Pra quem acha que o Filógelo já está nos primórdios da história do humor: pense outra vez. Por que certos comportamentos engraçadinhos são chamados “macaquices”?
Esta chimpanzé, Washoe, tem um senso de humor mais sofisticado do que a maioria dos comediantes autodeclarados "politicamente incorretos"
E Jim Holt, em seu livro "Stop Me If You've Heard This: A History and Philosophy of Jokes", onde se propõe a contar a história da graça (não a divina), acredita que foi pelo menos com eles, os antropoides - se não antes - que surgiu o (bom) humor.
Holt faz referência em sua obra às três principais teorias sobre de onde surge a graça de uma piada: a de que você se sente superior (daí as piadas do Rafinha Bastos, as racistas, as de portugueses e louras burras e afins), a de que você libera uma repressão (pense no humor negro) e aquela que consta na Enciclopédia Britânica: a de que com ela se cria uma nova lógica, alheia à do mundo em que vivemos.
Na Enciclopédia Britânica, a piada que se dá como exemplo é a do cruzado que volta das Cruzadas (dã) e encontra sua mulher desempenhando na cama com o bispo. Imediatamente ele vai até a janela e começa a abençoar os vilões (habitantes da vila e não inimigos do James Bond). O casal interrompe suas atividades, curioso, e o cavaleiro explica, “já que você está cumprindo com minhas obrigações, reverendo, eu estou cumprindo com as suas”.
Certo, não é a melhor das piadas que você já leu, e foi escrita aqui meio apressadamente, mas passa a ideia para que se entenda o conceito: a lógica ordinária é quebrada e criada uma nova, com sua própria coerência interna. Holt acredita que a nossa tendência em ver graça nisso decorre de um mecanismo de alívio ancestral, a Teoria do Falso Alarme.
Imagine estar na savana africana há muuuuuuuito tempo atrás, com seu grupo de caça. De repente alguém vê o que parece ser uma cobra (epa!). Os caçadores-coletores se põem em guarda, a adrenalina começa a correr, armas são erguidas e todo o corpo se retesa para entrar em combate. Então um dos viventes se aproxima e percebe que na verdade a serpente é apenas um cipó num galho. Imediatamente a galera começa a rir, aliviado, toda a tensão desaparecendo numa gargalhada.
Holt também extrapola em seu livro como será o humor no futuro. Talvez daqui a um milhão de anos. Para tanto, ele se referencia no velho conceito de que o que já durou até agora é o que tem mais chance de seguir adiante. E exemplifica com as Sete Maravilhas da Antiguidade: quando, no século III ou IV antes de Cristo, a lista foi feita, as únicas que já estavam de pé havia milhares de anos eram as pirâmides. E foram justamente as que chegaram até hoje.
Então o que seria engraçado um milhão de anos atrás? A solução é olhar para os macacos. De preferência aqueles que possam se comunicar conosco. E, por sorte, temos alguns assim, nos famosos experimentos que ensinaram linguagem de sinais a chimpanzés nos anos 70. E estes animais não só aprenderam a rir, como a sinalizar o que achavam que era “engraçado”.
Um dos mais instigantes projetos científicos do século XX: ensinando macacos a comunicar-se com humanos através da linguagem de sinais
Washoe, o mais famoso desses antropoides, por exemplo, achava realmente cômico mostrar uma pedra para o pesquisador Roger Fouts e “dizer” que aquilo era comida. Outro deles, Mojo, gostava de enfiar o pé numa bolsa e usá-la como se fosse um sapato. Uma completa inversão da lógica rotineira. Um humor puramente intelectual, deliciando-se com o surrealismo e o nonsense. O que faz o mais completo sentido, já que antes da civilização não havia etnias, estrangeiros, repressão sexual ou a instituição do matrimônio para render assunto para piadas.
Assim, projetando-se para o futuro o que funciona desde o primórdio dos tempos, ainda mais levando-se em conta (sob uma ótica positivista) que a tendência da moderna sensibilidade é acabar com preconceitos e repressão sexual, a graça no futuro distante certamente incluirá a lógica do absurdo e o nonsense. Uma comédia intelectualizada em que o mais completo surrealismo é tratado como se fosse um acontecimento rotineiro. Ou seja, daqui a um milhão de anos, de todos os comediantes de hoje em dia, os que têm mais chance de sobreviver são os do Monty Python. Imagine aquele povo usando aqueles macacões prateados futuristas, flutuando em meio a galáxias hoje desconhecidas, recitando para alienígenas (personagens de muitos gracejos sobre falta de inteligência) velhos esquetes ingleses e autodeclarando-se “nós somos os cavaleiros que falam Ni!”
E, já que o citamos na matéria sobre o Filógelo, eis aqui um dos grandes momentos do Monty Python, o esquete do papagaio morto:
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