham suas razões para criarem bombardeiros tão grandes: eles sabiam que qualquer guerra que travassem seria provavelmente à distãncia. A uma distância particularmente grande, se a Inglaterra caísse. Daí a busca por aviões que pudessem atravessar o Atlântico, largar umas bombinhas e voltar pra casa pra contar a história, busca que acabaria desaguando no B-29, a Superfortaleza Voadora, e no B-36, o mais retrô-future aparelho militar do pós-guerra (incidentalmente, essa é a razão pela qual os caças americanos foram armados até a Guerra da Coréia com metralhadoras, desprezando os canhões que disparavam projéteis mais pesados e destruidores numa cadência de tiro mais lenta: dificilmente eles seriam chamados para derrubar grandes aeronaves estratégicas sobrevoando os EUA; sua missão seria detonar outros caças, mais rápidos, ágeis e frágeis, que estariam defendendo seu solo pátrio dos incursores americanos e que ficariam na mira por pouco tempo, não precisando de muito chumbo para cair, daí advindo a preferência pelo fogo rápido, mesmo que leve).

Já os alemães preferiram os bombardeiros bimotores porque toda sua filosofia estava voltada para a blitzkrieg: tanques se movendo velozmente pelo campo de batalha, abrindo brechas nas linhas inimigas e avançando sem parar para consolidar os ganhos, tarefa da infantaria que viria depois. Isso acabava levando os blindados profundamente dentro de território adversário, e a única cobertura de artilharia disponível seria aérea. Eles não queriam tapetes de bombas. Queriam precisão, para o trabalho de contrabateria (a destruição dos canhões adversários). E a melhor maneira de consegui-la era descer dos céus num mergulho quase vertical, mantendo o alvo sob mira o tempo todo, largando a carga no último instante, quase entregue a domicílio, numa trajetória perfeita. Para isso, desenvolveram o melhor bombardeiro de mergulho do começo da guerra, o Ju 87 Stuka (1).

O Stuka era um monomotor que ficaria logo obsoleto. Na verdade, seu trem de pouso fixo produzindo arrasto, sua velocidade máxima por volta de 300 km/h, seu assento alto que deixava o piloto muito exposto e seu armamento defensivo inadequado já o faziam ultrapassado quando as hostilidades começaram, mas as forças aéreas inimigas estavam mal equipadas. Os nazistas sabiam dos problemas de sua máquina e, fãs que eram do bombardeio de mergulho, resolveram construir um bimotor que se prestasse ao papel. No entanto, com o tamanho maior havia um limite de pressão que as asas podiam suportar no mergulho e, por isso, a aeronave resultante, o Junkers Ju 88, jamais poderia despencar tão verticalmente quanto um Ju 87. Em compensação seria um avião extremamente versátil, que trabalharia em missões de ataque, caça-noturno, lança-minas, batalhas aeronavais etc. Foi com ele e os destruidores de Guernica, o Heinkel He 111 e o Dornier Do 17, máquinas também já não mais tão modernas, que Hitler entrou na guerra. Sem os quadrimotores estratégicos, a Luftwaffe não teria como dobrar a RAF na Batalha da Inglaterra, um confronto puramente aéreo, sem intervenção do exército (ou mesmo da pequena marinha germânica), e o resto é história.

A bomba atômica finalmente faria verdade as palavras de Douhet de que o bombardeio estratégico dobraria qualquer nação. Foi a época dos bombardeiros grandes e pesados, capazes de carregar as bombas atômicas grandes e pesadas d'antanho, que desaguariam no B-52 e no Bison soviético. No final dos anos 50, entretanto, com a miniaturização dos artefatos nucleares e o desenvolvimento de foguetes balísticos intercontinentais capazes de levar sua carga até o alvo do outro lado do mundo em meia hora, os aparelhos gigantescos e caríssimos foram sendo abandonados e a última nação além das superpotências que ainda os fabricava, a Inglaterra, cessou a produção. Pesava contra esses leviatãs também seu gigantismo. Suas dimensões exageradas permitiam facílima localização por radar e derrubada pelos mísseis assim guiados e recém-aparecidos no campo de batalha.

A princípio os americanos não quiseram acreditar muito na vulnerabilidade de seus símbolos fálicos favoritos da Guerra Fria. Acharam que bastaria fazer os bombardeiros voarem mais alto e mais rápido para voltarem a ser seguros e assim começaram a desenvolver o belíssimo B-70 Valkyrie, um monstro de 93 toneladas quando vazio e um quarto de milhão de quilos quando totalmente carregado, ainda assim capaz de voar a três vezes a velocidade do som (Mach 3).
A derrubada por um míssil soviético do avião-espião U2, que teoricamente voava tão alto que era invulnerável, encerrou em 1960 o programa futurista. Apenas os protótipos do Valkyrie foram terminados e usados para pesquisa de vôo hipersônico.

