maio 18, 2009

A Fronteira Final - A Primeira Temporada de JORNADA NAS ESTRELAS - A série clássica



E As Meninas, De Que São Feitas?
pelo blogueiro convidado Antônio Rogério da Silva, o Roger Filósofo





Anteriormente: Tempo de Nudez


O desejo de possuir mecanismos com formas humanas que nos substituíssem e ajudassem nas tarefas rotineiras, em casa e no trabalho, é tão antigo quanto a Ilíada (séc. VIII a.C.) de Homero, onde se narra que Hefesto – ou Vulcano – operava suas fornalhas com o auxílio de belas moças feitas de ouro. Muito tempo depois, o filósofo francês Julien O. de la Mettrie, radicalizando a concepção mecanicista cartesiana, já defendia audaciosamente que o próprio ser humano em nada seria diferente de uma máquina. E notem que ele tinha em mente apenas os precários autômatos que seu conterrâneo e contemporâneo Jacques de Vaucanson construíra na primeira metade do século XVII – bugigangas como patos que batiam asas, flautistas etc. Uma definição melhor de semelhança entre máquinas e humanos só surgiria em 1950, quando o gênio de Alan M. Turing propôs o Jogo da Imitação, como um teste para avaliá-la. Pelo Teste de Turing, seria considerada inteligente a máquina que conseguisse responder perguntas, da mesma maneira que humanos fariam, sem ser descoberta por estes.

Em algum momento no início do século passado, no entanto, a ideia de fabricar inteligência artificial passou a ser vista como uma ameaça aos seres de carne e osso. Operários de inspiração ludita sabotavam máquinas que, mesmo sem terem a inteligência mais rudimentar, competiam com eles pelos escassos postos de trabalho. A peça R.U.R. (1920), do dramaturgo tcheco Karel Capek, pode ter sido crucial para que os temores contra os robôs fossem consolidados – foi Capek que cunhou nesse texto a palavra robô e previu uma revolta das máquinas contra a exploração humana de seus trabalhos. Metrópolis (1927), de Fritz Lang, também deu sua contribuição para aumentar o pavor.


Muito barulho por nada. Os primeiros computadores dignos do nome só começaram a ser fabricados depois de 1946. Armários gigantescos que tinham a proeza de fazerem cálculos que hoje qualquer calculadora de bolso faz. Terminada a primeira década do tão esperado século XXI, robôs inteligentes ainda estão muito longe de serem projetados, sequer construídos.

Mesmo assim, a série original de Jornada nas Estrelas, pelo menos em seu famoso episódio “E as Meninas de que são Feitas?” – primeiro a ser reprisado, em 1966 -, permaneceria cética quanto a uma convivência pacífica entre andróides e humanos, em um futuro mais distante. Os pesadelos vividos em R.U.R e que mais tarde tornariam clássico o definitivo O Caçador de Andróides (1982), de Ridley Scott, foram compartilhados pelo excelente roteiro de Robert A. Bloch (autor de Psicose, 1959). Está tudo lá: o cientista maluco que fabrica robôs para lhe fazerem companhia; um casal ameaçador de andróides que ganha sentimentos humanos e a eterna dúvida sobre o que nos faz humanos.

Aparência e força são logo descartadas. Os andróides podem ser mais belos e fortes do que nós. Inteligência também fica de fora, pois um programa de computador pode fazer contas mais rápido e jogar xadrez melhor do que qualquer humano. Restam apenas nossas “fraquezas”. Máquinas não sentem fome, nem o prazer de saciar suas vontades. Entretanto, se por algum desvio de sua programação ou um efeito secundário lhes fosse gerado algum sentimento subjetivo, então, mais nada sobraria para marcar a diferença. Com uma década de antecedência, “E as Meninas...” expõe esse problema com a perturbadora nitidez que se encontra em O Caçador de Andróides.

Só mesmo um preconceito muito forte em favor de seres sencientes restringiria o direito de tais maquinas existirem. Como o robô Andrew Martin, em O Homem Bicentenário (1976), de Isaac Asimov, a andróide Andrea (Sherry Jackson) e a enlouquecida cópia do Dr. Roger Korby (Michael Strong), de “E as Meninas...”, têm todo direito de continuarem vivendo como são, apesar de decidirem por experimentar a consciência da morte. Talvez a única condição que nos faz verdadeiramente humanos.

Em tempo, à primeira vista, esse medo de robô desapareceu na nova geração de Jornada nas Estrelas, pois o andróide Data (Brent Spiner) pôde assumir sem traumas parte das funções que antes eram exercidas pelo Sr. Spock (Leonard Nimoy).

A Seguir: Uma cerebral batalha naval em pleno espaço, o antológico "Equilíbrio do Terror".

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