maio 11, 2009
A Fronteira Final - O Novo Filme de JORNADA NAS ESTRELAS
Ca-pi-tão-quir-que! Ca-pi-tão-quir-que! Olê olê olê olá a Frota Estelar tá botando pra quebrar!
O valente editor da Zé Pereira saiu do cinema e comentou com o blogueiro, "e agora, quando é que vamos chutar a bunda de alguns klingons?"
Sim, porque o novo Jornada nas Estrelas é um barato. Mais de um século depois que o pai e a mãe do capitão Kirk passam uma noite animada e cheia de consequências, a estrela de Romulus explode, destrói o planeta e joga no passado um romulano, Nero, e o mais famoso vulcano de todos, Spock, que tentava salvar o planeta. Nero reaparece em frente a uma nave da Federação onde Kirk está nascendo e a destrói, ao descobrir o que lhe aconteceu. O pai do maior capitão estelar da história se sacrifica numa cena belamente redigida e dirigida, comprando tempo pra tripulação se salvar, mas deixando seu filho sem a figura paterna que forjaria seu caráter.
Mas isso não impede que Kirk se torne o James Tiberius a que todos nós estamos acostumados; depois de um período de comportada rebeldia, o capitão Christopher Pike assume o papel de figura paterna e o leva a alistar-se na Frota Estelar. Como a história mudou com a aparição de Nero, a equipe criativa não precisa seguir cada vírgula do cânone de Trek e traz de volta com delicada competência a melhor tripulação a jamais pilotar uma Enterprise.
Em seu tempo muito se escreveu sobre o inusitado (para a época) personagem de Spock, mas para a garotada nerd, como o editor da Zé Pereira e eu, o superstar (depois dos roteiros e do conceito) era mesmo o capitão Kirk. Com sua canastrice encaixada em scripts sofisticados, Shatner encheu de vitalidade a cadeira de comando pra criar um típico oficial de marinha de filme do século XVIII – a semelhança das personalidades de Kirk e Jack Aubrey, o Mestre dos Mares do filme de Russell Crowe é impressionante.
Kirk é inteligente e culto, sabe ter bons modos, mas também se sente à vontade em puteiros espaciais; mulherengo e bem humorado, deve ser ótima companhia pra encher a cara, o que parece gostar de fazer com seus marujos. Gente boa e leal, ainda assim se irrita com facilidade com seus subordinados, devido à falta de paciência típica de quem gosta de aventura. Shatner está quase sempre tenso em quadro, durante os diálogos, como se estivesse esperando para saltar. Embora impulsivo e improvisador, está sempre aberto à opinião dos outros, principalmente de seu grande amigo Spock, com quem veladamente compete pra mostrar quem tem o cérebro maior. Apesar disso tudo, tem disciplina suficiente pra manter a ordem e cumprir suas tarefas burocráticas.
E Chris Pine cria uma versão jovem desse Kirk de tal maneira que a única diferença entre ele e o Shatner da série são alguns anos de experiência. Zachary Quinto também faz um excelente Spock, mas é um personagem mais fácil de recriar. Apenas Karl Urban faz uma verdadeira imitação do dr. McCoy de DeForest Kelley, mas ele mal aparece mesmo, e Zoe Saldana faz uma Uhura mais agressiva, já que simplesmente ter uma oficial mulher (e negra africana!) na ponte não é mais uma ousadia feminista para o público de hoje.
O engenheiro Scott também aparece depois e desaponta os fãs, porque está isolado num posto avançado no cu do mundo há meses e quando aparece gente, em vez de pedir um uísque, pede comida. Malditos tempos politicamente corretos. Há também um Sulu, tão ávido por aventura quanto o original, e Chekov, que na série clássica tinha como únicos traços distintos de personalidade um péssimo sotaque russo e juventude, virou também um supergeniozinho.
Em suma, a velha gangue está toda de volta. Nada da cultura corporativa da Nova Geração. Nada da novela mística de Deep Space Nine ou do jogo duplo diplomático de Janeway e sua galera em Voyager. Este povo do Kirk tem uma nave estelar e sabe como usá-la: botando pra quebrar no espaço. O diferencial de Star Trek era sem dúvida a complexidade de seus temas, mas o que nos levava a nos envolver com aqueles conceitos dos escritores era justamente o ar de espaçonave pirata singrando o cosmo.
O filme tem esse clima, embora obviamente falte a substância cerebral que tanto atraía a galera nerd, meio que impraticável num longametragem de origem, mas a graça é justamente saber que aquele pessoal vai encarar um monte de aventura cabeça. E com toda a impetuosidade de Kirk, a lógica do nerd hipercool Spock, o melodrama de McCoy e... eu ia dizer os coxões da Uhura, mas os padrões de beleza mudaram bastante dos anos 60 pra cá.
Pra quem cresceu com a criação de Gene Roddenberry a fita está cheia de piadinhas particulares sensacionais. O blogueiro e seu amigo Marcos Pedrosa começaram a rir logo na primeira cena de ação: o capitão Pike seleciona pruma missão perigosa Kirk, Sulu e um tripulante desconhecido ("Olson") de camisa vermelha. Aliás, as cenas de ação são, pros padrões atuais, poucas, e com uma estranha direção que tem o peculiar hábito de encenar a porradaria de forma que nós realmente entendemos exatamente o que está se passando.
E há muitas outras piadinhas referenciais: o sotaque fajuto de Chekov, Pike numa cadeira de rodas, Scott sendo ensinado por um viajante do futuro a inventar algo cuja invenção é creditada a ele, e uma das melhores, quando um por um os oficiais de comando saem e vão deixando a Enterprise na mão de gente cada vez menos graduada, até chegar no geniozinho russo de 17 anos, satirizando a mania pouco militar da série clássica de mandar por razões dramáticas todo o pessoal importante da ponte de uma vez pra planetas ou naves potencialmente hostis.
E, prum cara que diz nunca ter gostado de Star Trek, J. J. Abrams pegou mesmo o espírito da coisa, com diálogos que parecem saídos da série original ("Eu citaria um regulamento, mas você o ignoraria mesmo" "Viu? Já estamos nos conhecendo melhor"). Enfim, é um barato. Com excelentes efeitos especiais de bom gosto, uma montagem que permite compreender o que está acontecendo na cena e um design atualizado recauchutando o ótimo conceito cenográfico original, a fita é um excelente recomeço, deixando a gente com vontade de que saia uma nova série de tevê pra não termos que ficar esperando três anos entre um longa e outro. Afinal, estamos todos doidos pra chutar a bunda de uns klingons.
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