Os americanos então voltaram-se para aviões capazes de invadir o espaço aéreo inimigo voando rente ao solo, acompanhando o relevo e assim evitando o radar, como o F-111 e o B-1. Ambos eram aparelhos Mach 2 (voavam a 2 vezes a velocidade do som), com asas de geometria variável (parte delas avançava para aumentar a área e a sustentação em velocidades mais baixas, ou em altas velocidades e altura, onde o ar é mais rarefeito, ou recuava para diminuir o arrasto em altas velocidades ou baixa altura, onde o ar é mais denso) e ambos foram projetos polêmicos, complicados, que acabaram entregando aos militares uma aeronave substancialmente diferente do inicialmente desejado. Eram (e são, o F-111 ainda serve na Austrália e o B-1B finalmente está saindo da obscuridade na USAF), entretanto, excelentes aparelhos, o primeiro um bombardeiro médio e o segundo um pesado, pensado para substituir o aparentemente insubstituível B-52.

Estes aviões começaram a ficar disponíveis no final dos anos 60. Infelizmente para eles, além dos custos estratosféricos, tiveram outro inimigo com que lutar: o caça-bombardeiro. Após o rápido desenvolvimento dos motores a jato nos anos 50, os caças, além de rápidos, começaram também a ser capazes de decolar com uma pesada carga bélica. O Phantom F-4 -podia carregar tantas bombas quanto um B-17 da II Guerra, com a vantagem de ser provavelmente o melhor caça de sua geração. Logo o Jaguar, o Mig-23 e o Tornado seguiam pelo mesmo caminho. Os americanos começaram a desenvolver no final dos anos 70 um aparelho sem assinatura no radar, que acabaria lhes dando o B-2 Spirit e este foi o único bombardeiro construído no mundo desde então (2). Quando até um caça leve para combate aéreo aproximado como o F-16 pode carregar toneladas de petardos e ainda se defender dos interceptadores inimigos, torrar tanta grana em máquinas caríssimas, pesadas e de complicada manutenção dificilmente conseguiria se explicar perante a comissão de orçamento do Congresso.

Propriedades

Os bombardeiros são fáceis de reconhecer: são grandes, têm vários motores (com exceção dos bombardeiros de mergulho), são subsônicos (com exceção do B-58 Hustler, B-1 Lancer, Tu 22M Backfire), têm um compartimento interno para carregar as bombas (embora também possam carregar ainda mais em suportes na asa) e atualmente ainda têm capacidade de levar mísseis de cruzeiro.

Da I Guerra Mundial até o começo da era do jato eles carregavam torres de metralhadoras para auto-defesa, que depois ficou a cargo de escoltas de caças, mísseis, missões rente ao solo para evitar os radares, ou contra-medidas eletrônicas.

Até a era do jato, as tripulações dos bombardeiros podiam chegar a 10 sujeitos - piloto, co-piloto, navegador-bombardeiro, operador de rádio, artilheiros, engenheiro de vôo... a eletrônica e a eliminação das torres de canhões reduziu esse povo todo a 5 no gigantesco B-52 e 2 no B-2 Spirit, o mínimo exequível, dado que as missões de bombardeio usualmente envolvem grandes distãncias e longos vôos, tornando imprescindível um rodízio nos controles.

Bombardeiros Famosos

Ilya Muromets - o primeiro grande bombardeiro.

De Havilland DH 4 - bombardeiro médio da I Guerra.

Gotha - Primeiros bombardeiros alemães.

B-17 Fortaleza Voadora - primeiro bombardeiro quadrimotor moderno.

B-24 Liberator - o outro quadrimotor americano da II Guerra; voava um pouco mais alto, mais longe, mais rápido e carregava mais bombas que a B-17, que era favorecido pelos pilotos por aguentar mais danos em combate e ainda assim ser capaz de voltar para casa. Apesar disso, o Liberator era mais versátil e seu superior raio de ação o fazia ideal para patrulhas anti-submarino. Foi o bombardeiro pesado mais construído da história.

Lancaster - O quadrimotor inglês. Menos blindado e armado do que suas contrapartes americanas, era mais versátil e conseguia carregar bombas de até 10 toneladas. Suas vulnerabilidades levaram os britânicos a fazer bombardeios exclusivamente noturnos.

De Havilland Mosquito - A maravilha de madeira. Com o metal escasso devido à grande demanda, De Havilland resolveu ressuscitar a madeira como material de construção, o que então se julgava completamente ultrapassado. Com bons contactos no Departamento de Defesa, ele conseguiu vender sua idéia apesar de toda a oposição oficial e entregou um aparelho que podia ser construído em serrarias, por carpinteiros, ao invés de siderúrgicas e operários especializados. A estrutura em balsa devastou as florestas britânicas, mas poupou muito material estratégico para os Spitfire e Lancasters e também tornou o bichinho leve e um azougue capaz de bater em velocidade os caças mandados atrás dele. Tão rápido era que nem levava armamento defensivo. O Discovery uma vez mostrou um especial sobre a II Guerra e um velhinho alemão que combatia nos céus da II Guerra deu uma entrevista contando como eles faziam para combater a campanha de bombardeios aliada, dizendo "e ia tudo bem, até que apareceram aqueles terríveis Mosquitos". Um tremendo tributo. Sua agilidade e velocidade levaram-no também a ser aproveitado como caça noturno (já que tinha tamanho para carregar o volumoso radar portátil da época) e caça de longa distância.

B-29 Superfortaleza Voadora - o último quadrimotor americano da II Guerra. Com cabine pressurizada, altíssima eficiência aerodinâmica, alcance quase intercontinental, metralhadoras por controle remoto, seu desenvolvimento lançou as bases para o desenho dos bombardeiros a jato que o sucederiam (e ainda assim sua última versão vitaminada, o B-50, tenha sobrevivido por mais de uma década aos aviões turbinados).

B-47 Stratojet - O primeiro bombardeiro a jato foi o B-45 Tornado, que era basicamente um quadrimotor da II Guerra com turbinas no lugar dos motores a pistão. O B-47 tinha asas enflechadas (que funcionam melhor em altas velocidades), fuselagem calcada no B-29 e uma aparência decididamente futurista quando apareceu, ainda nos anos 40. Serviu até o começo dos anos 70, quando os jatos já estavam na terceira geração.

B-36 Peacemaker - Já citado lá em cima, foi o mais retrô avião militar de todos os tempos, com seis motores a hélice impulsionadores (a hélice era virada para trás), mais quatro jatos na ponta das asas ligeiramente enflechadas, porém ainda com as pontas curvas típicas da II Guerra. Embora obsoleto já quando surgiu, era a única coisa capaz de voar até a URSS carregando as canhestras e volumosas bombas atômicas de sua era e tapou o buraco até a aparição da

B-52 Stratofortress - O mais famoso e bem-sucedido bombardeiro pesado da era do jato. Funcionou bem no Vietnã, no Iraque I e na Bósnia. Atualmente está na reserva no Iraque II.

B-58 Hustler - O único bombardeiro Mach 2 a sair do papel. Bonito, caríssimo, de manutenção pesadelar e praticamente inútil com o rápido desenvolvimento dos mísseis, só serviu como relações-públicas, batendo um monte de récordes de velocidade e altura e enfeitando fotos com sua esguia e bela figura.

Avro Vulcan - Transônico inglês, o último bombardeiro insular, com asa em delta curvo. Ficou famoso aqui quando um pousou avariado no Brasil durante a guerra das Malvinas e ficou internado. O mais ágil bombardeiro pesado já construído até o B-1.

B-2 Spirit - Bombardeiro stealth, quase não aparece no radar. Caro, lento, tão difícil de pilotar que suas missões são feitas todas em piloto automático, serviu para desenvolver a tecnologia para os práticos stealth F-22 e JSF 35.

Junkers Ju 87 Stuka - Bombardeiro de mergulho alemão da II Guerra. Seu uso integrado com tanques aterrorizou as tropas inimigas durante os primeiros anos do conflito, mas seu desenho antiquado logo o tornou obsoleto.

Junkers Ju 88 - Em vez de um quadrimotor que saturasse o alvo de bombas na esperança de que uma acertasse, os alemães resolveram tentar um aparelho médio que usasse o mergulho para economizar munição e tamanho. O bimotor Ju 88 foi o maior tamanho que eles conseguiram para tal tipo de avião sem que as asas se desmanchassem quando ele tivesse que ganhar altura novamente. Ainda assim o ângulo de ataque nunca seria o mesmo de um monomotor. De qualquer forma, manteve-se uma máquina de primeiríssima linha até o fim das hostilidades e serviu como bombardeiro, torpedeiro, lança-minas, caça noturno...

Douglas SBD Dauntless - Bombardeiro de mergulho de porta-aviões da II Guerra. Esses navios americanos estavam cheios de aeronaves ruins quando os japoneses atacaram. Sorte dos ianques que não era o caso do Dauntless e foi ele quem ganhou as batalhas do Mar de Coral e Midway, afundando os porta-aviões americanos e castrando a marinha nipônica. Nunca mais os japas puderam atacar a seu bel-prazer em qualquer lugar do Pacífico, depois da drástica diminuição de sua frota aeronaval.

A seguir: interceptadores.


(1) Na verdade, tanto os americanos, com o lendário e valoroso Dauntless, quanto os japoneses, com o esplêndido Val, tinham bombardeiros de mergulho melhores, mas ambos eram aparelhos de porta-aviões, feitos para atacar navios, com requisitos diferentes daqueles para o ataque a alvos em terra, sendo o mais marcante a grande autonomia para atravessar enoooooormes distâncias sobre as águas do interminável Pacífico. Os ianques chegaram a pensar em usar o Dauntless com o exército, mas acabaram desistindo, preferindo adaptar seus anabolizados caças como aviões de ataque, como o P-47 Thunderbolt que equipou a Força Aérea Brasileira.

(2) O B-1 na verdade foi abandonado nos anos 70 e ressuscitado nos anos 80 como uma aeronave mais simples, com pequena assinatura de radar, um pouco mais barato e com velocidade máxima rebaixada de Mach 2 para Mach 1,25, mas era apenas uma recauchutagem de um projeto antigo, tanto é que em vez de novo nome, ganhou apenas um "B" para indicar ser apenas uma subvariante - O B1B.

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